• Sofia Ferreira (@sofiacsf)
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Segundo estudo, a fadiga do Zoom é ainda pior entre mulheres  (Foto: Reprodução Instagram @iselin_issa)

Segundo estudo, a fadiga do Zoom é ainda pior entre mulheres (Foto: Reprodução Instagram @iselin_issa)

Não há como negar: estamos exaustos do Zoom – mas, segundo estudos recentes, essa fadiga é especialmente sentida por mulheres. A pesquisa é da Universidade de Stanford, e aponta que mais de 13,8% das mulheres se sentem "muito" ou "extremamente" cansadas após chamadas de videoconferência, em comparação com 5,5% dos homens. O motivo? Um aumento excessivo no que psicólogos chamam de “atenção autocentrada”, desencadeada pelas longas horas encarando a autoimagem nas chamadas de vídeo.

“A tendência à autocobrança somada à preocupação com o julgamento dos outros geram a necessidade de estar adequado e ser aceito no contexto, se tornando um forte gatilho para a ansiedade excessiva”, comenta a Flávia Teixeira psicóloga, mestre em Saúde Coletiva pela UFRJ. A equipe de pesquisadores chegou a essas conclusões com base em dados de dois grupos analisados, de acordo com Jeff Hancock, diretor fundador do Stanford Social Media Lab e autor do estudo.

Eles criaram uma “escala de fadiga de Zoom”, e submeteram 10.000 entrevistados a perguntas sobre hábitos durante as videoconferências, incluindo questões relacionadas ao que Hancock chama de “ansiedade do espelho” – o estresse que você sente daquela pequena janela de autovisualização. As perguntas incluíram: “qual é o seu grau de preocupação com sua aparência?” e "quão distraído você fica pela sua imagem?". A equipe descobriu que as mulheres relataram maior ansiedade pela autocobrança do que os homens, e o sentimento é o responsável por gerar ainda mais exaustão a esse grupo demográfico.

Para garantir que os dados autorrelatados não fossem enviesados, um segundo teste foi feito para checar se os resultados se acumulavam. Usando uma pergunta ampla, eles pediram às pessoas que escrevessem sobre suas experiências gerais com o uso de plataformas de videoconferência. Por trás do experimento existia um motivo oculto: queriam analisar o uso dos pronomes dos entrevistados. De acordo com Hancock, a pesquisa mostrou que as pessoas que usam pronomes na primeira pessoa, como “eu” e “meu”, são mais focadas em si mesmas. Aqueles que usam pronomes como “nós” e “eles” colocam seu foco no próximo. Eles descobriram que “as mulheres usavam mais a primeira pessoa do singular ao falar sobre o Zoom e isso se correlacionava com o quão cansadas elas se sentiam”, diz Hancock.

Mas, afinal, por que essa exposição a autovisão gera mais ansiedade entre as mulheres? Tem a ver com o direcionamento da nossa atenção. Segundo Hancock, estudos mostram que as mulheres são mais propensas ao autofoco prolongado e são distraídas ou desencadeadas por espelhos físicos. “As mulheres estão sobrecarregadas e sentem que precisam sempre estar à altura de outras mulheres que consideram (ilusoriamente) referências. É uma tendência feminina se comparar mais, e isso gera mais insegurança. Num momento como esse, de pandemia, onde estamos mais vulneráveis e mais expostos ao mesmo tempo, tudo ganha uma proporção maior, causando muita angústia, frustração e ansiedade”, acrescenta Stella Azulay, especialista em Neurociência Comportamental pela Faculdade Belas Artes.

Ao contrário de muitos hábitos da vida pós-pandemia, essa realidade não é diferente do que vivíamos há um ano, afinal, sempre houve pressão social indevida sobre a aparência e o comportamento das mulheres. "Por mais que se tenha uma rede de apoio, é quase sempre a mulher que fica à frente das situações domésticas, restringindo o tempo para cuidar de si. E o fato de ter sua imagem exposta o tempo todo em reuniões virtuais gera uma autocobrança muito desgastante”, explica a psicóloga Adriane Branco. Não à toa, as mulheres são mais predispostas a ter depressão e a desenvolver transtornos de ansiedade. “Enquanto cerca de 20% delas apresentam algum episódio depressivo ao longo da vida, apenas 12% dos homens sofrem o mesmo”, acrescenta Cristiane Romano, doutora em Ciências e Expressividade pela USP.

Existem algumas possíveis correções de design, segundo Hancock, que podem melhorar o problema – que não é específico do Zoom. O autor diz que sua equipe está em contato com o Zoom e o Microsoft Teams, que também possui um “espelho virtual”, embora o Teams seja comparativamente menor. “Nossa recomendação em tudo isso é que devemos repensar a visão própria como padrão”, diz Hancock. A sugestão do time é que as plataformas de videoconferência iniciem as sessões com uma autovisualização visível e, em seguida, ela desapareça ou fique opaca, reaparecendo apenas se necessário.

A análise do estudo também levanta a questão de que, embora as plataformas de videoconferência tentem imitar a vida real, elas não são um verdadeiro reflexo da nossa realidade. “Dado o fato de que a interface Zoom e a maioria das plataformas de vídeo por padrão [usam] um espelho digital, é uma grande diferença em relação ao nosso cara a cara usual”, diz Hancock. “É como ter um espelho ao lado da cabeça da outra pessoa. É louco. Estávamos preocupados que, assim como os espelhos físicos, os espelhos digitais pudessem ter um efeito muito mais negativo nas mulheres do que nos homens com a exposição prolongada”. E, de fato, aconteceu.