Entenda o que pode ocorrer nos quatro processos criminais contra Trump

Primeiro ex-presidente americano condenado em ação criminal pode se tornar o primeiro mandatário direto de uma prisão

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Washington

Donald Trump tornou-se o primeiro ex-presidente americano condenado em uma ação criminal, e nada o impede de tornar-se o primeiro mandatário dos EUA diretamente de uma prisão.

A sentença do republicano será divulgada apenas em 11 de julho, e pode assumir diversos formatos, de serviço comunitário até reclusão por um período máximo de quatro anos para cada um dos 34 crimes cometidos.

O ex-presidente Trump chega à Trump Tower depois de seu julgamento
O ex-presidente Trump chega à Trump Tower depois de seu julgamento - Timothy A. Clary/AFP


Trump já afirmou que vai recorrer do veredicto e, enquanto a apelação estiver tramitando, é provável que não comece a cumprir sua pena.

"Seria incomum que as coisas sejam tão aceleradas a ponto de obtermos uma decisão sobre qualquer apelação antes da eleição de novembro, e quase certamente não seria da corte mais alta de Nova York ou da Suprema Corte", escreve o professor de direito e ciência política Rick Hansen, autor do Blog de Direito Eleitoral.

Uma situação inusual pode emergir caso Trump esteja cumprindo pena de prisão no dia da eleição, em 5 de novembro: ele poderia vencer a disputa pela Presidência, mas seria impedido de votar —a Flórida, domicílio eleitoral de Trump, não permite que detentos cumprindo pena participem do pleito.

Além do julgamento concluído nesta quinta-feira (30), que trata da falsificação de documentos para encobrir pagamentos para comprar o silêncio da atriz pornô Stormy Daniels às vésperas da eleição de 2016, há outros três processos criminais contra o empresário pendentes.

Veja o que pode acontecer com Trump em cada um dos processos e o futuro da Casa Branca a depender do resultado da eleição.

1.Compra de silêncio de Stormy Daniels para manipular a eleição de 2016

No primeiro processo criminal contra um ex-presidente na história dos Estados Unidos, Trump foi condenado por ter falsificado registros empresariais para encobrir pagamentos a atriz pornô Stormy Daniels e, assim, evitar que ela revelasse durante a campanha de 2016 ter supostamente mantido relação sexual com o empresário em 2006. O pagamento de US$ 130 mil foi feito pelo ex-advogado e "faz tudo" de Trump, Michael Cohen.

Trump pode ser preso?
Sim. A legislação prevê até quatro anos de prisão pelos crimes pelos quais ele foi condenado por um júri em Nova York. Acredita-se, no entanto, que o juiz vá optar por uma sentença mais branca, como liberdade condicional, considerando que Trump é réu primário e as infrações, leves.

Se ele for preso, pode concorrer à Presidência?
Sim. Nada na Constituição americana impede que um criminoso condenado, e mesmo preso, concorra à Presidência. Os únicos requisitos para um candidato são ter ao menos 35 anos de idade, ser um cidadão americano nascido no país, e residir em seu território há ao menos 14 anos.

E o que acontece se ele for preso e vencer a eleição?
Assim como a Constituição não trata de um candidato à Presidência condenado, ela tampouco fala o que acontece com se alguém encarcerado for eleito. Assim, esse cenário abriria uma grande crise legal nos EUA, que deve chegar à Suprema Corte. Por um lado, poderia-se invocar a 25ª emenda, que trata do que acontece quando um presidente é incapaz de exercer seus poderes e deveres, para transferir o cargo ao seu vice. Isso exigiria, no entanto, que tanto o vice de Trump, quanto a maior parte de seus secretários (equivalentes a ministros) apoiem essa ação –algo pouco provável, já que o republicano deve escolher aliados leais para esses postos.Assim, o que se considera mais factível é que o empresário argumente na Justiça que deve ser solto para que possa cumprir os deveres constitucionais da Presidência, uma vez eleito.Como a condenação ocorreu na Justiça estadual de Nova York, Trump não pode se conceder um indulto presidencial –essa ferramenta só pode ser usada para condenados pela Justiça federal.

2. Posse ilegal de documentos sigilosos após deixar a Casa Branca

Após deixar a Casa Branca, Trump teria levado consigo, ilegalmente, documentos sigilosos que tratam da segurança nacional dos Estados Unidos. Fotos mostram caixas de papéis empilhadas até em um banheiro do resort Mar-a-Lago, na Flórida. Além do ex-presidente, há mais dois réus nesse caso: Walt Nauta, ajudante de Trump, e o português Carlos De Oliveira, gerente da propriedade.

Em que pé está este processo?
O julgamento chegou a ser marcado para começar em 20 de maio, mas foi adiado indefinidamente pela juíza Aileen Cannon –nomeada por Trump– enquanto questões pré-julgamento não são resolvidas.

Trump pode ser preso?
Sim. São 40 acusações, referentes a retenção intencional de informação de defesa nacional e conspiração para obstrução da Justiça. Desse total, 32 preveem reclusão de até 10 anos cada, 6 de até 20 anos, e 2 de até 5 anos.

O que acontece se ele for eleito antes de ser julgado?
Como o caso tramita na Justiça federal, é provável que o Departamento de Justiça sob uma Presidência Trump arquive as acusações. Há um precedente que poderia ser utilizado para isso: em um memorando em 1973, conhecido como "memorando Nixon", a pasta estabeleceu que não acusa presidentes no cargo.

E se ele for condenado e eleito?
Trump poderia usar o indulto presidencial para se "autoperdoar". No entanto, há um debate entre juristas nos EUA –muitos afirmam que esse uso inédito da prerrogativa presidencial poderia ser questionada na Justiça ou até base para um pedido de impeachment no Congresso.

3.Tentativa de reverter a derrota na eleição de 2020

Derrotado por Joe Biden nas eleições de 2020, Trump afirmou, sem provas, que a eleição foi fraudada e buscou formas de se manter no poder, desrespeitando o resultado das urnas, afirma a acusação. O ápice desses esforços foi a invasão do Capitólio, em 6 de janeiro de 2021, quando uma multidão de apoiadores do republicano tentou impedir a confirmação da vitória dos democratas. É o primeiro processo referente a crimes que Trump teria cometido enquanto era presidente.

Em que pé está este processo?
O julgamento chegou a ser marcado para começar em 4 de março, mas foi suspenso enquanto a Suprema Corte decide se Trump possui imunidade presidencial por crimes supostamente cometidos enquanto estava no cargo, como argumenta sua defesa. Se os juízes decidirem em favor dessa tese, o processo é arquivado. No entanto, na audiência em que o caso foi discutido, os juízes sinalizaram que devem reconhecer a imunidade em algumas situações, e direcionar a discussão para definir em quais ela se aplica para instâncias inferiores. Ou seja, a conclusão deve demorar.

Trump pode ser preso?
Sim. São 4 acusações, referentes a obstrução e tentativa de obstrução de um procedimento oficial e conspiração para defraudar os Estados Unidos, contra direitos e para obstruir um procedimento oficial. Duas preveem pena de até 20 anos cada, uma de 10 anos e outra de 5 anos.

O que acontece se ele for eleito antes de ser julgado?
Como o caso tramita na Justiça federal, é provável que o Departamento de Justiça sob uma Presidência Trump arquive as acusações. Há um precedente que poderia ser utilizado para isso: em um memorando em 1973, conhecido como "memorando Nixon", a pasta estabeleceu que não acusa presidentes no cargo.

E se ele for condenado e eleito?
Trump poderia usar o indulto presidencial para se "autoperdoar". No entanto, há um debate entre juristas nos EUA –muitos afirmam que esse uso inédito da prerrogativa presidencial poderia ser questionada na Justiça ou até base para um pedido de impeachment no Congresso.

4. Interferência eleitoral na Geórgia em 2020

Trump e aliados teriam se organizado para mudar o resultado da eleição na Geórgia, estado onde o republicano perdeu por uma diferença de apenas 0,02 ponto percentual. Em uma ligação por telefone vazada, ele pede a uma autoridade do estado que "encontre" cerca de 12 mil votos –o necessário para reverter o placar no estado. A procuradoria montou seu caso com base em uma legislação usada no combate ao crime organizado conhecida como Rico ("Racketeer Influenced and Corrupt Organizations"). Além de Trump, há outros 18 nomes listados como réus, o que torna o caso o mais amplo de todos os quatro.

Em que pé está este processo?
Não há previsão de data de julgamento. Trump e outros corréus pedem que a promotora do caso, Fani Willis, seja removida e que o processo seja arquivado –ela admitiu que manteve um relacionamento amoroso com um membro de sua equipe, que foi obrigado a renunciar. O pedido já foi negado, mas o republicano recorreu. Não há data para que a apelação seja analisada.

Trump pode ser preso?
Sim. São 10 acusações contra Trump, referentes a associação criminosa, apresentação de documento falso, solicitação para que um oficial público violasse seu juramento, e conspiração para falsificar documentos e fazer declarações falsas, entre outras.

O que acontece se ele for eleito antes de ser julgado?
Como esse caso tramita na Justiça estadual da Geórgia, a defesa de Trump poderia argumentar que um presidente só pode ser julgado em um circuito federal e que, portanto, o estado não teria legitimidade para processá-lo. Mais uma vez, isso deve ser uma batalha legal.

E se ele for condenado e eleito?
Como no caso Stormy Daniels, esse cenário abriria uma grande crise legal nos EUA, que chegaria à Suprema Corte. Por um lado, poderia-se invocar a 25ª emenda, que trata do que acontece quando um presidente é incapaz de exercer seus poderes e deveres, para transferir o cargo ao seu vice. Isso exigiria, no entanto, que tanto o vice de Trump, quanto a maior parte de seus secretários (equivalentes a ministros) apoiem essa ação –algo pouco provável, já que o republicano deve escolher aliados leais para esses postos. Assim, o que se considera mais factível é que o empresário argumente na Justiça que deve ser solto para que possa cumprir os deveres constitucionais da Presidência, uma vez eleito. Por tramitar na Justiça estadual da Geórgia, Trump não pode se conceder um indulto presidencial –essa ferramenta só pode ser usada para condenados pela Justiça federal.

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