10 anos do 7 a 1: Trauma não mudou mística, mas provou alteração no conceito do camisa 10 da Seleção

Brasil tenta descontruir valores antigos. Enquanto isso, Alemanha 2 a 0

10 anos do 7x1 - Seleção brasileira 10 Pelé
7 a 1 completa 10 anos nesta segunda (Foto: Arte Lance!)

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Até a Copa do Mundo de 2014 a Seleção Brasileira se acostumou a ter referências mundiais utilizando a camisa 10, número que culturalmente ficou conhecido por ser utilizado nas costas dos “meia-armadores”. O Mundial disputado no Brasil, porém, mostrou certa ruptura com este padrão, pois Neymar vestiu a 10 e não tinha exatamente as características descritas.

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Nas três Copas anteriores, os “bolas de ouro” Kaká, Ronaldinho Gaúcho e Rivaldo foram os responsáveis por usar a camisa 10. Neymar já era conhecido mundialmente, mas tinha somente 22 anos e uma carreira para construir. Hoje com 32 anos e em baixa, não está na Seleção há pelo menos um ano, e Rodrygo é o responsável pela camisa clássica do Rei Pelé.

Para Tino Marcos, setorista da Seleção Brasileira por mais de 30 anos, a produção de atletas brasileiros ultimamente se concentrou na formação de atacantes, com características de jogarem pelas pontas. Por isso, a 10 teria passado para estes talentos, como Neymar e Rodrygo.

— Não temos produzido grandes jogadores dessa posição em larga escala. Acho que, na base, o jogador de categoria, de habilidade, é colocado logo na ponta. Por ali jogam nossos principais jogadores. Faz tempo que não tem um meia clássico de categoria internacional. É uma carência do Brasil, que produz bons pontas e volantes. A gente não tem, por exemplo, um James Rodríguez  - opinou, em entrevista ao Lance!.

Alterações no futebol global

A ausência de um “camisa 10 conceitual” não seria uma questão exclusiva do Brasil. Isso porque o futebol mundial impôs mudanças que tornaram obsoletos os atletas com estas características, de acordo com Paulo Vinícius Coelho, jornalista que cobriu sete Mundiais e autor de dez livros sobre o esporte.

—  Essa conversa do 10 é velha, antiga. Você pega o caso de Alemanha e Espanha (jogo da Eurocopa): quem é o 10 da Espanha? Dani Olmo não é um 10. É um 4-3-3 com três homens de meio-campo. O Uruguai tem três meio-campistas (De La Cruz, Valverde e Ugarte) que defendem, atacam e constroem. Não é esse ponto. O 10, hoje, é a marcação pressão. O que está desatualizado no Brasil é o conceito - analisou.

Rivaldo e Ronaldinho
Ronaldinho Gaúcho e Rivaldo foram camisas 10 da Seleção Brasileira (Foto: Divulgação/Barcelona)

Renato Rodrigues, ex-analista de desempenho do Corinthians e comentarista dos canais Espn, concorda com a visão de PVC. Ele reforçou a mudança para um esporte mais físico e citou De Bruyne, do Manchester City, como exemplo.

—  Ainda temos uns perdidos por aí, mas a função do jogador mais parado, que não joga sem bola, isso o futebol atual não comporta. Estamos em um jogo cada vez mais físico, intenso. O De Bruyne, por exemplo, é um cara tecnicamente absurdo, mas sem bola também pressiona. O 10 ainda existe, mas está em mais faixas do campo. 

Mundial de 2014 não mostrou declínio técnico

O jogador que mais gerou expectativa nos torcedores e foi tratado como o próximo craque geracional foi Neymar. A ausência das características clássicas de um 10 de 2014 em diante, no entanto, não é o problema da Seleção, segundo PVC.

—  Neymar era um ponta de lança que vestiu a 10. A questão é que aquela Seleção de 2014 tinha referências que desistiram do futebol em alto nível. Ronaldinho Gaúcho, Adriano, Kaká tinha lesão. Não houve transição de gerações. Se jogou todo peso de criatividade da Seleção em dois jovens, Neymar e Oscar. Não se ganha Copa assim, nem em 1958. A Seleção tem passado por rupturas, não transições. As crises estão ligadas à rupturas - explicou o jornalista.

Renato Rodrigues citou outros atletas com possibilidades “modernas” para assumir a 10 da Seleção, como Paquetá. Ele também explicou que Neymar, hoje, ainda pode reunir valências para ser a referência.

— Um Paquetá, que também joga de 8. Tem infiltração, chegada na área, se desloca para todos os lados sem a bola. O Oscar teve um pouco essa característica, o Renato Augusto era aquele “oito e meio” com chegada. O Neymar, quando assumiu, jogava pelo lado, mas com liberdade para flutuar e armava o time. Acho que é muito mais importante olharmos para a função do que a posição, do que para um número de camisa - concluiu.

Neymar e Oscar – Seleção Brasileira
Neymar e Oscar na Seleção (Foto: Rafael Ribeiro / CBF)

Camisa 10 do Brasil foi esvaziada?

Mesmo com certa perda de um camisa 10 clássico, algo que mudou de forma global, a Seleção Brasileira ainda estaria bem servida. De acordo com Tino Marcos, Rodrygo é um bom sucessor do imortal número da Canarinho.

—  A camisa 10 da Seleção não está esvaziada. O Rodrygo é um cara de primeira prateleira no mercado do mundo, vestiria a 10 de muitas seleções. É que a gente se acostumou mal, desde a origem do peso da camisa 10 que o Pelé deu. Quando se trata de Brasil, a referência é Pelé, tem esse peso. Mas está muito bem entregue ao Rodrygo - analisou.

Pelé e Jairzinho, Copa de 70
Pelé imortalizou camisa 10 da Seleção (Foto: Reprodução)

Camisas 10 da Seleção Brasileira nas Copas, desde a primeira de Pelé

  • 1958: Pelé
  • 1962: Pelé
  • 1966: Pelé
  • 1970: Pelé
  • 1974: Rivellino
  • 1978: Rivellino
  • 1982: Zico
  • 1986: Zico
  • 1990: Silas
  • 1994: Raí
  • 1998: Rivaldo
  • 2002: Rivaldo
  • 2006: Ronaldinho Gaúcho
  • 2010: Kaká
  • 2014: Neymar
  • 2018: Neymar
  • 2022: Neymar

Os oito gols do especial 10 anos do 7 a 1 do Lance!

1 a 0: O que a Seleção quer ser?
2 a 0: Goleada afetou até a mística da camisa 10
3 a 0: As mentiras de 2014 seguem vivas
4 a 0: As marcas do resultado mais surpreendente das Copas
5 a 0: A relação do trauma com a avalanche de técnicos estrangeiros no Brasil
6 a 0: Os números da crise de resultados
7 a 0: título alemão coroou projeto que o Brasil precisa começar
7 a 1: Ações buscam reaproximar Seleção da torcida

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