Marcus André Melo

Professor da Universidade Federal de Pernambuco e ex-professor visitante do MIT e da Universidade Yale (EUA).

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Marcus André Melo
Descrição de chapéu Governo Lula

O dilema institucional de Lula 3

Por que Lula 3 está malogrando?

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Os impasses atuais nas relações do presidente Lula com o Congresso evocam —mas como veremos apenas superficialmente— o padrão identificado por Celso Furtado em "Obstáculos Políticos ao Desenvolvimento Econômico" (1965). Nele, Furtado reflete sobre a crise de 64 e sua estrutura mais profunda: um executivo eleito pelo eleitorado urbano que se confrontava com um Congresso que obstaculizava uma agenda de reformas "de base". O resultado era um confronto paralisante cujo desenlace foi a ruptura da ordem constitucional. Já examinei o argumento aqui.

O paralelo entre as duas situações é descabido por pelo menos três razões. A primeira é que Lula não é hoje uma liderança reformista. Inexiste uma agenda de governo, potencialmente transformadora (mesmo na forma de alguma utopia sem qualquer viabilidade) e com apoio amplo. A situação geopolítica é outra e não há ameaças à vista. Lula não tem um mandato no sentido clássico da expressão; antes é expressão de uma maioria negativa que se formou contra um processo de erosão democrática. Aqui nem sequer se forjou frente ampla em padrão histórico, mas uma solução ad hoc, sem musculatura. Por isso mesmo, não há conflito, como no passado, salvo entreveiros retóricos, que, contudo, têm repercussões.

Três homens estão sentados em uma mesa durante uma reunião. Atrás deles, há duas bandeiras do Brasil. O homem no centro, o presidente Lula, está falando ao microfone, enquanto os outros dois, um o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, e outro o presidente da Câmara, Arthur Lira, estão sentados ao seu lado, todos usando ternos. Na mesa, há copos de água e papéis.
O presidente Lula, ao lado dos presidentes da Câmara e do Senado, deputado Arthur Lira (à dir.) e senador Rodrigo Pacheco, assina mensagem ao Congresso em pediu o reconhecimento de estado de calamidade pública no estado do Rio Grande do Sul em decorrência das chuvas que atingiram o estado, visando agilizar o envio de recursos e ajuda aos atingidos - Pedro Ladeira - 6.mai.24/Folhapress

A segunda razão se entrelaça com a primeira: Lula é caso único no plano internacional de liderança à frente de um partido por quase 40 anos. Não se trata aqui de sua idade, que, sim, contrasta com lideranças extremamente jovens em democracias longevas como França, Canadá e Inglaterra. Mas do papel partidário que cumpre, sem renovação, e que expressa —aqui sim— uma calcificação política.

A terceira razão é que embora não tenha agenda, Lula 3 persegue uma estratégia clara. Seu foco é o plano externo onde estão os frutos supostamente fáceis de colher, sobretudo na agenda ambiental. Como mostrei aqui. Aqui o Brasil tem vantagens comparativas e clara relevância global. Bem-sucedido, Lula entraria no panteão de estadistas. Para o plano doméstico, Lula 3 delegaria amplamente a barganha política, garantindo protagonismo aos líderes congressuais e sobre tudo presidentes das casas legislativas. Mas o cobertor fiscal é curto.

Decorridos um ano e meio de mandato podemos concluir que esta estratégia definitivamente malogrou. Coluna aqui sobre este ponto.

A busca de protagonismo internacional deu com os burros n’água na Ucrânia e em Israel; a autocratização definitiva da Venezuela expôs as contradições de suas ambiguidades e lealdades. No plano doméstico, Lula sobrestimou sua potência ignorando seu caráter hiperminoritário na sociedade e no Legislativo. E a situação fiscal e econômica se deteriora quando é instado a intervir na arena doméstica.

Eis o dilema institucional atual.

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