Eliane Trindade

Editora do prêmio Empreendedor Social, editou a Revista da Folha. É autora de “As Meninas da Esquina”.

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Suzana Pires aposta em Hollywood, projetos próprios e ONG, após sair da Globo

Atriz e escritora, brasileira vira roteirista em Los Angeles, de onde lidera o instituto de apoio a mulheres criado com dinheiro da venda de bolsas de grife

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Mulher de cabelos curtos posa com lousa cinza ao fundo. Veste roupa branca

Suzana Pires, atriz, roteirista e fundadora do Instituto Dona de Si, raspou a cabeça para protagonizar o longa "Câncer com Ascendente em Virgem": "Passei a lidar com um novo feminino. Antes tinha cabelão, peitão, era voluptuosa". Rodrigo Vasconcellos/Divulgação

São Paulo

Suzana Pires alterna o crachá de atriz, roteirista e escritora, além de ostentar um cartão de visitas de empreendedora social à frente do Instituto Dona de Si.

A ONG que promove o empreendedorismo feminino, qualificação profissional e suporte emocional para mulheres foi fundada com dinheiro angariado com a venda de suas bolsas de grife.

"Acordei de madrugada com a ideia inteira de um instituto para neutralizar dores de mulheres que estão chorando por causa do trabalho, se entupindo de remédio", relata Suzana.

Ao passar pelo closet para ir ao banheiro, ela teve um insight de como fazer o primeiro aporte financeiro. "Olhei para aquele monte de bolsas e pensei: vou vender todas."

Mulher de cabelos pretos e curtos sentada em cadeira, com roupas escuras, com uma lousa cinza ao fundo
Sócia da Spiritus Entertainment, Suzana Pires lança o minicodumentário "Dona de Si Criativa, em São Paulo, que mostra o trabalho do instituto criado pela atriz para apoiar mulheres em situação de vulnerabilidade no mundo do trabalho - Rodrigo Vasconcellos/Divulgação/Divulgação

Assim foi feito. Procurou uma amiga dona de um e-commerce de luxo. Promoveu um bazar virtual, postando fotos de si mesma feitas por paparazzi com exemplares de Chanel, Gucci e Prada.

Conseguiu levantar quase R$ 500 mil, investimento inicial para promover a aceleração de talentos femininos no audiovisual, o foco inicial do instituto.

Ao longo dos anos, o Dona de Si expandiu sua atuação para mulheres em situação de vulnerabilidade social.

Nesta segunda-feira (17), Suzana incorporou a líder desta iniciativa que já impactou 2 milhões de brasileiras na pré-estreia em São Paulo do minidocumentário "Dona de Si Criativa", com direção de Rafael Bacelar e roteiro de Virginia de Gomez.

É a primeira obra da Spiritus Entertainment, produtora com sede em Bervely Hills também fundada pela atriz, em parceria com o executivo americano Kevin J. Gessay.

Marieta Severo e Suzana Pires se abraçam. Suzana Pires está com cabelos raspados
Marieta Severo e Suzana Pires nos bastidores do filme 'Câncer com Ascendente em Virgem', de Rosane Svartman. - Mariana Vianna/Divulgação

O filme de 35 minutos traz depoimentos de mulheres como uma modelista do Morro dos Prazeres, no Rio de Janeiro, atendida pelo instituto há três anos, que relata estar recuperada da depressão. "A costura me tirou daquele buraco."

O documentário mostra também o percurso de Suzana das telas para o terceiro setor. "Sou mulher, artista e vivo da minha criatividade desde os meus 15 anos", apresenta-se a fundadora do Dona de Si.

Em seguida, a artista explica como decidiu ser "empreendedora de si mesma" e ajudar outras mulheres a se tornarem o que elas são e terem seu valor reconhecido como tal.

"Quando cheguei ao ápice, entendi a dificuldade feminina de estar em uma posição de liderança e precisar se provar três vezes mais", relata ela, sobre percepções e vivências como representante do sexo feminino em espaços de poder.

Como aquele que ocupava como parte do time de autores na maior rede de televisão do país. Ao longo de 20 anos na Globo, participou de humorísticos, como "Zorra Total" e "Toma Lá da Cá" e atuou em novelas como "Caras & Bocas" e "Fina Estampa".

Quando cheguei ao ápice, entendi a dificuldade feminina de estar em uma posição de liderança e precisar se provar três vezes mais

Suzana Pires

fundadora do Instituto Dona de Si

Na dramaturgia, foi colaboradora de tramas como "Sol Nascente", além de coautora em "Flor do Caribe, ao lado de Walter Negrão e Júlio Fischer.

"Chegou a um ponto na Globo que eu apresentava novos projetos e não rolava. Comecei a ficar muito incomodada com aquilo, me sentindo muito mal", relata.

Em 2014, Suzana conseguiu liberação da emissora para ficar dois meses nos Estados Unidos fazendo um curso de roteiro e showrunner, figura responsável do roteiro até a finalização em um projeto audiovisual. Experiência que influenciou sua visão de produção e narrativa.

Colocou os ensinamentos em prática em "Sol Nascente". "Uma novela muito problemática no início, mas que terminou com a maior venda de merchandising do ano. Resultado de um olhar para o produto, que é o que o showrunner faz", explica, sobre mentalidade trazida na bagagem.

Em 2019, Suzana encerrou de comum acordo o contrato como autora da Globo, previsto para acabar em 2020. "Não fiz a maluca, me preparei", diz ela sobre os rumos que foi desenhando para a carreira.

Continuou contratada como atriz até 2022, quando se muda para Los Angeles. Passou a trabalhar em seus próprios projetos, alternando produções nacionais, como o recém-lançado longa "O Anel de Eva", e projetos internacionais.

Escreve em inglês e trabalha hoje com equipes globais de criação. Seu livro "Dona de Si – Manual da Mulher que Faz Acontecer" foi traduzido e bem-recebido nos EUA com o título de "Unleashed – A Woman’s Guide to Uncover her Inner Power".

O lançamento rendeu convites para a brasileira participar de programas de TV em veículos como Hollywood Report, CBS e NBC. "Foi um estardalhaço que eu não esperava."

A obra entremeada de histórias pessoais e profissionais teve o prefácio de Sharon Stone na edição americana.

A estrela de "Instituto Selvagem" leu os originais e concordou em referendar a obra. "Ela escreveu um prefácio muito bacana, de quem entendeu o trabalho do instituto e o que estou fazendo", diz Suzana.

A atriz conta que sempre gostou de escrever. Na época do vestibular, a então aluna do tradicional Colégio Pedro II no Rio de Janeiro, optou por cursar Filosofia, diante da falta de uma faculdade de roteiro no Brasil.

Nas artes, foi cria da professora de interpretação Camila Amado. "Ela foi tudo pra mim. Quando não podia mais pagar pelas aulas, eu arrumava a biblioteca dela."

Ao estudar os filósofos gregos, começou a fazer adaptação para o teatro de clássicos como "O Banquete", de Platão. Iniciou a carreira de atriz com tal bagagem.

Aos 25 anos, estreava no palco como atriz e autora do monólogo "De Perto Ela Não É Normal". "Eu já tinha me formado e tive segurança para botar um texto para fora", diz ela.

A peça lhe abriu portas da Conspiração Filmes como roteirista, rendeu um convite para um papel no longa "Tropa de Elite" e depois para a Globo.

Era início dos anos 2000. Ganhava fama por ser uma atriz que escrevera o próprio texto, estava em cartaz no centro do Rio em horário de happy hour e bombando.

"Não era nem um teatro. Eu me apresentava em um mezzanino e bar", pontua. "Foi um sucesso. Viajei com a peça depois pelo Brasil inteiro."

"De Perto Ela Não É Normal" viraria filme 20 anos depois, numa parceria com produtora Escarlate, e vai ganhar uma sequência em 2025.

Na telinha e nas telonas, ela já fez papel de heroína romântica a vilã, passando por comédias. Raspou a cabeça para protagonizar o drama "Câncer com Ascendente em Virgem", previsto para chegar aos cinemas em outubro.

Suzana integrou a equipe de roteiristas do longa dirigido por Rosane Svartman, que conta a experiência de Clélia Bessa, produtora do filme, que teve um câncer de mama.

Quando escreveu a cena de raspar o cabelo durante o tratamento de quimioterapia da protagonista, os colegas perguntaram. "Está ligada que atriz que vai fazer é você, né?"

Despir-se da longa cabeleira foi transformador. "Meu pai teve câncer, eu sabia como é quando a doença se instala na família. Foi um filme lindo de fazer. Cada momento tem um medo e uma angústia específica."

Assumir-se careca longe dos sets também foi um aprendizado, ao desfilar pelo mundo sem um símbolo tão forte de feminilidade.

Duas semanas depois do fim das filmagens, Suzana foi submetida a uma cirurgia no seio para retirada do silicone.

"Meu peito esquerdo começou a doer, quando apalpei tinha um caroço", assustou-se. Saiu do ensaio para o médico. "Será que estou trazendo isso para minha vida", angustiava-se.

Fez a retirada do implante de silicone. O resultado da biópsia foi benigno. "Passei a lidar com um novo feminino. Estava careca, sem peito, mas tendo passado por uma experiência emocional que renovou meu entendimento da vida", afirma. "Antes tinha cabelão, peitão, era voluptuosa."

É a história de uma mulher de 48 anos que empreendeu a própria carreira e se joga na vida e na arte.

Antes de ajudar milhares de brasileiras, Suzana se tornou dona de si mesma.

Exemplo que inspira dona Josélia Vieira da Silva, 76, costureira e moradora da comunidade morro da Coroa, no Rio. "Aprendi que a gente não tem que ter medo de nada que do que a gente quer."

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