• Claudia Lima (@claudialima)
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LONDON, ENGLAND - FEBRUARY 10: Viola Davis attends the EE British Academy Film Awards at Royal Albert Hall on February 10, 2019 in London, England. (Photo by Jeff Spicer/Getty Images) (Foto: Getty Images)

Viola Davis: "Ainda sinto que vou acordar e todo mundo vai me ver pelo fraude que sou" (Foto: Getty Images)

Eu não sei vocês, mas eu madruguei para assistir à estreia de Oprah e Viola, em cartaz na grade de programação da Netflix. O programa mostra uma conversa franca entre a estrela hollywoodiana e a apresentadora Oprah Winfrey por conta do lançamento de sua autobiografia, Finding Me, escrita durante a pandemia da Covid-19.

No livro (ainda sem previsão de lançamento no Brasil), Viola, 56 anos, faz um raio X de toda sua trajetória de criança miserável (em suas próprias palavras), vivendo em extrema pobreza ao lados dos pais e das irmãs numa casa sem calefação, em condições de higiene precárias e sem comida na mesa.

Do bullying que sofria diariamente na escola (incluindo ser chamada de feia sistematicamente por todos ao redor), levando sua autoestima no pé, à escolha pela carreira de atriz contrariando tudo e todos, seus primeiros passos na profissão até sua consagração como uma das maiores atrizes vivas hoje.

Na entrevista, fica evidente que, além de poderosa (sem querer esvaziar essa expressão), ela é, sobretudo, determinada. Por lutar para sair das estatísticas, conseguir driblar todas as adversidades para sair daquela vida e ainda conseguir manter vivo o sonho de se tornar atriz. Sabemos que, embora muitas de nós hoje ocupemos cada vez mais espaço nas empresas, conselhos, universidades e redações, não é um caminho fácil para uma mulher preta.

Viola é prova disso: nem mesmo o fato de ser uma mulher lindíssima, com uma trajetória exemplar, um Oscar, um Emmy e dois prêmios Tony coroando sua carreira, ainda ganha menos do que atrizes do seu nível, como Meryl Streep e Julia Roberts, por exemplo. Ora, sabemos muito bem como essa conta funciona e porque isso acontece.

Viola Davis (Foto: Reprodução / Instagram)

Viola Davis (Foto: Reprodução / Instagram)

E quando "chegamos lá", muitas vezes somos tomadas por um pânico. O que fazer com isso? "Ainda sinto que vou acordar e todo mundo vai me ver pela fraude que sou. Ainda sinto que, quando entro no set, estou começando do zero até perceber que sei o que quero fazer. Eu sou humano", disse em uma entrevista, logo após ganhar o Oscar de atriz coadjuvante por Um Limite Entre Nós, em 2017.

Sim, ela se sente, muitas vezes, uma impostora, a ser descoberta a qualquer momento. Não deve ter ajudado a enxurrada de críticas que recebeu por sua atuação na pele de Michele Obama na série The First Lady, que retrata a vida de algumas primeiras-damas americanas. Eu acompanhei e li de tudo: Michelle Obama caricata e cringe. Tropeço na carreira. Caras e bocas. Interpretação vexatória. Desperdício de talento. Desperdício?

Isso me faz pensar em como eu (e certeza de que você também e várias mulheres que eu conheço) muitas, muitas vezes caio nessa cilada de achar que não sou boa o suficiente, que não vou dar conta, não vou saber fazer, etc, etc, etc...

No nosso caso (dos pretes), sabemos que desde sempre muitas vezes temos que trabalhar três vezes mais para provar que somos realmente bons (o tal imposto negro), mas acho que a idade amplifica este sentimento. Principalmente num mercado que troca facilmente tempo de carreira e experiência por um frescor novidadeiro e  sem conteúdo. E dá-lhe conversa com as amigas e muuuuuita terapia.

Confesso que, apesar dos meus mais de 30 anos de profissão (e de várias puxadas de orelha da terapeuta), várias vezes, inclusive enquanto escrevia esse texto, pensei: será que está bom? Ou eu tô falando bobagem? Os homens definitivamente devem pensar nisso muito menos que nós. Será que se eu fosse um homem, branco, também pensaria assim?

Sempre, sempre vai ter alguém para julgar e falar mal, mas isso não pode nos parar. Acho que um bom antídoto para quando bater este sentimento é não olhe para o outro. Não se compare. Respira fundo, levanta a cabeça e use o bom e velho postei e saí correndo.
A vida segue, acredite.