A criação de muitos dos unicórnios brasileiros está diretamente ligada às experiências pessoais de seus fundadores, e que resultaram no desejo de desenvolver uma solução inovadora para um problema identificado em um setor. Este também é o caso da Frete.com, cujo escopo nasceu depois que o argentino Federico Vega identificou algumas das principais dores presentes no setor de logística na América Latina, incluindo a falta de infraestrutura para os caminhoneiros e uma grande burocracia nos processos.
Nascido em Puerto Madryn, uma cidade na Patagônia (sul da Argentina), Vega começou a andar de bicicleta pelas estradas da região aos 8 anos. Mais tarde, foi estudar na Inglaterra e acabou ingressando no banco JP Morgan. Ali, foram bons anos de crescimento profissional e financeiro, "mas percebi que não estava feliz com a área de investimentos. Avaliei o que realmente gostava de fazer", contou Vega, em entrevista a Época NEGÓCIOS.
Pensando nas experiências que teve pelas estradas latinas, Vega percebeu que os locais de parada dos caminhões funcionavam como uma espécie de marketplace offline. "As empresas buscavam transporte e os caminhoneiros estavam atrás de cargas, mas havia muitos conflitos. Eu já trabalhava com tecnologia no banco e percebi que podia tentar resolver esse conflito usando meios digitais. Saí do banco em 2011, voltei para a América Latina e criei a Transportar Online, que foi a primeira versão da empresa", relembra.
Conexão entre caminhoneiros e cargas
Com a Transportar Online, a intenção de Vega era criar uma solução que conseguisse conectar caminhoneiros e cargas, ou seja, uma plataforma que funcionasse como uma ponte entre os caminhoneiros e as transportadoras, facilitando o processo para ambos.
Para a ferramenta dar certo, ele passou meses rodando a América Latina e conversando com diversos motoristas, a fim de entender quais eram as suas reais necessidades.
Depois do 'laboratório', o executivo escolheu o Chile para iniciar o negócio e, posteriormente, a Argentina. No entanto, depois de um período de acertos e erros, Vega decidiu mudar de mercado. Em 2013, ele veio para o Brasil e começou a empresa do zero, inclusive com um novo nome: CargoX.
"Me lembro de ter escutado de um investidor cinco motivos pelos quais eu ia fracassar por aqui. O primeiro era que eu estava em um dos países mais complexos do mundo. O segundo era que eu estava em um dos setores mais complexos do país mais complexo do mundo (risos). Também ouvi que eu era de fora dessa área. O quarto ponto era que eu não falava português muito bem na época. E o quinto motivo do meu fracasso seria porque que eu era argentino (risos). O dia em que eu escutei isso foi um dos piores da minha vida", conta.
A holding Frete.com
As previsões sobre a trajetória de Vega no Brasil estavam erradas. Depois de 10 anos crescendo e se destacando no setor, em novembro de 2021, a CargoX se tornou um unicórnio, após um aporte de US$ 200 milhões liderado pelo SoftBank e pela Tencent. A empresa nunca divulgou exatamente o seu valor de mercado, mas o aporte a fez ultrapassar o US$ 1 bilhão.
Na ocasião, a companhia também mudou o seu nome para Frete.com. A mudança de nome foi estratégica, a fim de apresentar o novo momento da empresa, que se tornou uma holding contendo três braços de investimentos: a marca CargoX, que passou a designar o aplicativo de intermediação de fretes; a fintech FretePago, focada em empréstimos para caminhoneiros; e a Fretebras, um marketplace no qual caminhoneiros e empresas se encontram para negociar o transporte de cargas.
Segundo a empresa, suas receitas vêm da intermediação financeira dos empréstimos, da mensalidade paga pelas transportadoras e da oferta de serviços digitais.
América Latina ainda em foco
O aporte também gerou planos de aumentar a equipe - "de 1,3 mil para 3,5 mil funcionários em um ano, especialmente para a área de tecnologia", disse Vega, um mês depois do aporte. "Um outro passo será começar a internacionalização do grupo. Temos muitos caminhões em nossa plataforma que vão para a Argentina e o Paraguai e depois voltam vazios, rodando sem carga por até 5 mil quilômetros. Queremos expandir para esses países, para encontrar viagens de retorno para eles", concluiu.
Dois anos e meio depois, a Frete.com não aumentou o número de funcionários. Pelo contrário, no ano passado, a empresa demitiu 15% de sua força de trabalho. Segundo a startup, a alta mundial dos juros e a desaceleração da economia teriam motivado os cortes.
Os investimentos mirando o mercado latino-americano, no entanto, continuam. Em 2022, a empresa anunciou um investimento de R$ 300 milhões em aquisições de empresas de tecnologia no setor logístico.
Em meio aos planos da empresa, o que não se vê é a projeção para o IPO. Segundo Vega, a empresa não pensa nessa opção - e nem o mercado anda favorável para tal.