Clóvis Rossi

Repórter especial, foi membro do Conselho Editorial da Folha e vencedor do prêmio Maria Moors Cabot.

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Igreja Católica dará resposta à maior crise em 500 anos?

Encontro no Vaticano sobre abusos sexuais envolvendo religiosos termina neste domingo (24)

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O Papa Francisco, durante atividade do terceiro dia do encontro sobre abusos sexuais no Vaticano - Vincenzo Pinto - 23.fev.2019/AFP

Minha neta, Alice, à beira dos dez anos, está fazendo a catequese em sua nova cidade, Cambridge, no Reino Unido. A avalanche de denúncias de abusos praticados por religiosos fez acender os alarmes na mente deste avô, sempre excessivamente preocupado com o bem-estar dos filhos e, mais ainda, dos netos.

É verdade que Alice só vai à igreja acompanhada dos pais. Mas, mais cedo que tarde, acabará indo sozinha.

Sei perfeitamente que riscos existem —e não só para crianças— em todo lado, dentro ou fora da igreja.

Mas os abusos de religiosos ganham uma dimensão especial, como escreve Pedro Candeias, na newsletter de sexta (22) do jornal português Expresso:

“Há algo de particularmente desconcertante e perverso no homem misticamente investido do poder do ‘caminho, da verdade e da vida’ que o usa para abusar de crianças, adolescentes, rapazes, raparigas, homens ou mulheres. É o Mal, no sentido bíblico do termo”.

Só nos últimos 15 anos, a igreja expulsou 848 praticantes do Mal, “lobos que devoram almas inocentes” para citar o papa Francisco.

Não bastou porque, como disse o arcebispo de Bogotá, Rubén Salazar, “o inimigo está entre nós”, ao falar no primeiro dia da reunião convocada pelo papa Francisco exatamente para discutir o Mal.

É natural, pois, que haja enorme expectativa em torno do que a igreja dirá neste domingo (24), ao terminar a reunião. O próprio pontífice, de resto, admitiu essa expectativa ao abrir o encontro: “O santo povo de Deus nos olha e não só espera de nós simples e óbvias condenações, mas também todas as medidas concretas e eficazes que se requerem”.

Que medidas? Achei conveniente propor essa questão a uma pessoa que reúne condições extraordinárias para responder: chama-se Juan Arias, velho amigo, correspondente de El País no Brasil e que, além de um humanista impecável, conhece por dentro a igreja, como ex-seminarista e ex-correspondente em Roma/Vaticano.

Ele não demonstrou muito otimismo sobre o resultado da reunião no Vaticano: “Tudo acabará em boas palavras e propósitos”, começa dizendo, para acrescentar: “O problema não é somente descobrir e castigar os culpados, em vez de ocultá-los, como no passado. A igreja precisa de toda uma reestruturação a fundo na eleição e formação dos jovens que queiram chegar ao sacerdócio. Do contrário, com o celibato obrigatório, acabam entrando no clero os jovens com maiores problemas psicológicos, que fogem do medo ao mundo e até se sentem incapazes de formar uma família.”

Juan Arias diz que celibato nada tem a ver com o dogma: “Foi criado para que a igreja não tivesse que repartir suas terras com as famílias dos sacerdotes e bispos, então todos casados”.

O celibato não está na agenda do encontro do Vaticano e nem sei se há elementos concretos para provar que é parte do problema dos abusos.

Seja como for, os abusos foram se acumulando de tal forma que levaram a Igreja Católica “a enfrentar a sua mais séria crise em 500 anos” [desde a Reforma Protestante], na avaliação para Foreign Affairs de Massimo Faggioli, professor de Teologia e Estudos Religiosos na Universidade Villanova (Pensilvânia, EUA).

Será que Francisco terá firmeza suficiente, nesse cenário apocalíptico, para tranquilizar o avô da Alice e o 1,27 bilhão de católicos do mundo?

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