Garimpo e história

Por André Danemberg

Colunista | Arquiteto e pesquisador do mobiliário europeu, integra a terceira geração de antiquários da família e atua no Arnaldo Danemberg Collection

Os móveis contam histórias e representam épocas de diversas formas, por meio de símbolos – de caráter fitomorfo, zoomorfo, antropomorfo e outras representações – sendo estes representados na da madeira esculpida, nos bronzes e marchetarias diversas.

Nos estilos Barroco e Rococó, o tema floral é muito presente. No estilo Neoclássico, o barrete da liberdade (uma espécie de chapéu típico usado pelos revolucionários franceses) pode ser encontrado em cadeiras da época da revolução e a esfinge egípcia no mobiliário do Império Napoleônico. Nesse contexto, a flor-de-lis aparece como um símbolo muito ligado à monarquia francesa.

O símbolo da esfinge egípcia representado no mobiliário do Império Napoleônico — Foto: Arnaldo Danemberg Collection / Divulgação
O símbolo da esfinge egípcia representado no mobiliário do Império Napoleônico — Foto: Arnaldo Danemberg Collection / Divulgação

Presente desde os tempos medievais, a flor-de-lis teve um papel importante na história da França, sobretudo durante os séculos 18 e 19.

Sempre associada à monarquia e ao poder real, tal símbolo adornava diversos tipos de móveis, como cadeiras, bancos, tronos, arcas, baús, entre outros, além de estandartes e brasões dos reis franceses, representando sua autoridade divina e conexão com a fé cristã.

A cadeira é feita inteiramente de madeira e apresenta um detalhe vazado em forma de flor-de-lis em seu espaldar — Foto: Arnaldo Danemberg Collection / Divulgação
A cadeira é feita inteiramente de madeira e apresenta um detalhe vazado em forma de flor-de-lis em seu espaldar — Foto: Arnaldo Danemberg Collection / Divulgação

Foi durante o reinado de Luís XIV que a flor-de-lis alcançou seu apogeu como ícone da realeza, inclusive tendo a contração da palavra “lis” muito associada ao nome Luís, ou seja, “flor de Luís”.

Além de estar presente nas decorações palacianas e nos uniformes militares, visando demonstrar a força da realeza, a flor-de-lis era o grande símbolo da bandeira da França, tendo a sua primeira aparição no ano de 832, quando o rei Carlos II quis homenagear o também rei Clóvis (primeiro rei dos franceses, que reinou entre os anos 481 e 511).

Uma das lendas mais famosas diz que a escolha desse símbolo se deu pela sua semelhança aos raios solares, ou seja, a luz divina, representando assim a relação entre a realeza e a religião.

Bandeira do reino da França, onde a flor-de-lis foi supostamente escolhida por representar a luz divina, ou seja, a relação entre a monarquia e a religião — Foto: Wikipedia / Creative Commons
Bandeira do reino da França, onde a flor-de-lis foi supostamente escolhida por representar a luz divina, ou seja, a relação entre a monarquia e a religião — Foto: Wikipedia / Creative Commons

No entanto, com a Revolução Francesa no final do século 18 e o subsequente declínio da monarquia absolutista, a flor-de-lis perdeu sua proeminência como símbolo oficial do estado dando lugar a bandeira tricolor, que representava os valores republicanos através das cores azul, branco e vermelho a partir de 1793.

A bandeira da França representa os valores republicanos da nação por meio das cores azul, branco e vermelho — Foto: PxHere / Creative Commons
A bandeira da França representa os valores republicanos da nação por meio das cores azul, branco e vermelho — Foto: PxHere / Creative Commons

Sobre essa bandeira, o escritor francês Alphonse de Lamartine ressaltou que “a bandeira tricolor deu a volta ao mundo com o nome, a glória e a liberdade da pátria”. Eram esses os pensamentos republicanos e revolucionários da época.

Apesar da queda do absolutismo, a flor-de-lis continuou a ser reverenciada por muitos como um símbolo de tradição e história, mantendo sua presença na cultura francesa até os dias atuais.

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