• Por Diego Revollo
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A quarentena fez com que o arquiteto Diego Revollo refletisse sobre sua rotina (Foto: Diego Revollo/Arquivo Pessoal)

A quarentena fez com que o arquiteto Diego Revollo refletisse sobre sua rotina (Foto: Diego Revollo/Arquivo Pessoal)

Diferente das minhas outras colunas, nesta, não consigo escrever apenas sobre arquitetura e decoração. Embora siga trabalhando e dando andamento a alguns dos meus projetos e obras, que não estão parados, venho pensando sobre como nos comportaremos daqui em diante, se é que já não mudamos e estamos diferentes.

Como muitos de vocês, nesta época que nos deixa um pouco mais parecidos, tenho minhas reflexões aprofundadas. Questões mais humanas ou talvez diretamente mais ligadas aos sentimentos, vários, que me acompanham.

Confesso que no começo de tudo, na semana em que o escritório parou, pensei em usar este espaço para colocar uma seleção de imagens de home office e falar sobre o assunto. Fora a questão mais natural dessas imagens já terem sido bastante divulgadas esses dias não só nas redes sociais, mas em todos os veículos da imprensa o que me fez romper com a idéia é justamente não ser um entusiasta do home office. Explico.

Logo antes de abrir meu escritório, saí do antigo trabalho e, enquanto me preparava para a “carreira solo”, passei um ano em casa dando andamento a projetos e obras. Para um arquiteto é difícil separar o trabalho da vida pessoal. Quase todos meus colegas se identificam com esse modus operandi: pensam nos projetos, clientes e têm ideias o tempo todo. Por essa razão, quando naquela época trouxe o trabalho para dentro de casa, tudo isso se intensificou ainda mais. Em vez de ter uma rotina mais leve, me vi em casa, lutando para abandonar o computador e preservar antigos hábitos que estavam morrendo. Disciplinado, minha produtividade não caiu e tampouco aumentou, mas reparei que parte da minha tranquilidade havia sido invadida. Entre tantas tarefas, restringir o trabalho em casa, em alguns momentos, passava a ser uma delas.

Agora que todos, finalmente, conquistaram o direito ao home office, penso que muitos talvez percebam que ter a nossa casa como um refúgio de intimidade, exclusividade de tempo e atenção só para os nossos, para aqueles que importam e até mesmo para o ócio, seja uma solução antiga, porém acertada, simples.

Na minha falsa quarentena, fui privilegiado. Como moro perto do trabalho e o caminho é arborizado, mas deserto, sigo diariamente indo cedo para o escritório, porém agora caminhando, observando as casas, mas principalmente as árvores. O mesmo trajeto, mas outra percepção da paisagem, das construções e de mim.

Demoro cerca de vinte e cinco minutos no percurso, mas que correspondem há horas porque penso e penso muito. Olhando as casas por fora, vejo dentro a minha rotina mudar: a cozinha voltando a ser o coração da casa enquanto membros de uma mesma casa, família ao seu redor recuperam o convívio e constroem novas memórias afetivas. Observo as árvores, constato que uma delas é um pé de café, lembro de minha infância nas férias vendo os grãos de café secando na chácara em Araxá, penso de novo. Não sei onde tudo isso nos levará, mas talvez o novo, depois de todas as nossas reflexões, seja a constatação de que só o essencial irá permanecer e que viver de maneira simples seja ainda o melhor caminho.