Cidades

Por Laura Raffs


Como a falta de planejamento urbano causou tragédia no litoral norte de São Paulo — Foto: Reprodução/Governo de São Paulo
Como a falta de planejamento urbano causou tragédia no litoral norte de São Paulo — Foto: Reprodução/Governo de São Paulo

No último final de semana, o litoral norte de São Paulo foi assolado por fortes chuvas, que culminaram em enchentes e deslizamentos. A tragédia deixou 54 mortos e mais de 750 pessoas desabrigadas. Para se ter ideia, em Juquehy, praia de São Sebastião, choveu o equivalente a 694 litros de água durante 18 e 19 de fevereiro – em contrapartida, durante os meses de janeiro e fevereiro de 2022, o mesmo local apresentou um índice de 397 litros.

O aumento dos índices de chuva já era algo previsto por conta das consequências das mudanças climáticas. Segundo o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da ONU, o planeta está caminhando para atingir um nível de aquecimento global de 1,5ºC (ou até 2ºC) em relação ao período pré-industrial, o que gera chuvas cada vez mais concentradas e intensas.

Porém, os efeitos do aquecimento global não são os únicos causadores do episódio que aconteceu no litoral norte de São Paulo. De acordo com dados do MapBiomas, a região passou por uma urbanização crescente e desenfreada. Desde 1985, São Sebastião, que foi o município mais afetado, viu sua área urbana crescer em 345,8%, atingindo 1.810 hectares em 2021.

“Houve uma enorme demanda nesta região, de Bertioga a Ubatuba, por ocupação de veraneio, turística e de hotelaria. Isso não é necessariamente negativo, mas o que aconteceu é que este aumento exponencial não foi acompanhado de medidas de proteção ao próprio patrimônio natural. A galinha dos ovos de ouro vem sendo lentamente assassinada”, explica Valter Caldana, conselheiro do CAU-BR e professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie.

Dessa forma, os terrenos mais próximos à orla tiveram uma valorização e foram ocupados por construções e empreendimentos de alto padrão. Ainda, a planície costeira da região apresenta uma configuração estreita. Essas condições resultaram na expulsão da população de baixa renda para os morros residuais e sopé da serra, áreas com maior risco de deslizamento.

“Não é acidente, é recorrente. Tivemos a situação de Petrópolis, as cidades da Bahia em 2021 e outros casos. O que acontece é que as pessoas de baixa renda ocupam áreas irregulares, que ainda estão em processo de consolidação, e ainda em moradias precárias – é um desastre anunciado. Em paralelo, também temos o aumento de chuvas ocasionado pelas mudanças climáticas”, comenta a arquiteta e urbanista Nadia Somekh, presidente do CAU-BR.

Também existem casas e outros empreendimentos de alto padrão que ocupam áreas de risco – ou mesmo espaços destinados à preservação ambiental. Porém, essas construções possuem estrutura reforçada e, por isso, são menos atingidas. Ainda, com o desmatamento e a retirada da vegetação nativa, o solo se torna mais impermeável, ou seja, perde sua capacidade de absorção de água, tornando a região ainda mais vulnerável a enchentes e deslizamentos.

“As populações mais vulneráveis não possuem lugar na cidade: os preços da terra impedem essas pessoas de encontrar uma moradia digna, o que culmina na ocupação de áreas irregulares”, completa Nadia Somekh. Segundo dados de 2010 do IBGE, em 872 municípios mapeados, foram encontradas 8,2 milhões de pessoas vivendo em áreas de risco.

A região mais afetada

Como a falta de planejamento urbano causou tragédia no litoral norte de São Paulo — Foto: Governo de São Paulo/Divulgação
Como a falta de planejamento urbano causou tragédia no litoral norte de São Paulo — Foto: Governo de São Paulo/Divulgação

A Vila Sahy, na cidade de São Sebastião, foi a região mais afetada pelas chuvas no litoral de São Paulo. O local consiste em uma ocupação irregular, localizada em uma área de preservação às margens da rodovia Rio-Santos. O espaço começou a ser habitado em 1987, quando a vegetação foi retirada para realização de obras e melhorias na estrada.

Um relatório da administração local mostra que havia cerca de 648 imóveis e 779 famílias na área até 2018. Estes moradores são, em sua maioria, pessoas de baixa renda que trabalham em condomínios, casas de alto padrão e hotéis da região. Ainda, a região carecia de infraestrutura básica: segundo o Ministério Público, não havia sistema de abastecimento de água potável ou ligação de energia elétrica na Vila Sahy.

Para completar, a área já tinha sido atestada como uma região com risco para deslizamentos. Duas avaliações foram responsáveis pela constatação, uma feita pelo Instituto Geológico em 1996 e outra pelo Ministério Público Estadual em 2020.

O Laboratório de Projetos e Políticas Públicas da FAU-Mackenzie, coordenado pelo professor Valter Caldana, elaborou um projeto com soluções para a Vila Sahy, com o objetivo de evitar tragédias como a que aconteceu. A proposta foi feita em parceria com o Governo do Estado de São Paulo para ser implantada inicialmente na região e, depois, ser reproduzida em outras áreas litorâneas.

“O projeto previa desde a remoção de pessoas em área de risco, colocando-as em novos empreendimentos ali mesmo na região, adequados a cultura caiçara e a questões de sustentabilidade, assim como pressupunha, na escala regional, o adensamento dos municípios de forma que houvesse uma oferta de moradia mais intensa e adequada, evitando a pressão para que se criasse loteamento no pé da serra”, explica Valter sobre a parte relacionada à moradia abarcada pelo projeto.

Como solucionar o problema?

Como a falta de planejamento urbano causou tragédia no litoral norte de São Paulo — Foto: @prefeitoFA/Reprodução
Como a falta de planejamento urbano causou tragédia no litoral norte de São Paulo — Foto: @prefeitoFA/Reprodução

Antes de tudo, é necessário que o Brasil saia do modo “emergência”, ou seja, que trabalhe para prevenir as enchentes e deslizamentos. Para isso, as três esferas do governo e a sociedade civil precisam atuar na criação de políticas públicas que promovam a adaptação das áreas urbanas e rurais às mudanças climáticas.

Estas medidas vão além de retirar a população das áreas de risco, já que é preciso ocorrer mudanças drásticas de infraestrutura e o mapeamento destes espaços, combatendo o surgimento de novas regiões sujeitas a deslizamentos e outros desastres ambientais. “É necessário que os municípios revejam seus planos diretores e os adequem aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e ao Acordo de Paris”, completa Nadia Somekh.

Além disso, Valter Caldana ressalta: “O governo não é o único responsável. O poder público tem a obrigação de fazer legislação, articular financiamentos, cuidar da educação e da fiscalização. Porém, a iniciativa privada precisa investir maciçamente em pesquisa e desenvolvimento, além de projetos adequados e sistêmicos, que respeitem a complexidade da área”.

Outra questão essencial é a criação de políticas públicas habitacionais, permitindo que as pessoas de baixa renda tenham acesso a moradias dignas. “O primeiro passo é mapear as áreas de risco, cuidar das moradias precárias do país, reforçando suas estruturas, e realocar a população. Além disso, é imprescindível fazer um plano municipal de habitação, construindo novas moradias e dando um lugar para a população de baixa renda”, afirma Nadia.

Como ajudar as vítimas?

Abaixo, veja como auxiliar as pessoas que sofreram com a tragédia no litoral norte. As informações são do site oficial do Governo do Estado de São Paulo.

Para doar cestas básicas:

Conta Bancária
Banco do Brasil
Agência nº 1897-X
Conta corrente nº 19.490-5
CNPJ/MF nº 44.111.698-0001/98

Chave Pix:
CNPJ/MF nº 44.111.698-0001/98

Para doar cobertores:

Conta Bancária
Banco do Brasil
Agência nº 1897-X
Conta corrente nº 19.771-8
CNPJ/MF nº 44.111.698-0001/98

Chave Pix:
doacoesfussp@sp.gov.br

Principais pontos de arrecadação:

Estações de metrô e trem

As empresas ligadas à Secretaria de Transportes Metropolitanos como a CPTM, EMTU, Metrô e a Estrada de Ferro Campos do Jordão estão com 193 pontos de arrecadação distribuídos nos terminais e estações para doações às vítimas das chuvas no Litoral Norte.

As concessionárias ViaMobilidade e Via Quatro também estão participando da campanha e tem pontos de coletas em todas as estações.

Etecs e Fatecs

Tanto nas unidades mais próximas das regiões onde ocorreram os deslizamentos como nas mais distantes, alunos, professores e funcionários do Centro Paula Souza se mobilizam em campanhas de arrecadação de água potável, alimentos, colchões, roupas e produtos de higiene.

  • Caraguatatuba

O Centro Esportivo Municipal (Cemug) está recebendo doações organizadas pelo Fundo Social de Caraguatatuba. Quem quiser doar, basta se dirigir a Avenida José Herculano, 50, no Jardim Britânia, das 8h às 18h. Para mais informações, ligue para: (12) 3897-5656.

  • São Sebastião

O Fundo Social de São Sebastião está recebendo doações em sua sede, na rua Capitão Luiz Soares, 33 – Centro. As regionais da Secretaria de Serviços Públicos (SESEP) também estão recebendo doações. Para mais informações ligue para (12) 3892-4991.

O CAE (Centro de Apoio Educacional) do Pontal, na rua Vereador João Orlando de Carvalho, 410, em São Sebastião, também está recebendo doações.

Além disso, São Sebastião está recebendo doações em dinheiro.

Banco do Brasil
Agência: 0715-3
Conta corrente: 54708-5
Ou Chave Pix: CNPJ 28.086.952/0001-99

O Instituto Verdescola também recebe doações no endereço Av. Marginal, 44 – Praia Barra do Sahy, ou via pix: verdescola@verdescola.org.br.

  • Ubatuba

O Fundo Social de Solidariedade de Ubatuba está arrecadando doações na Av. Governador Abreu Sodré – Perequê-Açu e também está recebendo doações em dinheiro.

Banco Santander
Agência: 0502
Conta Corrente: 45.000012-9
Titular: Prefeitura Municipal de Ubatuba (Fundo Social de Solidariedade)
CNPJ: 46.482.857/0001-96
Para mais informações, ligue (12) 3833-1021.

  • Guarujá

O Fundo Social de Solidariedade de Guarujá estará recebendo doações a partir de quinta-feira (23), na rua Cavalheiro Nami Jafet, 549 – Centro, das 8h às 17h.

Para mais informações, ligue (13) 3386-4324.

  • Bertioga

O Fundo Social de Solidariedade de Bertioga está recebendo doações na rua Walter Pereira Prado, 77 – Centro, das 8h às 17h. Para mais informações, ligue (13) 99787-6600 / 3317-1397.

  • Ilhabela

O Fundo Social de Ilhabela está recebendo doações na rua Guaiamu, 56 – Perequê. Para mais informações, ligue para (11) 99932-7150.

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