Ex-secret�rio de Reda��o da Folha, jornalista, coautor de 'Como Viver em SP sem Carro', faz pesquisas no Warburg Institute, em Londres, com o apoio da Capes. Escreve �s segundas.
Haddad: decifra-te ou ser� devorado
Marlene Bergamo/Folhapress | ||
Fernando Haddad (PT) no heliponto da prefeitura, no centro de S�o Paulo |
Sabe qual � o melhor neg�cio no pa�s hoje? Comprar Fernando Haddad pelo que os eleitores d�o por ele e vend�-lo pelo que ele acha que vale...
Lembrei do antigo chiste ao ler na Folha a entrevista do prefeito que sai, na qual n�o faz nenhuma autocr�tica, n�o constata nenhum errozinho sequer em sua gest�o. A julgar pelo balan�o, os 83% dos votos contra ele se devem ao engano do eleitor e � influ�ncia da m�dia.
Neste ano que come�a, Haddad deve resolver um enigma: entender a derrota no contexto do processo em que est� imerso o pa�s. Pode decifrar ou ser devorado pelo esquecimento da hist�ria.
A melanc�lica performance nas urnas pode deix�-lo com o estigma de perdedor; a incapacidade de ler os sinais exteriores de fracasso tende a refor�ar a cr�tica que membros da c�pula petista faziam ao seu jeito de governar: "Autista", o apelidaram.
Ao mesmo tempo, a imagem de honestidade e a dedica��o a uma agenda contempor�nea o colocam em posi��o de destaque em seu partido: Haddad � um raro petista julgado pela opini�o p�blica, por quest�es de cidadania e medidas de governo, enquanto tantos outros membros da elite partid�ria enfrentam na Justi�a acusa��es de corrup��o.
Essa sua situa��o peculiar pode transformar a derrota em alavanca: o ex-prefeito pode chegar a 2018 como poss�vel candidato a presidente, revivendo � esquerda a trajet�ria de Fernando Henrique Cardoso, derrotado a prefeito em 1985 e al�ado � candidatura presidencial em 1994.
A primeira coisa que Haddad precisa entender � que a m�dia lhe foi generosa, e n�o cruel. As reportagens de balan�o de governo, por exemplo, avaliaram a administra��o pelos crit�rios que ele estabeleceu, segundo os quais completou metade das metas.
Os jornais poderiam dizer que Haddad n�o completou nem 1% dos objetivos a que se prop�s, uma vez que engavetou, tr�s meses ap�s a posse, todo o plano de governo anunciado em campanha.
A "Lei de Metas" foi sugerida pela ONG Nossa S�o Paulo (devota ao PT) e aprovada pela C�mara Municipal, durante o governo Kassab. Sua inten��o era comprometer os prefeitos eleitos com as promessas de campanha.
Haddad estruturou a candidatura de 2012 em um projeto chamado "Arco do Futuro", um pl�gio de ideias antigas, dos anos 1970, anteriores � crise do petr�leo. Essa origem determinava seu principal defeito: era baseado em eixos vi�rios. Se implantado, geraria obras insustent�veis e, em seguida, multiplicaria congestionamentos.
O exemplo mais claro da indig�ncia do "Arco do Futuro" era a proposta de abertura de uma avenida, que Haddad anunciava como novidade, chamada "Apoio Norte". A ideia, no entanto, vem sendo apresentada a todos os novos prefeitos, sempre com o mesmo nome, desde Paulo Maluf (1993-96). E acaba sempre engavetada diante dos custos impag�veis de desapropria��es. (Logo chegar� tamb�m � mesa de Jo�o D�ria.)
Depois de cem dias de governo, em 2013, ao apresentar o Plano de Metas, Haddad anunciou que o "Arco do Futuro" era invi�vel: n�o havia dinheiro para realiz�-lo. Essa atitude tem um nome: "estelionato eleitoral". Mas a ONG Nossa S�o Paulo, por alinhamento partid�rio, e a imprensa de S�o Paulo, com raras exce��es, calaram-se.
Quatro anos depois, Haddad foi derrotado nas urnas. A contradi��o entre o prefeito eleito com um plano de obras t�pico dos anos 1960-70, mas que governou em busca do esp�rito do s�culo 21 � o cerne do enigma. Durante a campanha, ele pediu aos eleitores mais quatro anos para poder realizar o "Arco do Futuro".
Afinal, seus 17% de votos s�o um sinal da frustra��o pela n�o execu��o do plano prometido em 2012 ou apontam o potencial de crescimento de uma agenda de restri��o a obras, em um pa�s posterior ao dom�nio das empreiteiras? Esse � o enigma de Haddad.
Livraria da Folha
- Cole��o "Cinema Policial" re�ne quatro filmes de grandes diretores
- Soci�logo discute transforma��es do s�culo 21 em "A Era do Imprevisto"
- Livro de escritora russa compila contos de fada assustadores; leia trecho
- Box de DVD re�ne dupla de cl�ssicos de Andrei Tark�vski
- Como atingir alta performance por meio da autorresponsabilidade