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Uma caminhada com...

Toy: "Quero ser presidente da câmara de Setúbal"

Raquel Lito 26 de junho

Passeou pela marginal da sua cidade, onde foi parado várias vezes pelos fãs. Andou perto de 3 km, ou melhor, 4.054 passos. Neste verão, é novamente cabeça de cartaz das festas populares – e lança esta semana dois temas. O público não esquece o Taskmaster e pede-lhe que parta melancias. No outono, vai lançar o seu primeiro vinho. Veja o vídeo.

Desce da mota de linhas clássicas dois minutos antes da hora combinada: 16h28, de uma quinta-feira (dia 20) de sol intermitente. Toy herdou a pontualidade do país onde esteve emigrado há muitos anos, a Alemanha – já lá vão mais de três décadas, quando era torneiro mecânico e levantava, a braços, caixas de 80 kg. Hoje, cabeça de cartaz nos arraiais e nas festas populares, passa a manhã com o teclista a preparar o novo alinhamento: 15 temas para os concertos, onde tem cinco mil a 10 mil pessoas na assistência.

Desce da mota de linhas clássicas dois minutos antes da hora combinada: 16h28, de uma quinta-feira (dia 20) de sol intermitente. Toy herdou a pontualidade do país onde esteve emigrado há muitos anos, a Alemanha – já lá vão mais de três décadas, quando era torneiro mecânico e levantava, a braços, caixas de 80 kg. Hoje, cabeça de cartaz nos arraiais e nas festas populares, passa a manhã com o teclista a preparar o novo alinhamento: 15 temas para os concertos, onde tem cinco mil a 10 mil pessoas na assistência.

É o primeiro dia de verão, o mais longo do ano, esperemos que o tempo ajude ao passeio com o "rei de Setúbal", grita-lhe um fã que o reconhece à distância. E apesar das nuvens iniciais, o céu fica limpo instantes depois. O entrevistado inaugura, animado, a rubrica Uma Caminhada Com.

Na marginal da cidade natal, Toy, ou António Manuel Neves Ferrão, de 61 anos e 36 de carreira, é intercetado oito vezes por muitos locais e até por turistas. Pedem-lhe selfies, elogiam-lhe a atitude, a voz, os miúdos recordam-lhe o Taskmaster (concurso da RTP). "Quem não gosta?", admite o próprio sobre a popularidade.

Em duas horas e meia de entrevista, mostra o domínio de várias línguas com os fãs estrangeiros. Fala alemão com uns, espanhol com outros (tem raízes de Aiamonte, pela avó materna), e francês com um casal de idade que passeia o cão. A conversa começa pelo bem-estar. Só as moscas o incomodam.

Faz caminhadas?
Tenho sempre muita pressa. Caminho daqui para ali, agora fazer uma caminhada de propósito? Não. Nas viagens para os concertos tenho quem conduza o carro: o João, meu motorista há 30 anos. É como um irmão. Enquanto ele conduz, eu vou sempre a trabalhar. Faço tudo durante a viagem: levo o computador, leio, respondo aos emails. Não enjoo.

Já fez este percurso, no Parque Urbano de Albarquel, em Setúbal, a pé?
Já, há quatro anos. Prefiro jogar à bola às segundas e quintas-feiras, com um grupo de amigos. Vou jogar num campo aqui perto, no Pinhal Novo, de relvado sintético. Há um objetivo que é marcar golo.

Desde que sofreu um acidente vascular cerebral (AVC), há 16 anos, mudou de hábitos?
Mudei algumas coisas, como fazer análises, para perceber como é que estava o colesterol e a tensão. Era uma coisa que não fazia. A partir daí fiquei a tomar três comprimidos por dia: um para o colesterol, outro para o sangue fluir e outro para a tensão. Deixei o do colesterol porque achei que me fazia mal ao fígado.

É avesso às convenções?
Não gosto. Ponham as câmaras, filmem. Não sou pedófilo, não roubo a banca, podem vir atrás de mim, que eu não tenho segredos.

Não esconde a orientação política de esquerda, embora ressalve não ser um comunista ferrenho. Quando se reformar dos palcos, tenciona dedicar-se ao poder local. Gostaria de ser presidente da câmara de Setúbal, a cidade que acredita ter "uma energia especial" e ser a "mais nortenha a sul do País", pelo acolhimento e até pelo palavreado.

Nas viagens para os concertos tenho quem conduza: o João, meu motorista há 30 anos. É como um irmão" Toy

Em Setúbal dizem-se muitos palavrões?
Graças a Deus.

Sempre se manteve aqui, tirando o tempo emigrado na Alemanha?
Ninguém me tira da minha terra. Um dia, quero ser presidente da câmara de Setúbal. Talvez daqui a 12 anos. É preciso ter alguma experiência, perceber os trâmites. Tenho muita vontade de fazer bem à minha cidade.

Até fez o hino do Vitória de Setúbal, que agora enfrenta dificuldades. Como vive esta fase do clube?
O Vitória é o meu clube, sou sócio, mas nunca quis interferir nas questões burocráticas do futebol. Gosto é de ver jogar à bola e de ver ganhar, se possível. O resto é complicado. Não sei o que se passa. Acho que há problemas financeiros, mas qual é o clube que não os tem? Estamos num impasse.

Sendo um comunista ideológico, o que pensa sobre a atual situação política?
A minha ideologia está muito próxima do marxismo, mas sabemos que o marxismo começa a ser uma utopia. A igualdade de oportunidades é uma das questões que para mim são fulcrais. Gostava que as pessoas soubessem como Portugal era antes do 25 de Abril. Quando estão a aderir à extrema-direita acho que não sabem como era. Por exemplo, era proibido o divórcio. Quando nasci fui registado como filho de pai incógnito. Porque o meu pai não se pôde divorciar-se da primeira mulher para casar-se com a minha mãe. Casou-se com a minha mãe quando eu tinha 13 anos, depois do 25 de Abril.

Chegou a emprestar dinheiro ao seu pai. Porquê?
Quando eu tinha 21 anos já era independente financeiramente. Fui para a Alemanha adiar a tropa. Trabalhei em limpeza de peças - levantava caixas de 80 kg - e como torneiro mecânico. Por isso é que me doem as costas de vez em quando. Estive lá durante oito anos. Entretanto, o meu pai teve algumas dificuldades. Porque o 25 de Abril fez coisas boas e outras menos boas. Ele era "patrão", entre aspas: tinha uma alfaiataria. E os patrões foram todos medidos da mesma forma. Os funcionários aproveitaram essas situações e o meu pai foi um bocado vítima disso. Teve uma funcionária que o boicotou imenso. Tive de o ajudar, ainda bem que o fiz. Se fosse vivo faria 100 anos. Morreu aos 95 e tocou bandolim até aos 93.

Tenho muita vontade de fazer bem à minha cidade" Toy



O pai tornou-se músico amador em bandas itinerantes. Passou ao filho mais novo o talento para a música: aos 5 anos já tocava a bateria do primo, aos 25 profissionalizava-se e adotava o nome Toy. Recentemente, depois de três temporadas de Taskmaster (entrou na primeira, segunda e quarta) a fazer provas hilariantes – como partir uma melancia ao soco e devorá-la num minuto –, o artista consolida a posição. Mede-se pela agenda de trabalho, em rigor tem duas: uma em papel, como as clássicas dos consultórios médicos, e outra no telemóvel.

Em abril deu um concerto acústico em pleno voo para Punta Cana: os passageiros eram, na maioria, estudantes finalistas e a atuação estava prevista em contrato. Passou por festas de Lisboa (Campolide, Alvalade e Miradouro de São Pedro de Alcântara), entre outras.

Nos dias seguintes a esta entrevista, de 21 a 23 de junho, teve duas atuações no Porto, mais uma no Casino da Póvoa e outra no Entroncamento. Em agosto só tem sete dias livres de espetáculos. Os dois telemóveis tocam e ele não se escusa a atender.

Noa, de 10 anos, reconhece-o pelo Taskmaster Foto: Rui Minderico/SÁBADO
A avó de Noa felicita-o Foto: Rui Minderico/SÁBADO
A professora de Dança e de Educação Física, Sónia Ribeiro, com as alunas Foto: Rui Minderico/SÁBADO

Quais são as exigências técnicas que faz para os concertos?
Nós temos material próprio, mas somos flexíveis. As pessoas percebem que a nossa vontade é fazer. Evidentemente que num verão intenso temos um formato. Às vezes abusam da minha flexibilidade, até onde eu deixo que abusem. Porque ser flexível não é ser burro, não é ser parvo, não é ser ignorante.

O que entende por abuso de flexibilidade?
Dizerem-me: "Anda lá cantar num aniversário." Vou cantar naquele buraquinho, se quiserem. Pagam-me o cachê. Agora, não vou cantar sem levar o meu técnico, sem levar os meus aparelhos. Quando é uma coisa privada levo a minha guitarra e se desafinar, desafinei. Se estiver afónico, estou afónico. Se não me apetecer, não canto. Se é uma coisa pública vai aparecer nas redes sociais. Tem de haver condições.

Nota o efeito do Taskmaster nos espetáculos?
Pergunto no palco quem vê o Taskmaster e toda a gente levanta o braço. Já parti melancias em palco, às vezes levam a melancia para eu partir, ou levam um cartaz a dizer: "parte a minha melancia", ou "faz-me um filho" ou "faz-me um filtro" por eu dizer que fumo erva no Natal. Relaxa-me fumar duas ou três vezes por ano, mas é muito raro. Até porque fumar faz mal às cordas vocais e eu prezo muito a minha profissão.

Que cuidados tem com a voz?
Bebo muito água para hidratar, pelo menos dois litros por dia. Tenho uma osteopata que receita umas coisinhas para limpar as mucosas e tenho o máximo de cuidado para não apanhar gripes nem constipações.

Em junho, julho e agosto não bebo álcool. [...] Não conheço ninguém tão disciplinado" Toy

No verão fica abstémio pela vida na estrada?
Em junho, julho e agosto não bebo álcool. Tolerância zero. Custa. Não conheço ninguém tão disciplinado quanto eu. Quando deixo de beber álcool perco logo três quilos.

Quanto é que pesa?
Peso 94 quilos. Já pesei mais, mas nunca cheguei aos 100. Quando chego aos 98, faço um detox.

Diz-se um louco saudável, com tanto de organizado e trabalhador como de adepto dos convívios. Amigos, família e casamento complementam-se numa vida em rotações máximas – ou não fosse ainda questionado pela cena da Casa do Toy, em 2002, na SIC, quando conduziu com o joelho.

Imaginava que 22 anos depois continuassem a questioná-lo sobre a condução?
Não me chateia nada. Podem questionar-me à vontade. Não se admite hoje que com quatro vias de uma autoestrada só se possa andar a 120 [km/h]. Os carros têm uma segurança diferente, as estradas são muito melhores e portanto é só uma questão de civismo. Tirei a carta na Alemanha, aos 19 ou 20 anos, onde não há limite de velocidade.

Como é que surgiu essa situação na Casa do Toy?
Foi tudo espontâneo. Nunca quis entrar no Big Brother exatamente por isso. Sou desobediente.

É a sua mulher que gere as redes sociais?
Somos os dois. Ela diz na brincadeira que tudo o que são mulheres bonitas e jeitosas, ela apaga. Ela diz que é brincar, mas eu acho que é mesmo a sério.

Qual é o hit de verão?
Vão sair no dia 27 [quinta-feira]. Tenho dois novos: Vou Beijar na Boca e Toma, Toma. Já estou a abrir os concertos com o Toma, Toma que funciona muitíssimo bem. O videoclipe foi feito com Vou Beijar na Boca, uma homenagem às mulheres que já são emancipadas. Só que às vezes esta emancipação está escondida. Depois de um divórcio há mulheres que ficam um bocadinho retraídas na vida. E aqui é um antidepressivo: amigas, chega de ficar triste a chorar. O Toma, Toma é um divertimento que tem a ver com a energia, com a semana e os dias de trabalho. E depois vem o fim de semana vamos curtir, beber um copo.

Parou uma vez para beber água Foto: Rui Minderico/SÁBADO
Foi intercetado oito vezes por fãs e turistas Foto: Rui Minderico/SÁBADO
Diz que a sua cidade tem uma “energia especial” Foto: Rui Minderico/SÁBADO
Tem tatuada a palavra “sempre” em homenagem à mulher, Daniela Foto: Rui Minderico/SÁBADO



Vinho é um dos seus prazeres – em doses moderadas, garante. A prová-lo, promete lançar o seu primeiro, um lote de tinto pela Casa Ermelinda Freitas, com seis mil garrafas. O rótulo foi criado pela filha Lara Ferrão, de 32 anos, artista plástica. O filho mais velho, Leandro, de 40 anos, corre os bastidores de cinema como diretor de fotografia. A enteada Beatriz, que considera uma filha, quer ser atriz e já faz participações em novelas (como em Festa é Festa, da TVI, onde fez a Florzinha). Nenhum segue a música, o que importa é que sejam felizes, segundo Toy.

Quando vai lançar o seu primeiro vinho?
Em outubro, pela Casa Ermelinda Freitas. Eu e o Jaime Quendera, enólogo principal, fizemos o lote. Esteve 12 meses em barrica e seis em garrafa. Vai ser um belo presente de Natal, terá uma serigrafia da minha filha.

Está a fazer um estúdio em sua casa, em Palmela. Só falta a montagem do equipamento

Os seus filhos nunca sentiram pressão para seguirem música?
Não houve pressão nenhuma. A função dos pais é tentarem perceber quais são as características dos filhos, para onde estão inclinados. Recordo-me de o Leandro ter o 12º ano e dizer: "Pai, vou para Medicina ou para Direito." E eu respondi-lhe: "Vai para cinema que é o que tu gostas." Nós queremos é que os filhos sejam felizes. À Lara disse-lhe: "Tu gostas é de pintar, vai para Inglaterra se for preciso. Felizmente a gente pode, vai embora. Mexe-te." No caso da Beatriz, a mãe estava a dizer-lhe para tirar o curso de Direito, e eu disse-lhe sempre: "Investe tudo no mesmo número [apostar só numa área]."

Porquê a palavra "sempre" tatuada no braço?
"Sempre" foi a palavra que disse quando comecei a andar com a Daniela. E é para sempre. Casámos pelo registo em 2009. Fizemos 15 anos de casamento e a renovação de votos. Foi uma festa com amigos e família, para justificar estar com pessoas amigas sem ser em contexto de trabalho. Adoro convívio.


Faceta de empresário
Não tem agente e gere a carreira pela sua empresa

Totimúsica é o nome da  sua empresa, criada há 19 anos, para gerir a carreira e tratar da burocracia ligada à marcação de concertos com entidades públicas. "Sou eu que trato, e trabalho com todos os agentes que me contactam. Não tenho exclusividade com ninguém." Contudo, não agencia mais artistas por falta de tempo.

Obras registadas
Tem três mil da sua autoria, incluindo bandas sonoras
É o cantor que escreve o repertório e tem cerca de três mil obras registadas na Sociedade Portuguesa de Autores. Fez recentemente um trabalho para uma série da RTP e fará temas para a nova novela da SIC, A Promessa. Várias bandas sonoras de novelas, como a Olhos D’Água (TVI, 2001), têm a sua assinatura.



Desce da mota de linhas clássicas dois minutos antes da hora combinada: 16h28, de uma quinta-feira (dia 20) de sol intermitente. Toy herdou a pontualidade do país onde esteve emigrado há muitos anos, a Alemanha – já lá vão mais de três décadas, quando era torneiro mecânico e levantava, a braços, caixas de 80 kg. Hoje, cabeça de cartaz nos arraiais e nas festas populares, passa a manhã com o teclista a preparar o novo alinhamento: 15 temas para os concertos, onde tem cinco mil a 10 mil pessoas na assistência.

É o primeiro dia de verão, o mais longo do ano, esperemos que o tempo ajude ao passeio com o "rei de Setúbal", grita-lhe um fã que o reconhece à distância. E apesar das nuvens iniciais, o céu fica limpo instantes depois. O entrevistado inaugura, animado, a rubrica Uma Caminhada Com.

Na marginal da cidade natal, Toy, ou António Manuel Neves Ferrão, de 61 anos e 36 de carreira, é intercetado oito vezes por muitos locais e até por turistas. Pedem-lhe selfies, elogiam-lhe a atitude, a voz, os miúdos recordam-lhe o Taskmaster (concurso da RTP). "Quem não gosta?", admite o próprio sobre a popularidade.

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