• Fernanda Simon
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Fernanda Simon usa capa de resíduos de náilon e colar feito de sobras de acrílico Lucius Vilar. Camisa e calça de linho orgânico sem tingimento Flavia Aranha e camiseta de algodão Superfluous. Tênis Vert Shoes (Foto: Gil Inoue)

(Foto: Gil Inoue)

Estamos vivendo uma emergência climática. Isso significa que se durante a próxima década não houver uma mudança radical em como habitamos este planeta, podemos enfrentar catástrofes seríssimas e até deixarmos de existir. Segundo especialistas em biodiversidade da Plataforma Intergovernamental de Política Científica sobre Serviços de Biodiversidade e Ecossistemas da ONU (IPBES), 75% do meio ambiente terrestre já foi degradado e 66% do marinho também. Perante essa triste realidade, a moda se apresenta como um importante agente de transformação, tanto no âmbito lúdico, como representação cultural e expressão, mas também como produto, consequência de uma longa e complexa cadeia de valor.

Para falar sobre revolucionar a moda, é preciso olhar para alternativas, e um dos conceitos que se apresenta com mais força, é o do desenvolvimento sustentável,  que satisfaz as necessidades presentes, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias necessidades.

O primeiro passo para trazer a sustentabilidade para a moda, é ter a clareza de que por trás das roupas existem pessoas. De acordo com a ABIT, o Brasil é o quarto maior produtor de roupas do mundo, gerando 8 milhões de empregos diretos e indiretos, sendo 75% da mão de obra composta por mulheres. Mesmo representando uma expressiva força geradora de empregos, o setor ainda não garante direitos fundamentais aos trabalhadores, muitos ainda trabalham informalmente e alguns até em situação de trabalho análogo à escravidão. A pandemia reforçou a situação de vulnerabilidade dos trabalhadores e suas condições tornaram-se mais precárias e fragmentadas.

No viés ambiental, a indústria da moda impacta a biodiversidade, o solo, a água e o ar, desde a produção da matéria-prima, passando pelos processos de beneficiamento até ao pós-uso — o momento em que as roupas são descartadas. Segundo o relatório Fashion on Climate, do Global Fashion Agenda com a McKinsey and Company, de 2018, cerca de 2,1 bilhões de toneladas de gases de efeito estufa foram emitidas pela indústria, o equivalente a 4% das emissões globais.

De acordo com o Atlas do Plástico, entre 1950 e 2017, um total de 9,2 bilhões de toneladas de plástico foram produzidas, representando mais de uma tonelada por cada pessoa que vive hoje no planeta. Na moda, os plásticos estão presentes principalmente no poliéster, a fibra mais utilizada no mundo.

Em vista de alcançar justiça social e bem estar para todos, uma abordagem sistêmica é primordial: e este é um dos motes da Semana Fashion Revolution, campanha realizada anualmente em torno do dia 24 de abril para relembrar o desastre do Rana Plaza, edifício que abrigava confecções de roupas em Bangladesh, e que por falta de segurança, desabou em 2013, matando mais de mil trabalhadores. O acidente, que motivou o surgimento do movimento global Fashion Revolution, o qual represento no Brasil, propõe o questionamento #QuemFezMinhasRoupas e #DoQueSãoFeitasMinhasRoupas para incentivar um processo de investigação e descobertas sobre as relações entre moda, pessoas e natureza.

Como o Fashion Revolution, existem outras iniciativas que propõem mobilização e sensibilização em torno das roupas, mas é necessário que a mudança ocorra em todas as esferas, do individual ao coletivo. Exercer pressão pública, exigir transparência e responsabilidade das marcas e agir como um cidadão ético são alguns caminhos.

A moda, que também é arte, sabe como se transformar e vem buscando alternativas, tanto tecnológicas, como ancestrais para se alinhar à realidade atual. Hoje, estar na moda não significa mais usar uma determinada cor ou um modelo, mas usar o que tenha boas histórias, que fez bem para quem costurou, para quem usa e para o planeta. Roupas que fazem parte da construção de um mundo melhor e que carregam esperança.