Luiz de Freitas Bueno

Foto do professor Bueno

“... Formado em engenharia pelo Mackenzie, foi o primeiro professor de Estatística Geral e Econômica da FEAUSP. Inteligente, simpático e generoso, criou uma enorme legião de amigos e foi o grande inspirador da orientação quantitativa no estudo da economia que até hoje é uma importante característica da FEAUSP.

Como todos os nomeados no momento da instalação da escola, ele era um autodidata com alguma proficiência na estatística elementar. As exceções eram dois magníficos professores: Paul Hugon, importado da França para ministrar o curso de Introdução à Economia e Wilfred L. Stevens, vindo da Inglaterra (via Portugal) que introduziu no Brasil a estatística fisheriana.

Nomeado, Bueno tratou de aprofundar-se no estudo da economia e da estatística. Em 1946, no campo da economia existiam dois manuais: um americano (Frank A. Fetter The Principles of Economics, 1904) e outro inglês (Alfred Marshall Principles of Economics, 1890), com dezenas de reedições que dominaram durante décadas o ensino. O primeiro, mais institucional, sem nenhum uso da matemática (com apenas um gráfico) foi o mais utilizado nos EUA até o aparecimento do revolucionário 'Economics' (1948), de Samuelson, que chegou ao Brasil no início dos anos 50.

O segundo é o clássico que revolucionou o ensino da economia no Mundo. Marshall era originalmente professor de matemática e acrescentou ao livro um Apêndice Matemático que seduziu completamente o prof. Bueno 'Tudo está em Marshall', dizia-se em Cambridge e aceitava-se no Brasil... Depois, ele se rendeu aos italianos (Pareto e Amoroso) e a Walras, que construíram uma teoria econômica cópia da Física Clássica.

Na Estatística (depois de Stevens) ele abraçou a teoria fisheriana misturada com os avanços produzidos por Haavelmo na construção da Econometria, à qual ficou preso definitivamente. Com essa formação, a 'revolução keynesiana' era absolutamente ininteligível: ela chegou à FEA tardiamente, já nos anos 50 por via desidratada e matematizada, mas sem os seus ingredientes fundamentais, a incerteza e as expectativas.

Bueno foi, antes de tudo, um grande professor e um enorme ser humano: didático, preparava cuidadosamente suas aulas e as enriquecia com larga bibliografia. Montou uma excelente biblioteca que hoje se encontra incorporada à da FEA. Sua maior contribuição foi, certamente, a formação de um grupo de estudantes interessados no desenvolvimento da economia quantitativa insistindo sempre na modelagem de séries de tempo. Ele foi o primeiro professor da FEA a escolher como assistentes seus ex-alunos e a estimulá-los a avançarem para além dos seus mestres. A alegria que sempre demonstrou pelo progresso de seus discípulos revelava a grandeza de seu espírito avesso a qualquer sentimento de inveja. O nome de Luiz de Freitas Bueno será sempre lembrado como um daqueles autodidatas que souberam superar sua condição, profissionalizando-se e profissionalizando várias gerações de economistas, fortalecendo o espírito de sua 'Alma Mater' adotiva.”

Prof. Antonio Delfim Netto
Jornal Folha de São Paulo de 22 de março de 2006