A linguagem do gênio mineiro Guimarães Rosa (1908-1967) é uma das coisas mais maravilhosas que a língua portuguesa e a cultura brasileira já produziram. Fiquei tempo demais sem ler algo dele, o que talvez tenha sido agora que retomei a leitura da narrativa "O Recado do Morro", porque algumas coisas saltaram aos olhos com um frescor inesperado. Por exemplo: não é que Rosa faz um belo resumo de algumas das principais descobertas da paleontologia brasileira de então ao descrever os cenários do interior de Minas Gerais que seus personagens visitam?
Eis a passagem:
"E nas grutas se achavam ossadas, passadas de velhice, de bichos sem estatura de regra, assombração deles -- o megatério, o tigre-de-dente-de-sabre, a protopantera, a monstra hiena espélea, o páleo-cão, o lobo espéleo, o urso-das-cavernas --, e homenzarros, duns que não há mais."
"Megatério" é um dos tipos de preguiça-gigante -- existiam muitas espécies brasileiras, como a dona do esqueleto que o leitor vê acima. Ao mesmo tempo, há alguns errinhos de Rosa -- ou, talvez, ele esteja apenas repetindo o que era o conhecimento de sua época, hoje superado. Sabemos, por exemplo, que "hiena espélea" -- hiena-das-cavernas -- era uma espécie exclusiva do Velho Mundo, e o mesmo vale para os lobos propriamente ditos, que nunca viveram por aqui.
"O Recado do Morro" é um encanto e vale ser lido e relido. Ave, Rosa!
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