• Thiago Baltazar (@thiagobaltazar)
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Emily Ratajkowski na campanha da coleção Spinelli Kilcollin x ER (Foto: Instagram Spinelli Kilcollin/ Reprodução)

Emily Ratajkowski  (Foto: Instagram Spinelli Kilcollin/ Reprodução)

Por muitas vezes, Emily Ratajkowski usou sua imagem para conquistar um espaço no exclusivo time das modelos mais bem sucedidas do mundo da moda –ela acreditava que sexualizar sua aparência somente traria benefícios. Mas a top, que já estampou uma capa da Vogue americana em 2020, descobriu anos mais tarde que também estava sendo explorada, especialmente pelos homens, que a julgavam exclusivamente por sua beleza, ignorando toda sua potência intelectual - assim como acontece com tantas mulheres. “Só que no meu caso, meu sustento dependia disso”, conta ela à Vogue Brasil.


Em um livro com 216 páginas chamado “Meu Corpo”, que acaba de chegar ao Brasil pela Editora Buzz, EmRata, como é apelidada, quer contar sua história sem se colocar no papel de vítima, mas com o objetivo de mostrar o preço que se paga por sexualizar a própria imagem. “Você sente como se estivesse vencendo, mas, no fim, vem um alto custo porque você acaba sendo avaliada somente pela sua aparência. E, depois, como fica seu respeito próprio?”, questiona.

No livro, ela reflete sobre a dinâmica de poder que há entre homens e mulheres – e como a aparência tem papel fundamental nesse processo. Este é o motivo pelo qual ela cita na obra o dia em que foi assediada por Robin Thicke durante a gravação do clipe “Blurred Lines”. O cantor, na ocasião, tocou seus seios nus sem seu consentimento enquanto estavam no set de filmagem. “Meu objetivo era mostrar que muitas circunstâncias influenciam a forma como estas situações se desenvolvem”, explica ela. Leia a entrevista a seguir.

Vogue: Como surgiu a ideia de escrever um livro?
Emily Ratajkowski:
Eu já tinha escrito uns dois ensaios quando comecei a pensar que talvez eles pudessem se transformar em um livro. Acho que tinha uns 8 ensaios quando apresentei a proposta [a uma editora de livros]. Tinha umas 15 mil palavras. Eu escrevi muito porque não queria apresentar uma ideia abstrata, queria que as pessoas entendessem minha ideia.

V: O título do livro é “Meu Corpo”, mas não há fotos de seu corpo. Essa estratégia foi uma forma de fazer as pessoas prestarem mais atenção no que você tem a dizer?
ER:
Eu dei o título de “Meu Corpo” para contar minha história e vivência, desde quando era uma jovem garota até me tornar uma pessoa pública. E achei que o título iria chamar a atenção das pessoas de alguma maneira –por muito tempo, ao pensarem sobre mim, elas automaticamente pensavam no meu corpo.

Emily Ratajkowski lança livro Meu Corpo (Foto: Divulgação)

Emily Ratajkowski lança livro Meu Corpo (Foto: Divulgação)

V: Ser uma mulher considerada bela rendeu boas oportunidades para você como modelo, mas, também, fez com que se sentisse constrangida diante do assédio masculino. Como foi passar por essa experiência?
ER:
Eu comecei a trabalhar como modelo logo que me formei (no ensino médio), em 2009, porque os EUA estavam mergulhados numa crise financeira. Meus amigos estavam voltando a morar com os pais e muitos deles ainda tinham uma dívida estudantil para pagar. Eles tinham de trabalhar em cafeterias ganhando um salário mínimo. E modelar, naquela época, foi um ótimo jeito para eu ganhar dinheiro. Além disso, ser modelo me trouxe status, este é um trabalho glamouroso. Por outro lado, eu era avaliada pela minha aparência – assim como todas as mulheres também são. Só que no meu caso, meu sustento dependia disso. Eu quis escrever sobre minhas experiências para mostrar como ser avaliada pela sua imagem, especialmente por homens, é prejudicial.

V: Em seu livro, você lembra do episódio em que foi assediada por Robin Thicke durante a gravação do videoclipe Blurred Lines. Como você se sentiu revelando isso ao mundo?
ER:
Esta é uma parte da minha complicada trajetória com a moda, e foi vazada para a imprensa sem o contexto do livro. As pessoas passaram a falar: “Nossa, ela se pronunciou sobre este assunto”. Mas esta não era minha intenção, queria que as pessoas lessem o que escrevi para que entendessem que eu estava falando sobre a dinâmica de poder entre homens e mulheres. Algumas pessoas bem intencionadas até me elogiaram por ter “quebrado o silêncio”, mas eu sempre dizia: “Você nem chegou a ler…” [risos]. Na verdade, eu nem tinha certeza se queria incluir essa experiência no livro porque sabia que acabaria virando manchete, mas acredito que, com o contexto, as pessoas irão entender porque decidi adicioná-lo.

V: Em entrevista à “British Vogue”, você afirmou ter mais interesse em fazer perguntas em relação ao feminismo do que dar respostas prontas. Em um mundo tão polarizado, no qual a cultura do cancelamento é tão disseminada, não é tão comum haver pessoas interessadas em analisar as situações em vez de simplesmente se posicionar de um lado.
ER:
Na nossa cultura, costumamos dividir as coisas e as pessoas em duas categorias: boas e más. Se fosse assim, a vida seria mais fácil, mas a realidade é que ela é mais complicada do que isso. Por isso, eu estou mais interessada em fazer perguntas e revelar dinâmicas de poder em vez de acusar uma pessoa de ter feito algo errado. Meu objetivo é mostrar que muitas circunstâncias influenciam a forma como estas situações se desenvolvem. Eu nem penso tanto assim sobre este fato em particular, para mim, a ideia do livro é ilustrar a experiência de uma mulher que passou por este tipo de experiência no ambiente de trabalho e como a aparência dela está conectada com o que aconteceu.

V: As mulheres brasileiras, assim como você, têm uma imagem muito sexualizada internacionalmente. Como você lidou com isso quando era mais nova?
ER:
Quando estava no Ensino Fundamental II tinha vezes em que queria usar uma roupa mais sexy. Estava descobrindo como me sentia ao receber atenção dos meninos. Na época, eu pensava comigo mesma: “Bom, vou sexualizar a mim mesma porque, pelo menos, estarei no controle e terei sucesso dessa forma”. Sim, o controle proporciona algo, mas não me protegeu e não fez com que eu me sentisse realizada. Eu não sentia que, de fato, tinha poder. Quando olho para a menina que eu era com vinte e poucos anos eu me pergunto: “Você achava que estava no controle, mas você se sentiu tão bem assim? Foi tão maravilhoso?” Esse é o insight que eu quero provocar nas meninas mais jovens. Você sente que está vencendo, mas, no fim, vem um alto custo porque você acaba sendo avaliada somente pela sua aparência. E como fica seu respeito próprio?

V: E agora, depois do sucesso de seu primeiro livro, existe a possibilidade de você escrever outro?
ER:
Eu gostaria, ainda não comecei. Mas gostaria, sim.

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