Arma usada para matar Marielle e Anderson foi desviada do Bope após um incêndio, diz Élcio Queiroz em delação premiada
Em depoimento, Élcio deu detalhes do atentado contra a vereadora
Por Roberta de Souza e Vera Araújo — Rio de Janeiro
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Élcio Queiroz detalha em delação premiada como foi a morte de Marielle e Anderson, assassinato que deixou marcas de tiro na lataria do veículo
Élcio Queiroz detalha em delação premiada como foi a morte de Marielle e Anderson, assassinato que deixou marcas de tiro na lataria do veículoFabio Gonçalves e Pablo Jacob / Arquivo / Agência O Globo
O ex-PM Élcio de Queiroz, preso em 2019 suspeito de participar dos assassinatos de Marielle Franco e Anderson Gomes, deu detalhes sobre a morte da vereadora e do motorista em delação premiada com a Polícia Federal (PF) e com o Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ). No depoimento, Élcio diz que a arma que matou Marielle Franco foi extraviada de um incêndio Batalhão de Operações Especiais. Segundo ele, Ronnie Lessa já tinha uma relação de carinho com a submetralhadora HK MP5 por ter trabalhado no Bope.
No depoimento, Élcio diz que Ronnie reformou a arma e deixou ela "cem por cento" depois da compra.
"Houve um incêndio no Batalhão de Operações Especiais, no paiol, e essa arma foi extraviada. Essa e outras armas foram extraviadas nesse incêndio aí e essa arma ficou com uma pessoa que eu não sei quem é. Essa pessoa conseguiu fazer a manutenção dela e vendeu pra ele", disse Élcio.
Questionado pela Polícia para saber quem foi que vendeu a arma para o Ronnie, ele não soube informar se era PM ou não.
"Alguém que tinha acesso às armas. Eu nem sei se realmente houve esse incêndio, ele passou que houve, já ouvi boatos que houve incêndios, mas eu não sei quando foi, não sei nem se eu estava na Polícia Militar. Mas ele me passou que foi essa situação", explicou ele. Questionado, ele disse que não consegue precisar a data da compra, mas que não chega a cinco anos antes do crime.
Élcio também não soube explicar como eles tiveram acesso à munição UZZ18 da Polícia Federal, mas afirmou que Ronnie deve ter amigos no órgão até hoje. Porém, disse que não sabe se teve alguém relacionado com o crime.
Relembre caso Marielle Franco em imagens
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Eleita vereadora do Rio em 2016, com 46 mil votos (5ª candidata mais votada), Marielle Franco (PSOL) teve o mandato interrompido por 13 tiros na noite de 14 de março de 2018, num atentado que vitimou também seu motorista Anderson Gomes — Foto: Márcia Foletto / Agência O Globo 2 de 43
Marielle dedicou seu mandato à luta em defesa dos direitos humanos, das mulheres e de negros e moradores de favelas — Foto: Gabriel de Paiva/Agência O GLOBO
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Nascida e criada na Maré, Marielle estudou Sociologia na PUC, com bolsa integral, e fez mestrado na UFF — Foto: Marcos de Paula/Agência O Globo 4 de 43
Horas antes do assassinato, Marielle havia participado de uma roda de conversa com mulheres no local conhecido como Casa das Pretas, na rua dos Inválidos, na Lapa Foto: Divulgação/PSOL — Foto: Divulgação/PSOL 5 de 43
A chegada dos caixões de Marielle e Anderson à Câmara de Vereadores do Rio no velório que marcou o início de inúmeras manifestações populares que passaram a ocorrer no Rio e no mundo por conta da morte da parlamentar — Foto: Guilherme Pinto / Agência O Globo 6 de 43
Marielle e sua equipe deixaram o local na Lapa por volta das 21h e foram seguidos até o Estácio e assassinados — Foto: Reprodução 7 de 43
Rua Joaquim Palhares, no Estácio, próximo à Prefeitura do Rio, foi o local onde carro de Marielle foi alvo de 13 disparos — Foto: Reprodução 8 de 43
A cada mês, novas manifestações marcavam a cobrança por celeridade nas investigações. A foto mostra voluntários da Anistia Internacional em um desses atos, quando o crime completou três meses — Foto: Pablo Jacob/Agência O Globo 9 de 43
Então ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann foi autor de uma série de afirmações sobre as investigações que nunca se confirmaram e promessas não cumpridas sobre a resolução — Foto: Jorge William/Agência O Globo 10 de 43
O crime aconteceu sob intervenção federal no Rio, comandada pelo general Braga Netto, que prometeu resolução para o fim do ano de 2018 — Foto: Armando Paiva/Raw Image 11 de 43
Rivaldo Barbosa, então chefe da Polícia Civil do Rio, repetiu a promessa em 1º de novembro — Foto: Brenno Carvalho/Agência O Globo 12 de 43
O então governador Witzel (à dir.) também prometeu resolução em janeiro 2019. Não cumpriu e foi afastado por corrupção em 2020 — Foto: Reprodução 13 de 43
Vereador Marcelo Siciliano se tornou suspeito em maio de 2018 depois de depoimento de testemunha à polícia — Foto: Carolina Heringer/Agência O Globo 14 de 43
Ex-PM Orlando Oliveira de Araújo, o Orlando da Curicica, também foi apontado por testemunha como um dos mandantes — Foto: Reprodução 15 de 43
Uma segunda linha de investigação surgiu em agosto: algum tipo de vingança pelos 11 anos como assessora de Marcelo Freixo (PSOL), que enfrentou as milícias na Alerj — Foto: Reprodução 16 de 43
A nova linha de investigação levou os deputados estaduais do MDB Jorge Picciani (foto), Paulo Melo e Edson Albertassi, adversários políticos de Freixo, a serem investigados — Foto: Márcio Alves/Agência O Globo 17 de 43
Também em agosto foi divulgada a descoberta do Escritório do Crime: um grupo de matadores de aluguel formado por policiais e ex-policiais milicianos — Foto: Márcia Foletto/Agência O Globo 18 de 43
Em janeiro, laços do clã Bolsonaro com Adriano Magalhães da Nóbrega, apontado como fundador do Escritório do Crime, vieram à tona — Foto: Ascom/ TSE 19 de 43
Marcada com o número 1, a casa 58 pertence a Jair Bolsonaro, no Vivendas da Barra; o imóvel fica perto da casa 66, marcada com o 2, de Ronnie Lessa. O outro suspeito do crime disse que iria à casa de Bolsonaro — Foto: Arquivo O Globo 20 de 43
Adriano Magalhães da Nóbrega, ex-capitão do Bope e suspeito de integrar milícia que matou Marielle Franco — Foto: Reprodução 21 de 43
Depois de ter nome ligado à família Bolsonaro, o ex-PM Adriano Magalhães da Nóbrega foi morto a tiros na Bahia — Foto: Reprodução 22 de 43
Leonardo Gouvea da Silva , o Mad, é substituto do Adriano Magalhães da Nóbrega à frente da organização criminosa de assassinos de aluguel, ligada à execução da vereadora Marielle Franco — Foto: Hermes de Paula/Agência O Globo/30-06-2020 23 de 43
Suel, sargento do Corpo de Bombeiros, de 44 anos, teria cedido carro para esconder armas de Lessa, acusado de matar a vereadora Marielle Franco. De acordo com os investigadores, coube ao bombeiro ajudar, logo após a prisão do sargento, no descarte das armas escondidas por Lessa Foto: Hermes de Paula / Agência O Globo - 10/06/2020 — Foto: Hermes de Paula/Agência O Globo/10-06-2020 24 de 43
O sargento reformado Ronnie Lessa é apontado como o autor dos disparos que mataram a vereadora Marielle Franco e o motorista Anderson Gomes — Foto: Marcelo Theobald/Agência O Globo 25 de 43
Prisão de Elaine de Figueiredo Lessa (centro), a esposa de Ronnie Lessa — Foto: Fabiano Rocha/Agência O Globo 26 de 43
Áudio mostra que Ronnie Lessa liberou a entrada de Élcio de Queiroz (foto) em condomínio de Bolsonaro no dia do assassinato — Foto: Marcelo Theobald/Agência O Globo 27 de 43
Na Operação Lume, também foi preso Alexandre Motta, solto posteriormente pela Justiça — Foto: Márcio Alves/Agência O Globo 28 de 43
Na casa de Alexandre, foram apreendidos 117 fuzis desmontados que ele disse guardar a pedido do amigo Ronnie Lessa — Foto: Alexandre Cassiano/Agência O Globo 29 de 43
sargento PM Rodrigo Jorge Ferreira, o Ferreirinha, foi preso na Operação Entourage. Ele é apontado pela Polícia Federal como o responsável por atrapalhar a investigação — Foto: Reprodução 30 de 43
Major Ronald Paulo Alves Pereira foi um dos cinco presos da operação Intocáveis. A polícia considera a prisão do miliciano envolvido com grilagens estratégica para a investigação — Foto: Márcia Foletto / Agência O Globo 31 de 43
Marcello Siciliano se tornou suspeito em maio de 2018 depois de depoimento de testemunha, que seria contestado, à polícia — Foto: Agência Brasil 32 de 43
Disputa por pontos políticos estaria por trás da suspeita de um possível envolvimento do conselheiro do TCE-RJ Domingos Brazão — Foto: Fabiano Rocha/Agência O Globo 33 de 43
Bicheiro Rogério Andrade passou a integrar o rol em razão de sua ligação com Lessa — Foto: Reprodução/TV Globo 34 de 43
Familiares de Marielle Franco chegam ao Ministério Público para coletiva sobre a prisão dos executores da vereadora e do motorista Anderson Gomes — Foto: Gabriel de Paiva/Agência O Globo 35 de 43
Desde sua morte, Marielle se tornou símbolo de muitas manifestações políticas e culturais — Foto: Brenno Carvalho/Agência O Globo 36 de 43
Mônica Benício, viúva da vereadora assassinada, diz não ter dúvida de que a morte de Marielle teve motivação política — Foto: Daniel Marenco / Agência O Globo 37 de 43
Evento tem bandeiras com a inscrição "Fora, Bolsonaro" e com o rosto da ex-vereadora Marielle Franco, assassinada em 2018 no Rio de Janeiro — Foto: Maria Isabel Oliveira / Agência O Globo 38 de 43
Estátua da vereadora Marielle Franco, assassinada em março de 2018, é inaugurada no Centro do Rio — Foto: Brenno Carvalho 39 de 43
Manifestante posa em frente a cartaz para cobrar uma resposta da Justiça — Foto: Roberto Moreyra/Agência O Globo 40 de 43
Desde sua morte, Marielle se tornou símbolo de muitas manifestações políticas e culturais, como o marcante enredo da Mangueira, campeã de 2019 — Foto: Antonio Scorza/Agência O Globo 41 de 43
Mangueira 2019 levou à Avenida a expressão 'Marielle Presente', uma síntese da comoção pelo assassinato — Foto: Gabriel Monteiro/Agência O Globo 42 de 43
Viúva Mônica abraça manifestantes durante ato pelos quatro anos da morte de Marielle Franco — Foto: Fotoarena/Agência O Globo/14-03-2022 43 de 43
Linha do tempo em frente ao Museu do Amanhã, na Praça Mauá, relembra fatos sobre o assassinato de Marielle e Anderson — Foto: Gabriel de Paiva/Agência O Globo
Eleita vereadora do Rio de Janeiro pelo PSOL em 2016, com 46 mil votos (a quinta candidata mais bem votada do município), Marielle Franco teve o mandato interrompido por 13 tiros na noite de 14 de março de 2018, num atentado que vitimou também seu motorista Anderson Gomes
No depoimento, ele diz que Ronnie alegou que se desfez da arma quando o crime começou a ter muita repercussão:
"No início, ele ficou com ela ainda, mas quando o negócio começou a tomar muito vulto mesmo, eu falei 'o que você fez com essa arma?' Ele falou 'eu serrei ela todinha' [...] Ele falou que serrou ela todinha, pegou a embarcação lá na Barra da Tijuca, foi numa parte que tinha trinta metros e jogou ali", contou ele.
Mas Élcio diz não acreditar na versão de Ronnie, por ter conhecimento da relação de carinho que ele nutria com a arma. No presídio, Ronnie confessou ao Élcio que estava preocupado com algumas "coisinhas" que estavam na casa de Pedro Bazzanella, amigo em comum dos dois e também citado no inquérito do crime.
"Ele comentou comigo que pegaram algumas armas, aqueles fuzis na casa que seria da mãe dele, que ela alugou. Mas ele falou para mim que ele estava preocupado não era nem com aquilo, ele estava preocupado com algumas coisinhas que estavam com o Pedro Bazzanella. Eu acredito que possa ser essa arma, ou outras armas", explicou.
Quem é Ronnie Lessa?
Ronnie Lessa foi apontado por Élcio Queiroz, em delação premiada, como sendo o autor dos disparos que mataram Marielle Franco e Anderson Gomes. Ex-policial militar, ele foi preso em março de 2019 pela participação nos assassinatos e acabou expulso da PM em fevereiro deste ano. Em 2021 foi condenado a quatro anos e meio de prisão pela ocultação das armas que teriam sido usadas na execução.