Designer de antigo logotipo do governo português diz que está recebendo ameaças de morte; entenda

Polêmica sobre símbolos nacionais são reflexo de polarização política crescente no país europeu: 'Tudo tem a ver com o tempo geopolítico'

Por O GLOBO — Rio de Janeiro


Imagem antiga e o novo logo do governo português Reprodução

O designer Eduardo Aires está no centro de uma guerra cultural envolvendo o logotipo criado para o antigo governo português do Partido Socialista (PS), derrotado em 10 de março deste ano. O símbolo idealizado pela antiga gestão governamental, com uma imagem "inclusiva, plural e laica", conforme anunciado à época — sem os símbolos cristãos que fazem parte da bandeira nacional, criada em 1910 —, não durou um dia na nova administração liderada pelo primeiro-ministro Luís Montenegro. E segue, até agora, rendendo polêmica em terras lusitanas.

Com assinatura de Eduardo Aires, a marca — com um círculo entre um retângulo e um quadrado, nas cores do país — vem sendo tachada como símbolo "progressista" e "antipatriótico" por parte de representantes da direita política no país. "Nossa missão, à época, era dar uma nova olhada no logo do governo e redesenhá-lo para a era digital, e foi o que fizemos", disse Aires, ao jornal inglês "The Guardian". "Agora, quase um ano depois, estou enfrentando ameaças de morte", acrescentou.

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Parte da indignação pública — que atingiu seu ápice na semana passada, quando o recém-empossado primeiro-ministro, Luís Montenegro, ordenou a retirada do novo logo — é motivada por gosto estético. Críticos têm rejeitado o redesenho que custou € 55 mil (o equivalente a R$ 300 mil), ressaltando que ele é "simplista e infantil" em seu uso de uma paleta de cores primárias e uma seleção de blocos de construção de retângulo, círculo e quadrado.

"As pessoas estão dizendo que uma criança de cinco anos poderia criá-lo no Microsoft Paint", afirmou Aires, na mesma entrevista ao "The Guardian". "Mas essas são pessoas totalmente ignorantes sobre design. Todo design é sobre síntese, em última análise", ponderou ele.

Bandeira de Portugal em frente ao Parlamento — Foto: Patrícia de Melo Moreira/AFP

O designer se defende frisando que a simplicidade gráfica, misturada a imagens "emocionalmente ressonantes", foi igualmente central para o redesenho de 2014 da marca da cidade do Porto, que ganhou numerosos prêmios internacionais.

A celeuma atual é uma ilustração do instável cenário político que se descortina no país. À medida que a política na Europa se torna mais polarizada, os símbolos nacionais também passam a ficar cada vez mais politizados.

Portugal não está sozinho. Na Alemanha, a Adidas recentemente recebeu uma reprimenda pública pelo uso do rosa para a nova camisa alternativa da seleção nacional de futebol, com críticos de mentalidade conservadora condenando o gesto como "progressista e não tradicional". No Reino Unido, também houve chiadeira contra a Nike por sua "brincadeira" na cor da bandeira na nova camisa de futebol da seleção da Inglaterra para a Copa do Mundo.

"Esta disputa [sobre símbolos e logos] definitivamente não é uma questão de design. Tudo tem a ver com o tempo geopolítico em que vivemos e percepções de poder", analisou Sérgio Magalhães, arquiteto e designer português, em entrevista também ao "The Guardian".

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