• Moises Chencinski
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Sonhar, mais um sonho impossível
Lutar, quando é fácil ceder

São os primeiros versos de Sonho Impossível, versão de Chico Buarque e Ruy Guerra (1972) para o musical o Homem de La Mancha, baseado em D. Quixote. Mas será mesmo que esse sonho é impossível? Não sei. Mas cada vez que penso em uma mulher que, mesmo com uma decisão informada, resolve amamentar, a imagem que me vem é a de D. Quixote lutando contra os moinhos de vento, os inimigos “imaginários”?

Mãe amamentando filho (Foto: Getty Images)

Mãe amamentando filho (Foto: Getty Images)

Somos mamíferos. Uma das principais características desse grupo do reino animal é que as “fêmeas”, com glândulas mamárias, nutrem suas crias desde seu nascimento, até que, por si só, possam buscar seu próprio alimento. Cada cria recebe o leite da sua própria espécie. Só o Homem recebe leite de outros mamíferos como fonte de nutrientes, quando não alimentado pelo leite de sua mãe.

Essa é a natureza dos mamíferos. E isso é porque somos considerados (por nós mesmos) como os mais inteligentes da espécie, os mais evoluídos. Mas, e parece que sempre tem que ter um mas...

- Nossa, ele já anda e ainda mama?
- Já não é hora de parar?
- Ele vai sugar sua alma.
- Ainda sai leite?

Esses são alguns dos comentários mais comuns que uma mãe, que está “apenas” (como se fosse pouco) nutrindo sua cria, escuta, lê, engole (muitas vezes não) desde que alguém, que por qualquer razão (vai saber) acha que tem que ter uma opinião sobre algo que não lhe diz respeito, e, ainda por cima, sente uma necessidade incontrolável de falar.

Amamentar, “mesmo quando vai até dois anos ou mais”, ainda traz benefícios:
- Imunológicos (sim, ainda tem anticorpos)
- Metabólicos (menos riscos de sobrepeso, obesidade, diabetes, hipertensão)
- Nutricionais (não, ele não vira água e ainda tem calorias, proteínas, cálcio, vitaminas A, B12, C em boa quantidade)
- Cognitivos (estudos mostram aumento de QI)
- Ortodônticos e fonoaudiológicos
- Econômicos e sociais
- Diminui a mortalidade infantil.

Mas isso, todo mundo já sabe, né? A Organização Mundial da Saúde (OMS) e a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) recomendam aleitamento materno até dois anos ou mais.

- Ah, assim vai mamar até entrar na faculdade (essa é outra).
Oi? Alguém já viu... esquece.

Se a recomendação é até dois anos ou mais, quando isso vira “prolongado”? Prolongado é quando se ultrapassa um limite, aumentado, além do programado, estendido, longo, demorado.

Então. Sabe quem decide isso? A mãe e o bebê. Isso. A decisão é só, apenas, exclusivamente, unicamente, tão somente da mãe e do bebê. O desmame (tema que será abordado aqui, também) deve ser natural e oportuno (a propósito, a tempo, no momento adequado, segundo a conveniência, apropriado, propício).

Agora que já sabemos o significado das palavras, que tal compreendermos o sentido da amamentação na sua essência? E que tal, ao invés de criticar, julgar, constranger uma mãe que amamenta, porque decidiu que seria assim, proteger, promover e apoiar as que querem e podem amamentar? E um conselho. Uma mãe mamífera amamentando é forte e poderosa e protege sua cria. Vai encarar? Eu pensaria melhor...

Dr. Moises Chencinski é pediatra, membro do Departamento Científico de Aleitamento Materno da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), editor do blog 'Pediatria Orienta' da Sociedade de Pediatria de São Paulo, multiplicador de Curso Oficial do Ministério  (Foto: Arquivo Pessoal)

Dr. Moises Chencinski (Foto: Arquivo Pessoal)

Dr. Moises Chencinski é pediatra, membro do Departamento Científico de Aleitamento Materno da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), editor do blog 'Pediatria Orienta'  da Sociedade de Pediatria de São Paulo, multiplicador de curso oficial do Ministério da Saúde para equipes de saúde da 'Avaliação do frênulo lingual em recém-nascido', criador e incentivador do movimento 'Eu Apoio Leite Materno'.

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