Testes de Carros
Por — Barcelona (Espanha)

Barcelona (Espanha) é uma perdição para turistas. Sagrada Família, Parque Güell e Casa Batlló são paradas obrigatórias ao amantes de arquitetura. Aos fãs de futebol, os estadios Camp Nou e Olímpico respiram história do esporte. Mas o ápice da nossa passagem pela Catalunha foi longe desses lugares. Começou na sinuosa estrada BP-1103, a bordo do brutal Hyundai Ioniq 5 N, o único carro elétrico produzido até hoje por qualquer fabricante que consegue ser (muito) parecido com um veículo a combustão.

Com o belíssimo cenário de um dia ensolarado, sem nuvens, e com a montanha do Montserrat ao fundo, curva vai, curva vem, e cada pisada no pedal do acelerador com o modo N ativado me desperta uma sensação que jamais tive com um carro elétrico. Os números são superlativos, é verdade: 650 cv de potência e 78,5 kgm de torque no modo N Grin Boost. No modo padrão, são “só” 609 cv e 75,5 kgfm. Mas não é isso que mais impressiona.

Hyundai Ioniq 5 N é a versão mais extrema do Ioniq 5 — Foto: Divulgação
Hyundai Ioniq 5 N é a versão mais extrema do Ioniq 5 — Foto: Divulgação

O volante treme como se houvesse um motorzão V8 trabalhando a todo vapor dentro do cofre. A aceleração parece progressiva, e acredite: você sente até trocas de marchas e trancos de reduções com um conta-giros no painel. Nada disso existe de fato, mas é tudo muito real e enigmático. “Nunca ninguém chegou perto disso”, pensava.

Para a experiência ficar ainda melhor, ao ativar o N Active Sound+, um som artificial de carro esportivo toma conta da cabine. Mal dá para conversar — até eu que sou contra o uso de som artificial em carros elétricos me rendi nesse caso —, mas quem está do lado de fora do carro não ouve nada.

Empolgação à parte, tudo isso tem explicação e é fruto de um projeto pioneiro. O Ioniq 5 é o primeiro carro elétrico feito pela N, divisão esportiva da Hyundai que reuniu equipes da empresa na Europa, na Coreia do Sul e nos Estados Unidos.

Apresentado em julho de 2023, durante o lendário festival de Goodwood, no Reino Unido, o carro foi desenvolvido por uma equipe formada por mais de cem engenheiros, liderados por Albert Biermann. Este trabalhou na divisão M da BMW por 30 anos e virou Consultor Técnico Executivo do Hyundai Motor Group em 2014.

A fase final de desenvolvimento do Ioniq 5 N foi feita no lendário circuito de Nürburgring Nordschleife, na Alemanha, onde o elétrico foi conduzido por 10 mil km até atingir a marca expressiva de completar uma volta em 7min45s59. Tornou-se, assim, o modelo mais rápido da história da Hyundai a completar o percurso de 20,8 km.

Hyundai Ioniq 5 N tem bancos esportivos e aletas para simular troca de marchas — Foto: Divulgação
Hyundai Ioniq 5 N tem bancos esportivos e aletas para simular troca de marchas — Foto: Divulgação

Mas como ocorre toda essa semelhança com um carro a combustão? Por meio de softwares. Claro que a Hyundai não revela a fórmula do sucesso, já que há uma corrida na indústria para dar aos carros elétricos a dinâmica de carro a combustão. Porém, é evidente que há mecanismos nas portas, no volante e nos pedais para passar aquela vibração de um poderoso motor V8 para o motorista.

Hyundai Ioniq 5 N tem o interior com ótimos materiais — Foto: Divulgação
Hyundai Ioniq 5 N tem o interior com ótimos materiais — Foto: Divulgação

Já as “trocas de marchas” são feitas por um sistema chamado N e-shift, que simula um câmbio automatizado de oito marchas com dupla embreagem. Pelas borboletas atrás do volante, a cada comando, um software controla a entrega de torque e potência para simular essas trocas. A impressão, na prática, é de que por um milésimo de segundo essa entrega de força é interrompida para ampliar a sensação de progressão de velocidade e troca de marchas.

Muita gente (sem grande experiência com carro elétrico) que andar nesse carro pode ficar na dúvida se é um veículo elétrico ou a combustão. Entretanto, se o motorista desabilitar os modos N e Sport+, bem como o ensurdecedor N Active Sound+, chega à “versão civil” do Ioniq 5 N. Aqui, encontra silêncio a bordo. No modo Eco, as borboletas otimizam a regeneração da bateria nas desacelerações em vez de brincar de troca de marchas.

Hyundai Ioniq 5 N foi desenvolvido por Albert Biermann que trabalhou na divisão M da BMW por 30 anos — Foto: Divulgação
Hyundai Ioniq 5 N foi desenvolvido por Albert Biermann que trabalhou na divisão M da BMW por 30 anos — Foto: Divulgação

Percorri cerca de 80 km entre a saída da cidade e a subida da serra, até chegar ao circuito Parcmotor Castellolí. As curvas da BP-1103 seguem me acompanhando na pista fechada: são 12 ao todo. O cenário também continua belo: na encosta da montanha Monserrat, cheia de rochas e vegetação ao longo dos 4.140 km de extensão do traçado.

Antes de acelerar, ouço as orientações do instrutor sobre a pista e, claro, ativo o modo N e o N Active Sound+. A primeira volta é de reconhecimento de traçado, porque o percurso é desafiador. Muitas curvas são fechadas e há trechos de subidas e descidas.

Pneus Pireli P-Zero foram desenvolvidos para as pistas; rodas de 21 polegadas são exclusivas da versão N — Foto: Divulgação
Pneus Pireli P-Zero foram desenvolvidos para as pistas; rodas de 21 polegadas são exclusivas da versão N — Foto: Divulgação

Em relação ao Ioniq 5 comum, que chegará ao Brasil entre agosto e outubro, as mudanças são consideráveis para ganhar reforços estruturais e aumentar a rigidez torsional. As bitolas são mais largas em 2,5 cm no eixo dianteiro e 5,5 cm no eixo traseiro. Já as rodas de 19 polegadas dão lugar às de aro 21 com pneus Pirelli P-Zero 275/35 R21. Os discos de freios são 400 mm maiores na dianteira e 360 ​​mm na traseira, com pinças de quatro pistões cada. Eles só não são de carbono-cerâmica, porque isso poderia interferir no sistema de frenagem regenerativa, segundo a Hyundai.

Nas primeiras três voltas, dá para extrair o máximo que o carro elétrico pode oferecer. Os bancos esportivos mantêm o corpo bem firme para você não ser jogado de um lado para o outro nas curvas mais fechadas. Os 3 metros de entre-eixos deixam um ótimo espaço para motoristas altos, como é o meu caso. Para fechar o teste com chave de ouro, o ponto máximo na pista foi o launch control — em bom português, controle de largada.

Coloco o pé esquerdo no pedal do freio e o direito no acelerador. Pressiono ambos por uns 5 segundos com a simulação do motor a combustão gritando mais alto do que nunca na minha orelha. Tiro o pé do freio e o carro dispara tão forte que o tranco gruda meu corpo no banco involuntariamente. Em apenas 3,4 s, o Ioniq 5 N vai de 0 a 100 km/h. Sua velocidade máxima é de 260 km/h.

Deixando a esportividade de lado, quando pensamos no hatch para uso no dia a dia, com o silêncio de um elétrico convencional, o cenário muda. A suspensão é muito dura e o banco esportivo pode jogar contra o conforto do motorista depois de certo tempo. O Ioniq 5 N não está descartado para o Brasil, mas a chance de vir é muito pequena.

Hyundai Ioniq 5 N tem até 650 cv de potência — Foto: Divulgação
Hyundai Ioniq 5 N tem até 650 cv de potência — Foto: Divulgação

O preço é uma das principais barreiras: na Europa, custa 65 mil euros, o equivalente a R$ 360 mil. Levando em consideração que o Imposto de Importação para carros elétricos chegará a 35% até 2026, o modelo certamente ultrapassaria os R$ 500 mil.

De acordo com apuração de Autoesporte, o Elantra N tem muito mais chance de vir — entre 2025 e 2026. O que a Hyundai fez com o Ioniq 5 N, nenhuma fabricante chegou perto de fazer com um elétrico. Posso dizer que presenciei a história sendo feita em Barcelona. O que nos resta é torcer para o carro chegar ao Brasil.

  • Ponto positivo: Elétrico simula um esportivo a combustão de modo quase perfeito
  • Ponto negativo: Desconforto da suspensão pensando no uso no dia a dia

Hyundai Ioniq 5 N

Ficha técnica
Preço: 65 mil euros
Motores: Dois elétricos (um em cada eixo)
Potência: 609 cv (650 cv com N Grin Boost)
Torque: 75,5 kgfm (78,5 kgfm com N Grin Boost)
Câmbio: Marcha única + ré (8 marchas simuladas no modo N)
0 a 100 km/h: 3,4 segundos
Bateria: 84 kWh (íons de lítio)
Autonomia: 448 km (WLTP)
Carregamento máx.: 11 kWh (AC) e 240 kWh (DC)
Direção: Elétrica
Suspensão: McPherson (diant.) e multilink (tras.)
Freios: Discos ventilados
Pneus: 275/35 R21
Porta-malas: 480 litros (fabricante)
Peso: 2.194 kg
DIMENSÕES
Comprimento: 4,41 metros
Largura: 1,94 m
Altura: 1,58 m
Entre-eixos: 3 m

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