50 + vida e trabalho

Por Maria Tereza Gomes


Alejandra Rodríguez | Miss Universo BA — Foto: Reprodução
Alejandra Rodríguez | Miss Universo BA — Foto: Reprodução

Eu resisti por algumas semanas a escrever sobre o assunto da minha coluna de hoje. Confesso que começo este texto sem ter concluído o que pensar sobre o fato de que Alejandra Marisa Rodríguez se tornou, em abril, a primeira mulher a vencer o concurso Miss Buenos Aires aos 60 anos de idade (no final de maio, na etapa nacional, ela ficou entre as 15 melhores e recebeu o prêmio especial de Miss Rosto). No Equador, Yajaira Quizhpi, 46 anos, também chegou à final nacional há alguns dias. Suas conquistas são resultado da mudança no regulamento global do Miss Universo, que no ano passado eliminou a barreira de 28 anos para as participantes. Por que essas notícias me incomodam? Pela sensação de que essas mulheres, certamente lindas e inteligentes, não estão vivendo a própria idade. Elas não ganharam porque têm 60 anos, com a flacidez e estrias naturais dos 60 anos. Elas ganharam porque parecem ter 20.

Eu não as conheço pessoalmente, sei apenas o que li nas muitas reportagens publicadas na internet. Por isso, talvez seja preconceito meu, talvez eu não esteja conseguindo enxergar o assunto em profundidade, talvez eu não esteja admitindo que elas têm o direito de fazer o que quiserem com suas vidas. Provavelmente, seja um pouco de tudo isso. O que quero com este texto é manifestar quanto a notícia me impactou - e não foi no sentido positivo. Eu vou fazer 60 anos em alguns meses e não consigo me inspirar na história de Alejandra, uma consultora jurídica, formada em direito e jornalismo, que, numa entrevista para a emissora El Trece, celebrou estar rompendo paradigmas de beleza relacionados à idade: “Estamos inaugurando uma nova etapa em que a mulher não é só a beleza física, mas, sim, um outro conjunto de valores. É muito importante o que está acontecendo.”

Precisamos ser honestos aqui: o concurso Miss Universo nunca foi sobre um "conjunto de valores", sempre foi sobre o padrão de beleza física da mulher magra, acima de 1,70 m (Alejandra tem 1,68 m), com simetria facial, corpo tonificado e musculatura definida. Mas tudo sem exagero, claro. Se não fosse assim, teríamos vencedoras com 1,60 m ou outra deixando escapar gordurinhas aqui e ali na prova com traje de banho porque seus valores falaram mais alto. Acho ótimo que Alejandra tenha declarado seguir um estilo de vida saudável, que se alimenta bem (é adepta do jejum intermitente) e faz exercícios físicos. "Cuidados normais, nada de muito extraordinário. E um pouco de genética, claro.” São hábitos que a ciência já provou que ajudam a ter uma vida mais longa e saudável.

Quando eu tinha cerca de 20 anos e fazia faculdade de jornalismo em Curitiba, fui algumas vezes acampar na Ilha do Mel, então um paraíso preservado do litoral paranaense. Não havia chuveiro, não havia restaurante, não havia infraestrutura. Era uma delícia caminhar pelas trilhas, ir a praias desertas e comer bolacha de água e sal ou qualquer alimento que o pescador estivesse disposto a compartilhar. Voltei duas vezes em anos recentes e, embora lamente o paraíso perdido com a mudança da lei de ocupação local, preferi me alojar numa pousada com chuveiro quente e cama macia. Ou seja, há coisas que a gente faz aos 20, mas não aceita fazer aos 60. Acho que a miss de 60 anos segue a mesma caricatura do maratonista de 70, usada pelos meus colegas jornalistas, quando querem pretensamente louvar a longevidade. Nós, que temos mais de 50, precisamos lembrar que eles são uma exceção, e não a regra. A vida real do envelhecimento é bem diferente.

*Maria Tereza Gomes é jornalista, mestre em administração de empresas pela FEA-USP, CEO da Jabuticaba Conteúdo e mediadora do podcast “Mulheres de 50”

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