• Rosa Moraes (@rosamoraes5)
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Marcelo Ballardin (Foto: Divulgação)

Marcelo Ballardin (Foto: Divulgação)

A gente bem sabe que o olhar do mundo para o Brasil nesse momento não é dos mais positivos. A gente também sabe que não é o povo brasileiro o grande responsável por essa desconfiança generalizada. O buraco, nesse caso, é mais em cima. E por isso mesmo pensei em encerrar 2021 falando do outro lado da moeda: brasileiros que estão lá fora representando o país e trabalhando em prol de uma imagem de Brasil bem diferente da que tem figurado nas manchetes graças ao nosso desgoverno; pessoas que, com garra, coragem, perseverança e a força da gastronomia brasileira, estão sendo não só reconhecidas, mas aplaudidas de pé pelo mundo todo.

Uma delas é o chef Marcelo Ballardin, que saiu de Manaus para se tornar o primeiro brasileiro a conquistar uma estrela Michelin fora do país. Marcelo inaugurou seu impecável OAK Gent na Bélgica, em 2014, depois de uma trajetória de “cidadão do mundo” que já indicava que o menino chegou para sacudir as estruturas. Ainda adolescente, se mudou com a família para os Estados Unidos e não parou mais quieto. De lá foi estudar na Itália, terra da família paterna, e depois em Londres, onde cursou Le Cordon Bleu. O chef trabalhou em restaurantes icônicos como o 1 Lombard Street, na capital inglesa, e o Geranium, em Copenhague, antes de se fixar na Bélgica. E foi no pequeno país europeu em que ele fincou sua bandeira: um restaurante de 35 lugares que pratica uma cozinha moderna, calcada em influência oriental e focada no produto, que faria do jovem manauense uma potência brasileira no além-mar. 

O OAK Gent rendeu a Marcelo o prêmio Gault&Millau de melhor jovem chef da Bélgica já em 2015, ele também entrou para a lista 50 Best Discovery (do The World´s 50 Best Restaurants) e ficou entre os recomendados da lista Europe Top100+ da OAD (Opinionated About Dining). Além disso, recebeu sua primeira estrela Michelin em 2017. Marcelo ainda vê tudo isso com os olhos do menino que saiu do Amazonas para o mundo. “É um sonho realizado e um orgulho muito grande ter conseguido essa estrela. É uma coisa até meio surreal receber esses prêmios fora do Brasil, sendo um estrangeiro”, reflete.

O OAK é um restaurante pequeno que tem uma vibe bem caseira, na verdade. “O que tento proporcionar no restaurante e na comida que eu faço é que os clientes tenham um ‘good time’” - experiência estendida também ao seu segundo endereço belga, o Door73, que acaba de ser premiado como gastrobistrô do ano pelo Gault&Millau. “A gente têm essa ideia de priorizar o produto, não faz muita intervenção, quer que ele fique o mais intacto possível. É uma cozinha simplificada, por assim dizer, mas que tem um trabalho muito grande de estudo e várias provas antes de ter o produto final que vai para a mesa do cliente. A ideia é proporcionar essa simplicidade, mas com um olhar aprofundado sobre o alimento”, explica o chef.

O cardápio tem forte influência japonesa, fruto da proximidade de Marcelo com a cozinha nipônica por ter vários tios do Japão, mas também traz elementos de uma Itália profunda e do Brasil que o chef carrega no peito. “Esse ano foi a primeira vez em que consegui trazer algumas coisas, como tucupi e cupuaçu. Não somos um restaurante de cozinha brasileira, mas aqui e ali a gente tem algumas representações da cozinha manauara e do Brasil todo”, ele conta. É também desse resgate de origens que brotam releituras de receitas antigas da avó italiana e dos próprios pais, que ele costura em harmonia ao cardápio moderno. “A gente tenta passar um pouco dessa nostalgia que acaba despertando as emoções dos clientes de um jeito diferente”, diz. “Os clientes aqui na Bélgica estão buscando mais esse tipo de experiência, uma coisa menos complicada e enrustida.”

Mais um guerreiro que sobreviveu ao abre-e-fecha dos restaurantes na pandemia, Marcelo fala que quer muita saúde e trabalho para continuar a escrever essa trajetória em 2022. “Receber uma estrela fora do Brasil é o começo de uma história. Espero que as pessoas não baqueiem com o coronavírus e que puxem essa angústia que a gente tem para uma energia positiva. Na vida é só o que eu quero: muito trabalho e boa comida”, sentencia.

Rafa Gomes (Foto: Divulgação / Victor Afarro)

Rafa Gomes (Foto: Divulgação / Victor Afarro)

Atravessando a fronteira, outro país que recebeu de braços abertos um talento promissor da cozinha brasileira é a França. O niteroiense Rafa Gomes enriqueceu sua experiência internacional passando pelo Alasca e vários países da Ásia, América Latina e Europa antes de se tornar o chef executivo do estrelado Grand Coeur, de Mauro Colagreco, em Paris. Em 2018, abriu seu primeiro restaurante, o Itacoa, no 2º arrondissement da capital francesa. A casa recebeu o Bib Gourmand França do guia Michelin com apenas 8 meses de funcionamento. 

Criado com base nas experiências e viagens do chef pelo globo, o cardápio explora uma gama intensa de sabores. “Vejo que essa é a melhor maneira de realmente trazer minha personalidade para os meus pratos, com essa mistura de tudo que eu já experimentei e cozinhei por aí”, diz. E é claro que o Brasil está pontuado nessa fina teia de aromas. “Um dos meus pratos assinatura é um mil folhas de pupunha com camarão e bottarga de Itajaí. Ingredientes brasileiros, no geral, são muito ricos e me inspiram muito. A gente precisa valorizar mais o que vem da nossa terra.”

No Itacoa parisiense, que possui duas filiais no Rio de Janeiro, ele fala que prioriza os ingredientes de qualidade, de pequenos e médios produtores. “Tenho um respeito e admiração enormes por quem trabalha respeitando os ciclos e sazonalidade dos produtos e que faz isso por amor. Acho que isso se reflete no que eu entrego aos meus clientes no Itaoca: comida boa feita com cuidado, respeito e amor”, ele observa.

Foi também esse amor pelo produto - só que aqui especificamente pela carne suína - que fez com que Rafa aceitasse o convite do Grupo BFW para montar o fast casual Porquinho, que está se espalhando por shoppings do Rio. “Achei importante participar desse projeto porque a carne suína sempre sofreu muito preconceito, seja pela fama de ser uma carne suja ou por ser muito gordurosa. Estou muito feliz de poder fazer parte do grupo de chefs que valorizam essa proteína tão rica”, ele comemora, também deixando pra gente uma mensagem de força. “Nós nascemos para sermos desafiados e cada desafio que vencemos nos deixa mais fortes. Não dizem que depois de uma tempestade o sol sempre volta a brilhar? Vamos acreditar e ter confiança que 2022 vem para nos surpreender positivamente. Não deixem que suas desculpas matem os seus sonhos.”

Quando a gente fala que o Brasil precisa de bons exemplos, é sobre isso. É sobre gente que, aqui e mundo afora, mostra na prática que somos um povo resiliente, criativo, inovador; um povo que valoriza a educação de qualidade - e tem o direito de ter acesso a ela -, que quer alçar voos mais altos, que clama por melhores horizontes; um povo que sabe de onde vem e abraça suas origens com cuidado, amor e respeito. E é com esses dois grandes exemplos de talento e garra que nossa gastronomia lançou ao mundo que eu fecho 2021: acreditando que, sim, como disse Nelson Cavaquinho, “o sol há de brilhar mais uma vez - e a luz há de chegar aos corações”. Um 2022 de muita paz, saúde, alegrias, empatia e bom senso para todos nós! 

Serviço

OAK Gent (@oak_gent)
Hoogstraat 167/001
9000 Gent - Bélgica 

Door73 (@door73_gent)
Hoogstraat 73
9000 Gent - Bélgica

Itacoa Paris (@itacoa_paris)
185 rue Saint Denis, 75002 - Paris - França

Itacoa Rio (@itacoa_rio)
Village Mall
Av das Américas, 3900 - Barra da Tijuca - Rio de Janeiro

Porquinho (@sigaoporquinho)
Norte Shopping
Av. Dom Hélder Câmara, 5474 - Rio de Janeiro
Park Jacarepaguá
Estrada do Jacarepaguá, 6069 - Rio de Janeiro