O classicista português Frederico Lourenço tem prestado um belíssimo serviço à apreciação literária e histórica das Escrituras judaicas e cristãs nos últimos anos, por meio de suas traduções do Novo Testamento e da Septuaginta (o Antigo Testamento em grego). Já escrevi sobre esse esforço aqui e aqui e reitero que um falante da nossa língua que não saiba grego certamente terá uma experiência muito próxima do texto original ao ler as traduções de Lourenço. Agora, para a alegria do público leitor do nosso idioma, chega ao país "Evangelhos Apócrifos: Gregos e Latinos", mais uma vez com textos traduzidos por ele.
A edição muito bem cuidada pela Companhia das Letras é bilingue, o que é um atrativo adicional para estudiosos e curiosos dos primeiros séculos cristãos. A reunião de mais de uma dezena desses textos num único volume no Brasil também é algo que eu não tinha visto nas últimas décadas e merece ser comemorado.
Os apócrifos congregados na edição são textos que não fazem parte do cânone (a lista oficial) do Novo Testamento bíblico. Alguns, como o Evangelho de Tomé e o Evangelho de Filipe, ajudam a entender a grande diversidade teológica e literária do cristianismo antes que ele se tornasse a religião oficial do Império Romano.
Outros, como o Evangelho de Tomé sobre a Infância de Jesus ou o Evangelho de Nicodemos, poderiam ser comparados às modernas "fan fics", com autores tentando ampliar as parcas informações sobre determinados personagens ou passagens dos Evangelhos "oficiais". Alguns acabaram se tornando influências relevantes para a iconografia e o imaginário cristãos, mesmo sem ser canônicos.
No canal do blog no YouTube, você pode conferir alguns vídeos sobre esses textos, como o Evangelho de Tomé sobre a Infância de Jesus:
O volume traz ainda comentários feitos por Lourenço sobre cada texto. Só nos resta torcer para que o erudito luso se aventure também pela vasta biblioteca de antigos textos cristãos escritos em copta, o idioma do Egito na época romana, e nos brinde com mais traduções de apócrifos!
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.