Avós da Praça de Maio encontram mulher sequestrada há 42 anos pela ditadura argentina

É a 129ª neta recuperada pela organização humanitária, que busca os bebês desaparecidos durante o regime

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Buenos Aires | AFP

Uma mulher de 42 anos foi identificada nesta terça-feira (9) como a filha de uma militante política desaparecida durante a ditadura militar na Argentina (1976-1983), tornando-se assim a 129ª neta recuperada pela organização humanitária Avós da Praça de Maio.

"Ela poderá conhecer seu pai e seus irmãos. Há duas semanas a nova neta entrou no país, apresentou-se à Justiça e aceitou fazer a análise [genética]", disse em entrevista coletiva a presidente da organização, Estela de Carlotto

Carlos Alberto Solsona (esq.), pai da mulher identificada, e a presidente das Avós da Praça de Marco, Estela de Carlotto (centro), participam de entrevista em Buenos Aires
Carlos Alberto Solsona (esq.), pai da mulher identificada, e a presidente das Avós da Praça de Marco, Estela de Carlotto (centro), participam de entrevista em Buenos Aires - Daniel Vides/Noticias Argentinas/AFP

A mulher, que não teve o nome revelado e morava na Espanha, é a filha de Norma Síntora, militante que foi sequestrada por agentes do regime quando estava no oitavo mês de gravidez —seu corpo nunca foi encontrado. 

A criança nasceu em 1977, provavelmente no centro de detenção ilegal da ditadura no quartel Campo de Mayo, e foi levada ainda bebê pelos agentes.  

Organizações humanitárias calculam que cerca de 400 bebês de presas políticas foram sequestrados pelo regime. As crianças tiveram suas identidades alteradas e, sem saber de sua origem, foram criadas por outras famílias. 

A ação fez o ditador Jorge Rafael Videla, que comandava o país no período, ser condenado por crime contra a humanidade —ele morreu em 2013, quando ainda cumpria a pena.  

As Avós da Praça de Maio buscam identificar essas crianças e levá-las ao encontro dos parentes. 

O pai da mulher identificada, Carlos Alberto Solsona, afirmou que buscava a filha desde seu desaparecimento. Ele estava em Santiago, no Chile, quando recebeu uma ligação da organização humanitária com a notícia. Imediatamente foi para a capital argentina. 

“Ninguém tem ideia das milhares de noites que passei sem dormir esperando este momento”, afirmou na entrevista ao lado de Carlotto, segundo o jornal espanhol El País.  

Ele e Norma se conheceram em 1974, quando estudavam engenharia em Córdoba (650 quilômetros a noroeste de Buenos Aires), e no ano seguinte tiveram seu primeiro filho, Marcos. Após o início da ditadura, em 1976, passaram a militar no grupo guerrilheiro Exército Revolucionário do Povo. 

Com a repressão, Carlos Alberto deixou o país com o filho, e a ideia era que a mulher, que estava grávida, fizesse o mesmo assim que possível.

O casal planejava se reencontrar na Espanha, mas no dia 21 de março de 1977 agentes da ditadura invadiram a casa onde Norma estava com companheiros de militância e a sequestraram. O bebê nasceria um mês depois, com ela já em cativeiro.

Era a última vez que Carlos Alberto recebeu notícias da mulher e da filha até a ligação das Avós da Praça de Maio.     

"Já tenho mais de 70 anos e comecei a procurar minha filha quando estava na faixa dos 30. Tudo isso me obrigou a conviver com uma mochila que pesa e pesa, e cada dia pesa mais, mas nunca abandonamos a esperança", afirmou ele.  

Pai e filha, porém, ainda não se encontraram, e ele disse não ter pressa. "Não quero imaginar situações, porque tenho muito medo de magoá-la. Ela tem uma vida, tem mais de 40 anos, e isto lhe caiu assim. Minha maior preocupação é essa."

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.