Antônio Gois
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Antônio Gois

Um espaço para debater educação

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Antônio Gois

Jornalista de educação desde 1996. Autor dos livros 'O Ponto a Que Chegamos'; 'Quatro Décadas de Gestão Educacional no Brasil' e 'Líderes na Escola'.

O fato de o IBGE ainda divulgar, em 2024, taxas de analfabetismo adulto no Brasil já é um demonstrativo de nosso atraso. Os dados do Censo 2022, divulgados na sexta-feira, mostram que 7% dos brasileiros com 15 anos ou mais não sabem ler e escrever um simples bilhete. Em perspectiva histórica, nossa defasagem é gritante. Os Estados Unidos, por exemplo, registravam em 1920, segundo o Centro Nacional de Estatísticas Educacionais (equivalente ao nosso Inep), um percentual de 6% de analfabetos. A partir de 1980, quando as taxas por lá ficaram inferiores a 1%, o foco nas divulgações passou a ser no analfabetismo funcional.

De acordo com o site Our World in Data, os 7% do Brasil atual foram verificados em 1970 na Argentina e no Uruguai. Uma base de dados da Harvard Business School mostra que a Coreia do Sul, que teve impressionante avanço no século passado, já em 1980 apresentava taxa inferior à do Brasil de 2022. De acordo com a mesma fonte, na França a barreira dos 7% foi ultrapassada entre 1920 e 1925. Em resumo, são 100 anos de atraso em relação aos EUA e França, 50 anos comparados a Uruguai e Argentina, e 40 ante a Coreia do Sul.

No caso brasileiro, o analfabetismo adulto está concentrado nas populações idosas. Na faixa de 65 anos ou mais, por exemplo, vai a 20%. Mas é preocupante constatar certa inércia demográfica nesse indicador, pois o principal motor de queda na taxa é meramente um efeito de substituição de uma geração mais velha por outra mais nova, e não o fato de mais adultos estarem aprendendo a ler e escrever.

Uma forma de identificar esse fenômeno é na comparação entre Censos, por faixa etária, acompanhando uma mesma geração. O Censo de 2000, por exemplo, indicava para o grupo populacional de 15 a 19 anos 5% de analfabetos. Em 2010 essa população passa a estar na faixa de 25 a 29 anos, com 4% de analfabetos. Como o Censo atual foi realizado apenas em 2022, essa geração passou a estar na faixa etária entre 37 e 41 anos, com 3,9% de analfabetos.

Essa inércia é ainda mais perceptível ao acompanharmos a evolução de uma geração um pouco mais velha, que tinha em 2000 entre 35 e 39 anos e apresentava, naquele ano, analfabetismo de 10,8%. Dez anos depois, já entre 45 e 49 anos, o percentual foi de 10,5%. Doze anos depois, com idade entre 57 e 61 anos, o Censo 2022 registrou 11,2% de analfabetos. Mesmo considerando que até pesquisas censitárias podem estar sujeitas a variações estatísticas, é possível inferir que a tendência foi de estabilidade e que pouquíssimos analfabetos com mais de 35 anos em 2000 aprenderam a ler e escrever nesse intervalo de 22 anos entre Censos. Alguns podem até ter regredido, o que não é impossível de acontecer quando o processo de alfabetização não é consolidado pela continuidade dos estudos na Educação de Jovens e Adultos.

Com muito atraso, ao menos caminhamos para a erradicação do analfabetismo entre os jovens (entre 15 a 24 anos, são 1,5%). Deveríamos, portanto, dar mais atenção ao analfabetismo funcional. Na ausência de indicadores oficiais sobre isso na população adulta, a melhor pesquisa que temos é o Inaf, iniciativa da ONG Ação Educativa e do Instituto Paulo Montenegro. Ao aplicar testes cognitivos para avaliar o nível de letramento e numeramento da população entre 15 e 64 anos, a última edição, de 2018, indicava que 8% dos brasileiros eram analfabetos totais, e outros 22% funcionais. Em 2001, o quadro era pior: 12% e 28%, respectivamente. Neste ano, esta prevista uma nova rodada da pesquisa, agora liderada pela consultoria Conhecimento Social e pela Ação Educativa.

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