• Ana Carolina Pinheiro (@anacarolipa)
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Erika Januza (Foto: Divulgação | Leca Novo)

Erika Januza em ensaio de fotos inspirada em Rosa Egipcíaca, fotogrado em Ouro Preto, Minas Gerais (Foto: Divulgação/ Leca Novo)

Para a mineira Erika Januza, de 37 anos, a rotina profissional interfere diretamente em seu estado de espírito, que fica estremecido com longas pausas entre um trabalho e outro. Hoje, completando 10 anos de carreira, Erika está com a agenda cheia, mas apostando em trabalhos nos quais realmente acredita. “Se não tem a mensagem que quero passar, preciso ter coragem para dizer não. Afinal, vivemos uma profissão de incertezas”, explica a atriz, que acompanha empolgada o resultado da segunda temporada de Arcanjo Renegado.

Erika Januza (Foto: Divulgação | Leca Novo)

Erika Januza (Foto: Divulgação/ Leca Novo)

Na série exibida pelo Globoplay, Erika é uma fem, nome dado às agentes policiais mulheres. Sarah, sua personagem, volta para a história seguindo o legado da família Afonso na carreira militar. Entre conversas com policiais e treinamento prático, a atriz captou a vivência do que é estar dentro da corporação, principalmente sendo uma mulher. “Fiquei feliz de ver uma cena no quarto episódio, em que fiz um rolamento que aprendi nas aulas”, diz Erika sobre a trama, que tem no elenco Marcello Melo Jr como Mikhael, o protagonista e irmão de Sara, e também Léa Garcia e Ludmilla, estreando como atriz.

Com o mesmo afinco que Erika se dedica à dramaturgia, ela também se prepara para o Carnaval. Para quem pensa que esse esquenta envolve apenas treinos e dietas, está bem enganado. A rainha da bateria da Viradouro fala com orgulho sobre as descobertas que teve com o enredo da agremiação, que trará a história da escritora Rosa Egipcíaca como destaque no desfile de 2023 da escola. Considerada a primeira mulher negra a escrever um livro no Brasil, a personalidade, que teve seu nome ignorado nas escolas e nos livros que falam sobre a diáspora africana, é interpretada por Erika nesse ensaio de fotos feito em Ouro Preto, Minas Gerais, e divulgado com exclusividade à Vogue.

Erika Januza (Foto: Divulgação | Leca Novo)

Erika Januza (Foto: Divulgação | Leca Novo)

Segundo historiadores, Rosa nasceu no país africano Benim e chegou ao Brasil, mais especificamente no Rio de Janeiro, em 1733, por meio do tráfico de pessoas escravizadas. Após ser levada para Minas Gerais, ela foi prostituída e anos depois passou a estreitar laços com a Igreja Católica até ser considerada santa. Diante dos fiéis, Rosa uniu elementos do catolicismo a outros de religiões de matrizes africanas, fato que gerou perseguição de bispos e padres a ela, que se aproximou da literatura. Nessa época, ela escreveu o livro “Sagrada teologia do amor de Deus luz brilhante das almas peregrinas”, considerada a primeira obra escrita por uma autora negra no Brasil.

Em um bate-papo sobre essa homenagem à autora negra, carreira e relacionamento, a artista divide detalhes do editorial de fotos, gravação da série, relação com a autoestima e metas profissionais.

Na segunda temporada, a Sarah retorna na série como uma policial militar. Como foi a sua preparação?

Quando soube que ela ia virar uma fem, conversei com algumas agentes. Fizemos roda de conversa e treinamento para eu entender desde como funciona uma abordagem até de que forma o machismo é apresentado para elas nesses espaços dominados por homens. Desde o começo da pandemia, comecei a fazer aulas online e depois tive outras presenciais para aprender a manusear armas, que é muito distante de mim e da minha realidade. Os disparos, por exemplo, aconteciam na hora da cena, não tinha ensaio e meu impulso era de fechar o olho, quando na verdade precisava estar com os dois abertos e atenção total. Fiquei feliz que, organicamente, inseri coisas de treinamento que aprendi, como rastejar, e ouvir deles que ficou ótimo. Queria passar a verdade.

Erika Januza (Foto: Divulgação | Leca Novo)

Erika Januza (Foto: Divulgação | Leca Novo)

Na série, você atua com a veterana Léa Garcia e com Ludmilla estreando como atriz. Como foi essa troca entre vocês?

Primeiro, se não fosse pelo trabalho de atrizes, como a Léa e Zezé Motta, eu nem estaria aqui nessa entrevista. Nos bastidores, a Léa, no auge da sua experiência, nos pergunta se a cena dela ficou boa. Ela é maravilhosa! A Ludmilla mandou muito bem nas gravações. Ela está mostrando uma versão surpreendente e bem diferente do que o público está acostumado. Ela me pediu dicas, chegou com o texto na ponta da língua e confesso que não perdi a oportunidade de recebê-la cantando no set (risos). Nós, artistas negros, somos 67% do elenco da série e vivemos personagens diversos. Isso é ter representatividade.

Erika Januza (Foto: Leca Novo)

Erika Januza (Foto: Leca Novo)

O enredo da Viradouro em 2023 vai abordar a temática racial a partir da história da Rosa Egipcíaca. O que você sentiu ao conhecer a história dessa personalidade?

Com todo mundo que converso, é unânime esse sentimento de choque por não ter escutado essa história antes. Inclusive, levei a Luana Genot [diretora do Instituto Identidades do Brasil] para conversar com o carnavalesco Marcelinho Calil. Minha ideia é conectar diversos intelectuais e personalidades negras com a Rosa. Esse enredo será um resgate não só para a cultura negra, mas para todo o país por meio do samba.

Como foi a produção do editorial inspirado na história dela?

Ela morou em Ouro Preto, então fomos para lá tirar as fotos. Buscamos elementos que mostrassem essa relação dela com a religiosidade e a literatura. Além disso, tivemos uma participação especial do Luiz, estilista da Apartamento 03. O look de crochê é do último desfile dele e a roupa feita de bambu é o trabalho de conclusão de curso dele feito na época da faculdade.

Neste ano, você completa 10 anos de carreira. Qual a importância de ter vivido personagens tão variados, principalmente sendo uma atriz negra?

Fui muito agraciada com as oportunidades que tive de contar histórias relevantes por meio da arte. Costumo dizer que o personagem escolhe a gente, mas hoje em dia priorizo trabalhos que conversam com o que acredito. Se não tem uma mensagem que busco passar, preciso ter coragem para dizer não, até porque é uma profissão de incertezas. Os atores podem ficar em situações difíceis por conta disso. Então não é só escolher, mas ter maturidade diante dessas escolhas para não entrar em algo que não me sinto bem. Mas tenho recebido coisas que amo fazer e, por isso, agarro essas oportunidades e procuro o que ainda não realizei. Hoje tenho coragem de falar que quero trabalhar com um profissional que admiro.

De que forma você busca equilibrar essas oportunidades com a sua vida pessoal?

Sou uma pessoa que gosta muito de trabalhar. Minha vida pessoal passa muito pelo profissional. Quando estou em movimento, minha relação comigo mesma é positiva. Já tive época com pouco movimento de trabalho e fiquei mal, então valorizo quando tenho bastante coisa. Mas, ao mesmo tempo, estou sempre atenta à minha saúde. Gosto de passar em vários profissionais para estar preparada para aguentar essa rotina, porque, se você não está bem, você não faz nada.

Você e o Juan Nakamura estão juntos há mais de dois anos. O que esse relacionamento vem te ensinando?

Ainda que com ritmos completamente diferentes, já que eu sou muito agitada, e ele totalmente calmo. A gente se dá muito bem. No começo, eu tinha uma insegurança com a questão da idade, temos 14 anos de diferença, mas depois caiu por terra. Com a convivência, isso se tornou irrelevante.

Essa segurança também mudou outras áreas da sua vida?

Com certeza! Quando a gente vai se conhecendo, perdemos o medo de algumas coisas e ligamos menos para o que os outros estão pensando. Isso acontece no meu estilo, por exemplo, se tenho um look muito diferente, mas que faz sentido para a ocasião, vou arriscar. Me permito usar tudo e aprendi muito com o Vitor Carter, meu stylist há sete anos. Ele que produziu as fotos desse editorial, inclusive. Então, às vezes, posso estar mais romântica, com mais pele à mostra ou formal, mas o importante é que eu me sinta bem e que tenha uma ideia por trás do estilo em si.

Falando em estética, o que você tem gostado de usar?

Esse processo de conexão com a beleza foi transformador para mim quando me tornei atriz. Tinha o cabelo alisado, passei pela transição capilar e comecei a entender quais são as minhas possibilidades de imagem. Em relação à maquiagem, também tinha uma trava para usar batom, achava que não podia por ser negra. Mas agora me aceito e, consequentemente, me abro muito mais para a ousadia.