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Julio Wiziack é editor do Painel S.A. e está na Folha desde 2007, cobrindo bastidores de economia e negócios. Foi repórter especial e venceu os prêmios Esso e Embratel, em 2012

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Descrição de chapéu Folhajus

BTG cobra grupo britânico na Justiça e caso expõe empresa alvo do MP

Banco negociou garantia para empresa tomar empréstimo junto ao Banco da Amazônia; estrangeira que lastreou seguro se negou a arcar com dívida

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São Paulo

O BTG Re, braço de resseguros do banco de André Esteves, e a Beazley Furlonge, uma das maiores da Europa, trocam acusações na Justiça. De um lado, o grupo brasileiro cobra do britânico por um calote de R$ 262,7 milhões. De outro, enfrenta acusações de ter liberado cobertura para um empreendimento que tem entre os sócios um empresário denunciado por associação criminosa, tortura e roubo.

O caso envolve a contratação de uma apólice de seguro garantia pela Brasil Bio Fuels (BBF), empresa do setor de energia elétrica renovável, junto ao Banco BTG Pactual.

Escritório do BTG Pactual, em São Paulo
Escritório do BTG Pactual, em São Paulo - Paula Laier - 16.mai.19/Reuters

A apólice serviria como garantia por dívidas contraídas pela BBF junto ao Banco da Amazônia para a construção da usina termoelétrica Híbrido Forte São Joaquim, em Roraima.

O contrato bancário, assinado em março de 2022, previa a liberação de R$ 235,4 milhões. Porém, o valor final foi de R$ 224 milhões.

Segundo o BTG, os riscos foram transferidos via apólice de seguro para a BTG Pactual Seguros, que, por sua vez, repassou para a BTG Re (em um contrato de resseguro), que, então, transferiu esse risco para a Beasley em um contrato de retrocessão.

Por essa transação, a Beazley teria assumido todos os riscos da apólice, sendo obrigada a reembolsar o BTG Re de qualquer indenização ressecuritária, adiantamento, custo e despesa da apólice —o que não aconteceu.

Linha do tempo

Em fevereiro deste ano, a BBF protocolou na 2ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais de São Paulo um pedido de suspensão do pagamento de todos os seus contratos por 60 dias para estruturar sua recuperação judicial.

Diante dessa situação, o Banco da Amazônia acionou o BTG, que cobrou de sua seguradora até que a cobrança chegasse à Beazley.

Em meio a essa cascata de cobranças, o Banco da Amazônia ajuizou uma ação de execução contra o BTG para a cobrança dos valores da carta fiança. A dívida de R$ 247,2 milhões foi paga, segundo o BTG.

No entanto, o banco acionou a Beazley, que se recusou a efetuar o pagamento.

Disputa entre resseguradoras

Inicialmente, a Beazley pediu uma série de documentos para aprovar o pagamento e prometeu que os recursos seriam liberados até o início de abril. Segundo o BTG, desde então, os prazos foram sendo prorrogados.

A resseguradora do BTG afirma, inclusive, que a Beazley teria recebido seus R$ 5,9 milhões como prêmio pelo contrato assinado.

No processo, o BTG explica que as empresas do setor dependem da transferência de riscos de suas operações a players do mercado, como a Beazley, como forma de manter o equilíbrio econômico-financeiro e técnico, seguindo as normas do mercado brasileiro.

Por esse motivo, o caso foi denunciado à Susep (Superintendência de Seguros Privados), responsável por regular o setor de seguros.

"O calote multimilionário da Beazley impacta negativamente todo o setor, afetando a confiabilidade e a higidez do Sistema Nacional de Seguros, comprometendo a capacidade da BTG Re de realizar novas operações de resseguro em detrimento do mercado local", afirmam os advogados do BTG.

"Enquanto a BTG Re amarga um calote multimilionário, a Beazley permanece lucrando com as suas operações no Brasil, mesmo sem ter conta bancária ou ativos no país, uma vez que as seguradoras, resseguradoras e os sindicatos com quem a Beazley faz negócios seguem repassando a ela valores de prêmios e de recuperação de sinistro diretamente para as suas contas no exterior", diz o BTG Re no processo.

Tentativa de bloqueio

À Justiça o BTG Re pediu o bloqueio dos ativos da seguradora britânica no país para evitar que a Beazley envie ao exterior todos os recebíveis a que tenha direito no Brasil.

"No minuto em que esses recursos deixarem o país, estará praticamente frustrada a pretensão do BTG Re de receber, no Brasil, a indenização devida", diz a companhia brasileira.

De acordo com o BTG, a Beazley optou pela inadimplência por reconhecer que essa posição seria mais vantajosa por "crer na ineficácia das leis no Brasil".

Beazley aponta fraude na operação

Com operações no Reino Unido, EUA, Canadá, países da Europa, América Latina e Ásia, a Beazley é uma das grandes empresas de seguros do mundo.

A companhia integra a lista de filiadas da Lloyd's, uma das instituições que monitoram o mercado de seguros no exterior.

No mês passado, o BTG Re acionou a 1ª Vara Empresarial e Conflitos de Arbitragem de São Paulo, que pediu explicações à Beazley.

A companhia britânica disse que não realizou o pagamento do contrato por suspeita de fraude. Devido a suas políticas de governança, ela disse ter sido impedida de pagar a indenização até que os fatos sejam devidamente apurados.

A seguradora britânica explicou que, no fim de 2021, a BBF pediu empréstimo de R$ 235 milhões no Banco da Amazônia, para a construção da usina termoelétrica, em Roraima.

Para que o dinheiro fosse liberado, era necessário que a BBF cumprisse uma série de condições estabelecidas por órgãos públicos, além da comprovação da evolução do projeto e garantias em favor do banco. Segundo a Beazley, essas condições não foram cumpridas.

Em agosto de 2022, mesmo sem o cumprimento das condições exigidas previamente, o banco teria liberado dois empréstimos-ponte que totalizaram R$ 224 milhões.

No mercado, esse tipo de empréstimo é feito enquanto o principal não é liberado.

O primeiro deles foi feito em agosto de 2022, no valor de R$ 180 milhões, e o segundo, de R$ 44 milhões, saiu em junho de 2023.

A Beazley argumenta que o risco financeiro era o mesmo do pedido de empréstimo inicial, porém sem nenhuma garantia da BBF para o caso de um inadimplemento. Disse que o banco seguiu com o empréstimo sabendo do risco.

Em sua tréplica ao tribunal paulista, o BTG disse que, em nenhum momento, a BBF apontou essas questões antes da assinatura do contrato de retrocessão e que ele conhecia todos os potenciais riscos.

Denúncias

A seguradora britânica também afirma que a BBF é investigada por práticas ilegais em disputas de posses de terras rurais, bem como de alegações de tortura e violação de direitos humanos praticados contra indígenas no Pará.

Os casos foram investigados pelo Ministério Público na região, cuja histórias foram documentadas em sites locais.

Há pouco mais de um ano, um dos principais sócios da BBF e um superintendente de segurança da companhia foram denunciados pelos crimes de associação criminosa, tortura e roubo, por disputas em terras indígenas para a produção de óleo de palma, uma das principais matérias-primas utilizadas pela BBF.

O caso ainda não foi julgado.

A Beazley ainda aponta que, em agosto do ano passado, a BBF foi acusada pelo Conselho Nacional de Direitos Humanos ao Ministério da Agricultura e aos bancos.

Mesmo assim, a carta de fiança foi aditada pelo BTG, bem como os demais instrumentos de transferência de riscos.

Outro lado

Procurado, o BTG não quis comentar o caso.

O Grupo BBF não quis comentar e disse que não tem conhecimento de todos os elementos mencionados no processo, pois não é parte integrante da ação. Disse também que não pediu recuperação judicial e está organizando seu plano de reestruturação de dívidas.

Beazley, e Banco da Amazônia não se manifestaram até o momento

Com Diego Felix

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