John Jennings e sua irmã Emily sabem que a demência é uma ameaça que está sempre próxima deles. Há três décadas, a família deles se tornou a primeira do mundo a ser diagnosticada com Alzheimer hereditário . A descoberta aconteceu depois que sua mãe, Carol, convenceu os médicos a fazerem uma investigação mais aprofundada, já que a doença destruiu seu pai e quatro de seus irmãos. Ela mesma também faleceu com Alzheimer, aos 70 anos, e seus filhos têm 50% de chances de ter o mesmo destino.
![Carol, com o marido, Stuart, e os filhos, John e Emily — Foto: Reprodução/ BBC](https://cdn.statically.io/img/s2-crescer.glbimg.com/a0R50GpC_gELnYK4E59khWQUSiI=/0x0:1200x900/984x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_19863d4200d245c3a2ff5b383f548bb6/internal_photos/bs/2024/A/b/GnjC7MRXyZdXFXoZ7cjw/alzhemer-carol.jpg)
A família é tema de um documentário da BBC Two, que conta como Carol ganhou as manchetes globais ao trabalhar junto com médicos para melhorar a compreensão da doença, além de permitir o desenvolvimento de um teste genético para detectá-la. Carol, que era professora, escreveu uma carta com o apelo a John Hardy, professor da University College London, convencendo-o de que a doença poderia ter uma forma hereditária.
Carol tinha razão e isso foi identificado em 1990, depois de quatro anos de pesquisa. Carol decidiu tomar uma atitude depois que seu pai, seu tio e sua tia desenvolveram a doença aos 50 anos. Seus instintos foram confirmados quando os estudos mostraram que a forma familiar da doença pode atacar muito mais cedo e com mais intensidade.
A própria Carol começou a apresentar sintomas aos 58 anos, em 2012, e faleceu agora, pouco depois de completar 70 anos. Mesmo depois de morrer, ela quis continuar contribuindo com as descobertas sobre o tema, já que doou seu cérebro para a ciência médica. Embora o Alzheimer continue sendo uma doença sem cura, o diagnóstico precoce permite que os medicamentos ajudem a conter o surgimento. Com cenas de filmes caseiros de arquivo, diários e fotografias, o documentário de 60 minutos –The Jennings v Alzheimer’s – captura a dor de ver entes queridos apresentando o declínio da saúde por conta dessa doença.
Carol, que nasceu em Nottingham e mais tarde se mudou para Coventry, na Inglaterra, aparece ainda criança e, depois, como uma mulher mais jovem. Depois, surge com seu marido, Stuart, 67, um clérigo aposentado, com quem teve um casamento de 44 anos. Eles tiveram Emily, 42, eJohn, 39. Antes de a doença surgir, ela viajou pelo mundo fazendo palestras sobre a doença de Alzheimer, em conferências médicas. Em total contraste, há cenas que a mostram na cama, incapaz de falar ou reconhecer sua família.
“Mamãe era infinitamente otimista”, diz John. “Ela sempre encontrava soluções. Ela me apoiou muito e eu tenho muita sorte de tê-la. Ela sempre esteve lá por mim. Mas logo depois de receber o diagnóstico oficial, a personalidade dela começou a mudar e ela passou a não se lembrar de tudo. Foi muito difícil e Emily e eu sentimos que a perdemos há muito tempo, quando ela não sabia quem éramos, quando ela não conseguia falar”, conta ele.
Tanto ele quanto Emily, que é mãe de uma menina de 8 anos, poderão fazer exames para saber se têm a doença. John afirmou que, se isso acontecer, ele consideraria a eutanásia voluntária na clínica Dignitas, na Suíça. “Quero fazer um teste genético em breve para saber se tenho ou não”, diz ele. “Não é que eu queira mudar alguma coisa. Estou muito feliz. Tenho uma vida adorável, mas gostaria de poder planejar minhas opções. Se um de nós descobrir que tem e o outro não, então você precisará lidar com muita emoção”, afirma, em entrevista.
Recentemente, foi anunciado pela ciência o desenvolvimento de dois medicamentos que podem retardar os sintomas do Alzheimer, embora eles ainda não estejam licenciados no Reino Unido. John tem acompanhado o progresso disso com interesse, mas diz que prefere resolver o problema por conta própria, se todas as outras opções falharem.
“Não suporto a ideia de passar anos e anos totalmente dependente de cuidadores. Eu quero ter controle. Não estou sugerindo isso para todo mundo ou dizendo que mamãe já foi um fardo, mas, para mim, parece que seria um fardo colocar tantas expectativas em outras pessoas. Agora há medicamentos no horizonte. Estou muito interessado em usá-los. Eles podem não parar a doença, mas podem me dar mais tempo e controle. Se eu tivesse controle total, já estaria tomando os remédios. Sabemos que o Alzheimer começa de 10 a 15 anos antes de você apresentar os sintomas”, aponta.
“Não consigo me imaginar envelhecendo porque estou convencido de que tenho Alzheimer. Tenho certeza de que dentro de 10 anos perderei essas conexões com meus entes queridos, como uma televisão ficando estática”, prevê.
A família concordou em fazer o documentário da BBC para manter vivo o legado de Carol e informar o mundo sobre sua campanha. Ela teve a oportunidade de assistir à penúltima edição com a família antes de falecer.
“Não tenho certeza até que ponto ela realmente sabia o que estava acontecendo”, diz o marido, Stuart. "Mas ela estava lá conosco quando foi mostrado para que ela pudesse ouvir. Estou muito orgulhoso de Carol. Ela foi notável. Ela sempre foi uma pessoa vivaz e quando viu sua família desenvolver a doença, ganhou um foco totalmente novo na vida. Isso foi algo poderoso de ver”, acrescentou o homem. “Ela deixou de ser uma pessoa independente e muito vivaz e passou a depender de mim, de John e de Emily. Mas ela foi muito corajosa. Para mim, foi um privilégio cuidar dela e, embora a sua morte tenha deixado um grande buraco na minha vida, prometi à Carol que continuaria o trabalho. É algo que compartilhamos juntos. Ela disse: 'Se eu não posso falar, você pode falar por mim?' E é isso que quero continuar a fazer agora”, finalizou.
O que é Alzheimer?
A doença de Alzheimer é a forma mais comum de demência neurodegenerativa em pessoas de idade. De acordo com informações do Ministério da Saúde, a causa é desconhecida, mas acredita-se que seja geneticamente determinada. A doença ocorro quando o processamento de certas proteínas do sistema nervoso central vai parando de funcionar da maneira esperada. Então, fragmentos de proteínas tóxicas começam a se acumular, causando perda progressiva de neurônios em certas regiões do cérebro, como o hipocampo, que controla a memória, e o córtex cerebral, essencial para a linguagem e o raciocínio, memória, reconhecimento de estímulos sensoriais e pensamento abstrato.