Ana Paula Lisboa
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Foi uma semana difícil. Contei isso a alguém e a pessoa desdenhou dizendo que todas as semanas são difíceis. Eu respondi que não, graças aos orixás. Não são todas as semanas que você precisa ir a duas missas de sétimo dia e ainda fazer um discurso fúnebre em plena quarta-feira.

Eu nunca havia feito um discurso fúnebre antes da última quarta-feira.

A morte é diferente em Angola, tão importante, celebrada e preparada quanto casamentos ou aniversários. Por exemplo, o direito a folgas em dias de óbito — como é chamada a cerimônia — foi amplamente discutido na nova Lei Geral do Trabalho angolana.

Desde que estou aqui, passei a achar que no Brasil morre-se de forma apressada. Você vai ao cemitério só, usa uma roupa qualquer, os velórios têm hora para começar e terminar, chora um pouco, abraça os seus e depois vai trabalhar.

Aqui, imprimem uma foto bonita sua, colocam essa foto num porta-retratos com moldura dourada, flores e velas, e choram você por alguns dias. Pode ser na sua casa ou na de algum parente. Pessoas vêm de longe chorar por você e toda vez que alguém novo chega, a choradeira aumenta. Há bebida e comida e pessoas bem vestidas, de terno, de vestidos, e perucas escolhidas especialmente para este momento.

Fico pensando que os rituais fazem a morte ser importante, uma tragédia, mesmo quando é uma morte natural de uma pessoa idosa. Para nós, a morte é algo banal, tão banal que não precisa de celebração ou ritual.

Quando foi que a gente naturalizou a morte de um casal e seu bebê ? Quando foi que a gente naturalizou o corpo de uma mulher negra atingida por uma bala perdida (que por acaso sempre acha os mesmos) ser arrastado por um camburão a ponto de absolver todos os envolvidos?

É como se ninguém tivesse responsabilidade sobre nada, é um “plano de Deus”, então é só seguir a vida.

Por aqui, é bom que a morte seja ainda uma grande tragédia, uma perda irreparável. Tão grande que precisei fazer um discurso fúnebre na última quarta-feira. Curiosamente, havia pessoas com muito mais a dizer sobre o falecido, contar suas façanhas e dores, suas histórias, suas obras. Agualusa escreveu sobre Miguel Gullander em sua última coluna, mas coube a mim a missão presencial.

Me limitei a dizer um monte de coisas óbvias, porque o óbvio precisa ser dito também, porque acho que nestes momentos de dor são as coisas óbvias que nos consolam: “Mesmo pra mim, que sou uma mulher que vive e trabalha pela palavra, foi difícil encontrar alguma que servisse, já que cada um de nós é um universo e o universo é indescritível, imenso, incontável, impressionante, incomparável.”

Mas sabe o que mais me tocou em ouvir e dizer palavras para alguém que já não ouve? Foi pensar o que dirão de mim quando eu me for.

Bom, tenho que dizer que sofri um acidente este ano, uma experiência de quase morte que absolutamente influenciou bastante neste pensamento. A necessidade de lutar pela vida e decidir que eu não queria morrer naquele momento me fez pensar no que tenho feito dela nos últimos 36 anos.

E mais, se fosse aquele o meu momento de ir, o que diriam no meu discurso fúnebre? Que fui uma colunista incansável por oito anos? Que tenho três romances inacabados? Que acreditei e lutei pelo amor a vida inteira? Que vivi cansada? Que não tive tempo pra fazer tudo o que queria?

Pense bem, o que dirão sobre você?

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