Ficou agendada para a próxima terça-feira (2/7) a reunião entre representantes da cadeia produtiva do arroz e o governo federal para avaliar medidas alternativas à proposta do Executivo de realizar novo leilão para compra pública do cereal importado. A expectativa é que uma decisão seja tomada após a nova rodada de negociações. Anteriormente, o encontro estava previsto para esta sexta-feira (28/6).
Produtores deverão apresentar um documento ao governo em que garantem o abastecimento interno e mostram que o preço ao consumidor final está entre R$ 5 e R$ 7 por quilo, dentro da normalidade para quem compra e em linha com os custos dos agricultores.
A avaliação de momento entre os envolvidos nas discussões é que tudo se encaminha para a suspensão total do leilão. Tanto pelo desgaste político e a reação da cadeia do arroz quanto pelas informações técnicas colocadas na mesa para o governo que vão contra a necessidade de importação.
O IPCA-15, uma prévia da inflação, divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE) nesta semana, mostrou que os preços do arroz aos consumidores subiram 4,20% em junho na comparação com maio, bem atrás da batata inglesa (24,18%), leite longa vida (8,84%) e do tomate (6,32%).
Todo o período de coleta dos preços do indicador – de 16 de maio a 14 de junho – se deu já com efeito das enchentes no Rio Grande do Sul. As fortes chuvas que atingiram a região começaram em 27 de abril e ficaram mais intensas no início de maio.
No governo, há quem alimente a ideia de buscar uma trégua para esfriar a crise. Essa ala, próxima de ministros, inclusive, defende que o governo não insista em fazer mais leilões.
No entorno do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no entanto, a determinação é colocar a ideia inicial em prática e oferecer arroz barato à população mais pobre.
Uma pessoa que transita entre as Pastas e órgão envolvidos disse que se o setor apresentar uma alternativa segura que baixe os preços do arroz, o governo não fará leilão.
Prorrogação
Ontem, o Congresso Nacional prorrogou por mais 60 dias a validade da medida provisória 1.217/2024 que autoriza a aquisição do arroz importado pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Se não for votada e aprovada neste prazo, a MP “caduca” e os leilões para esse tipo de operação não poderão mais ser realizados após o vencimento da vigência.
A bancada ruralista faz pressão para alterar o texto e “proteger” a produção nacional, com a prioridade de empenho dos R$ 7,2 bilhões liberados para a compra do cereal brasileiro, caso haja necessidade de formação de estoques. O recesso parlamentar em julho também pode atrapalhar planos da base governista de aprovar a matéria, apesar de toda dificuldade que deverá enfrentar nos plenários da Câmara e do Senado.
Fontes a par das negociações afirmaram que houve um entendimento prévio entre setor e governo para que não sejam realizados leilões, ao menos, nos próximos dois meses.
Mesa de diálogo
Na semana passada, um primeiro encontro entre produtores e o primeiro escalão do governo, na sede do Ministério do Desenvolvimento Agrário, abriu espaço para a construção de uma medida alternativa ao leilão. Nessa quinta-feira (27/6), houve nova conversa virtual entre o setor, a Conab e o assessor especial do Ministério da Agricultura, Carlos Ernesto Augustin.
O governo quer a garantia de preços baixos aos consumidores nas gôndolas dos supermercados. O setor produtivo de arroz afirma que não há qualquer risco de desabastecimento interno. Os agricultores argumentam que o precedente da importação gera concorrência desleal e que a venda tabelada, a R$ 4 por quilo, prejudica a produção nacional.
Medidas duras
No governo, a avaliação é que as iniciativas adotadas até então surtiram efeito positivo no mercado, mesmo com a anulação do pregão realizado no início de junho. Indústrias relataram a integrantes da Esplanada que, caso não houvesse a movimentação para compra pública do cereal estrangeiro, as cotações do produto no Brasil estariam próximas de R$ 150 por saca de 50 quilos. Atualmente, os preços estão em R$ 113,75, segundo o Cepea.
O Executivo também faz o cálculo do desgaste político do episódio. O certame precisou ser anulado por suspeitas de irregularidades nas empresas participantes e pelo envolvimento pessoal de operadores do pregão com integrantes do governo. Neri Geller, ex-secretário de Política Agrícola do Ministério da Agricultura, e Thiago dos Santos, ex-diretor de Operações e Abastecimento da Conab, foram demitidos.
Essas “medidas mais duras”, de exoneração do secretário e do diretor, foram necessárias para resguardar a imagem do governo, avalia um interlocutor.
Edital
A Conab realizou uma reunião com a Controladoria-Geral da União (CGU) ontem para discutir o aprimoramento das normas para a realização de leilões públicos.
“A partir desse trabalho conjunto estão sendo feitos ajustes nas normas de compras da Conab, no cadastro das empresas e no sistema de informática para dar mais robustez e segurança a todo o procedimento dos leilões”, informou a estatal em comunicado.
CPI
Na próxima semana, a Comissão de Agricultura da Câmara dos Deputados vai ouvir o ex-diretor da Conab Thiago dos Santos sobre o episódio. Também continua em curso a coleta de assinaturas pelo deputado Luciano Zucco (PL-RS) para pedir a instalação de um CPI do Arroz.
Os parlamentares miram o envolvimento de outros políticos com a medida. A mira está em Rui Costa, ministro-chefe da Casa Civil, ministério que coordenou reuniões técnicas sobre o assunto e teria sido o responsável pela decisão de realizar o leilão nos parâmetros definidos. Essa foi a versão, por exemplo, apresentada por Geller em audiência na mesma comissão em junho.
Insegurança
Ontem, o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, disse que a ideia de leilão para compra de arroz importado gera insegurança aos produtores gaúchos no planejamento de safras futuras. Ele defendeu que o governo federal abandone a ideia de realizar o certame e utilize os recursos bilionários liberados para a medida em ajuda ao Estado.
“O governo teve que abortar essa compra e tem uma oportunidade de rever esse posicionamento e usar os recursos que iria canalizar até R$ 7 bilhões para fazer o investimento na produção agrícola do país, em especial, no Rio Grande do Sul”, afirmou Leite durante no Global Agribusiness Fórum (GAFFFF), em São Paulo.