• ANA LUIZA CARDOSO
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Voto feminino completa 90 anos e mulheres precisam batalhar muito ainda por espaço (Foto: MAR+VIN)

Passeatas de estudantes, criação de um partido feminista, panfletos jogados de monomotor, uma peça de teatro e muita pressão política foram algumas das estratégias de mulheres, de diferentes épocas, atrás do direito ao voto no Brasil, que completa 90 anos nesta quinta-feira (24).

Essa conquista saiu no Código Eleitoral, decretado por Getúlio Vargas em 1932, que também implementou o voto secreto e lançou a Justiça Eleitoral.

Ilustração do livro Mulheres na Luta: 150 anos em busca de liberdade, igualdade e sororidade, de Marta Breen & Jenny Jordahl (Cia das Letras) (Foto: Divulgação)

Ilustração do livro Mulheres na Luta: 150 anos em busca de liberdade, igualdade e sororidade, de Marta Breen & Jenny Jordahl (Cia das Letras) (Foto: Divulgação)

“A primeira grande luta feminista foi pela educação, no século 18.  As lutas pelo direito ao trabalho e ao voto chegam juntas no século 19”, explica Mônica Karawejczyk, professora da PUC-RS, e autora do livro Mulher deve votar? (Paco Editorial).

Após revolução na França, em 1848, com ampliação de direitos políticos a homens, muitas mulheres se sentiram excluídas das decisões. “Por causa dessas restrições, começaram a aparecer grupos de mulheres, em forma de associações, para exigir direito de participação no mundo político. Foi um movimento global”, continua. 

No Brasil, grupos de mulheres viram oportunidade de conseguir o voto a partir da proclamação da República, em 1889. Nessa época, entre as que defendiam o direito, aparece Josefina Álvares de Azevedo, dona de jornal, que chegou a lançar uma peça de teatro chamada “O Voto Feminino”.

Integrantes do Partido Republicano Feminino fazem passeata no Rio, entre 1910 e 1920 (Foto: Hemeroteca Digital Brasileira/Biblioteca Nacional)

Integrantes do Partido Republicano Feminino fazem passeata no Rio, entre 1910 e 1920 (Foto: Hemeroteca Digital Brasileira/Biblioteca Nacional)


Sem sucesso, anos mais tarde, em 1910, Leolinda Daltro fundou o primeiro partido feminista do Brasil, o Republicano Feminino. “Existe uma foto de passeata em que Leolinda levou estudantes e correligionárias do partido até o então presidente Marechal Hermes da Fonseca, no Palácio do Catete, e fizeram petições”, declara a especialista. 

A partir de 1919, surge em cena a bióloga Bertha Lutz, líder da Federação Brasileira pelo Progresso Feminino (FBPF). Mônica relembra o episódio em que ela, ao lado da também feminista Carmen Portinho, lançou folhetos a favor do voto feminino a partir de um monomotor.

(Original Caption) Baltimore, Maryland: Opening of the Pan American Women's Conference in Baltimore. Senorita Bertha Lutz, delegate from Brazil and one of the most important prominent women of South America. (Foto: Bettmann Archive)

A bióloga Bertha Lutz, líder da Federação Brasileira pelo Progresso Feminino (FBPF) (Foto: Bettmann Archive)

A pressão pelo direito ao voto no Brasil aumentou após mulheres no Rio Grande do Norte protagonizarem a primeira participação feminina numa eleição no país, em 1927. Em 1930, Vargas assume o poder. “Em dezembro daquele ano, foi feita uma comissão para renovar leis no país e, dentre elas, havia a eleitoral”, disse Mônica. Com isso, os grupos feministas pressionaram mais ainda o governo por mudanças até o lançamento do Código, em 1932.

“Bertha Lutz estudou fora [na universidade Sorbonne], e teve uma relação com ideais da modernidade, e trouxe isso ao fundar a FBPF, que é a instituição que ela usou para tentar defender o voto”, diz Débora Thomé, cientista política e pesquisadora associada ao Laboratório de Estudos de Gênero e Interseccionalidade da UFF. Débora também é autora do livro 50 brasileiras incríveis para conhecer antes de crescer (Editora Record), sobre personagens da história com biografias marcantes.

Além de Bertha, em seu livro aparece Carlota Pereira de Queirós, primeira deputada federal do país, eleita pelo estado de São Paulo, em 1934, e a Antonieta de Barros, primeira mulher negra no país a ser eleita, após se tornar deputada estadual também em 1934. 

E COMO ESTAMOS?

A batalha por espaço feminino na política brasileira está longe do fim. Em 2022, representando 52,50% do eleitorado no país, as mulheres possuem apenas 15% das cadeiras na Câmara de Deputados e 11,54% no Senado.

“Se pegar os 90 anos, de 1932 para agora, tivemos um avanço ínfimo, de uma mulher [deputada federal] para 77. Isso significa 15% do total (513 assentos), e é muito baixo”, diz Débora Thomé, que defende a reserva de vagas para as mulheres. “Determinada por lei, que metade do Congresso tenha que ser preenchido por mulheres. Tem chance de passar hoje? Não de 50%. A briga poderia ser por 30%”.

Erika Hilton na Vogue (Foto: Vogue Brasil)

Erika Hilton na capa digital da Vogue Brasil de dezembro de 2020 (Foto: Foto: Cai Ramalho/Arquivo Vogue Brasil)

“Ser mulher na política é difícil. Um dos maiores desafios é chegar nesse espaço, em que colocam muita dificuldade para nós”, pontua a vereadora Érika Hilton, do Psol. “São 90 anos e ainda enfrentamos ataques, ameaças de morte, tentativas para que retrocedamos”.

“Existe um lugar muito básico, insipiente e raso em que a gente luta e vive, que é a dimensão do assédio, do assédio sexual, obviamente, e querem eliminar nossas vozes, palavras, não levam em consideração a nossa fala”, argumenta a deputada estadual Erica Malunguinho, do Psol.

“As políticas afirmativas, de reparação são importantes, fundamentais, uma pena que ainda temos que lidar com pessoas desonestas, partidos desonestos que usam mulheres como uma forma de angariar mais recursos, capital político e não trazer efetivamente a pauta de gênero para dentro do debate público”.

Erica Malunguinho (Foto: Reprodução/ Instagram)

Erica Malunguinho (Foto: Karla Brights/Reprodução/ Instagram)