• Clementine Prendergast
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Spring/Summer 2015 (Foto: Divulgação/ Oliver Hadlee Pearch Art Partner)

 (Foto: Divulgação/ Oliver Hadlee Pearch Art Partner)

Durante séculos, em países não ocidentais, como Índia e China, a astrologia desempenhou um papel importante em informar como as pessoas pensam sobre o lugar delas no mundo. No entanto, ela recentemente ganhou maior força no ocidente, à medida que as pessoas recorrem cada vez mais à orientação das estrelas em redes sociais. De aplicativos de horóscopo diário passando por memes e astrólogos influencers e até artigos sobre como se vestir ou praticar o autocuidado de acordo com o seu signo, a astrologia entrou de vez no mainstream, permeando quase todas as facetas da cultura popular.

Astrologia na era do Instagram

A astrologia pode ser entendida como o estudo de objetos celestes e seus movimentos. Ela é utilizada como uma forma de adivinhar informações sobre assuntos humanos e eventos mundiais. “Ela nos ajuda a juntar padrões históricos para explicar os eventos mundiais ao nosso redor agora”, diz a popular astróloga, DJ e leitora de tarô Marissa Malik, que representa uma nova onda de astrólogos influenciadores capturando as mentes da geração Z. “Ela também pode proporcionar insights hiper-individualizados sobre nossas vidas pessoais que ajudam a confirmar os caminhos que estamos trilhando. ”

A rede social está tornando a astrologia mais acessível, abrindo-a para um público mais jovem. As contas de meme populares @NotAllGeminis, @Trashbag_Astrology e @TheZodiacsTea oferecem uma visão aprofundada sobre o comportamento humano, por meio de pequenos conteúdos espirituosos - reproduzindo estereótipos de signos e abordando temas familiares ​​como namoro, equilíbrio entre trabalho e vida pessoal e mudanças de humor.

Agora há uma grande variedade de aplicativos de astrologia no mercado - da Co-Star e Sanctuary com IA até a astróloga favorita da moda, Susan Miller, e seu site Astrology Zone - levando horóscopos personalizados e leituras ao vivo de mapas astrais até a palma da sua mão. Lançado em 2019, o Sanctuary foi criado para aqueles que buscam maior autoconhecimento. “A astrologia é um sistema complexo baseado em matemática, mas o mais importante, é uma história sobre você”, disse o fundador e CEO do Sanctuary, Ross Clark, à Vogue. “Queríamos construir uma maneira imediata e moderna para as pessoas que buscam respostas a fim de se conectar com nosso conteúdo e leitores.”

Clark explica que a Sanctuary recebe muitas perguntas sobre amor, relacionamentos e trabalho. Mas em 2020, a demanda por leituras ao vivo explodiu com muitos buscando clareza enquanto a pandemia se espalhava pelo mundo. “Em um ano em que houve tanta incerteza, vimos pessoas recorrendo ao misticismo em busca de orientação séria, um pouco de leviandade e tudo mais”, acrescenta.

Em busca de um poder superior

A astrologia tem percorrido um longo caminho desde 1930, quando a primeira coluna de horóscopo apareceu no Sunday Express da Grã-Bretanha. Mas nosso principal interesse por ela hoje é praticamente o mesmo. A coluna foi encomendada após a quebra do mercado de ações, quando as pessoas estavam perdidas, com medo e procurando orientação. Avançamos para 2021 e, como resultado da pandemia, as pessoas estão se esforçando tanto quanto para encontrar respostas.
“O aumento do interesse pela astrologia ocorre em um momento de instabilidade social mais intensa”, explica a antropóloga religiosa, Dra. Susannah Crockford, da Universidade de Ghent, na Bélgica. Nessas ocasiões, é da natureza humana recorrer a um poder superior em busca de ajuda. Mas com a crescente apatia religiosa criando um vazio no Ocidente, os jovens estão cada vez mais em busca de sistemas alternativos de crenças.

“Estamos monitorando a espiritualidade da nova era nos últimos cinco anos - ela surgiu como um antídoto para a ansiedade - um subproduto inicial do aumento do autocuidado e do bem-estar”, disse Sarah Owen, estrategista sênior de percepção da empresa que prevê comportamentos do consumidor, a WGSN. Owen explica que, ao longo dos anos, o aumento do interesse na astrologia e tarô ou numerologia muitas vezes coincide com períodos desafiadores.

Isso foi verdade em 2016, quando o interesse pela astrologia cresceu durante a era "pós-verdade", à medida que nossa capacidade de discernir fato e ficção levou muitos a buscar orientação espiritual. Em 2018, a astrologia atingiu o ponto crítico com 37 por cento de mulheres e 20 por cento de homens americanos acreditando em previsões.

Talvez faça sentido então que hoje, após os eventos sem precedentes dos últimos 12 meses, a astrologia ofereça a muitos jovens uma explicação destes dias estranhos. “[Previsões astrológicas] podem ser muito atraentes para um público cativo que está ansiosamente passando muito tempo online, sozinho, pensando em si mesmo e no que está acontecendo no mundo,” diz a Dra. Crockford.

A pseudociência versus seguir a ciência

E, no entanto, o apelo atual das mensagens abstratas da astrologia parece um tanto paradoxal. Em um momento em que cada vez mais nos dizem para ‘seguir a ciência’ e ignorar as fake news, por que estamos tão ansiosos para aceitar algo que, no final do dia, é quase totalmente arbitrário?

A Dra. Karen Correia da Silva, cientista social da agência de estratégia cultural Flamingo, sugere que a pandemia causou um período de “incerteza causal”, um estado psicológico em que as pessoas estão tentando entender por que grandes eventos globais, como pandemias, desastres naturais e convulsões políticas estão acontecendo.

Durante períodos como este, as pessoas buscam informações para dar sentido a esses eventos, muitas vezes encontrando alívio em mensagens abstratas e ideias grandes, embora não quantificáveis, sobre fé, amor e o futuro, em vez de fatos científicos frios.

A dra. Correia da Silva argumenta que “com estrutura suficiente para ser considerado um sistema de conhecimento, mas abstração maleável o suficiente a fim de permitir que as pessoas imaginem e apliquem suas ideias na sua própria realidade”, o apelo pela astrologia pode não ser tão irracional quanto parece.

Isso é algo que o filósofo alemão Theodor W Adorno observou em seu livro de 1953, As Estrelas descem à Terra. Ao apresentar a visão astrológica "em termos empíricos, em vez de sobrenaturais" - com mapas astrais, tabelas e determinações precisas do movimento planetário - Adorno argumentou que a astrologia ganhou nova vida como um "fato aparente".

Como qualquer sistema de crenças, a astrologia só se torna problemática quando é levada ao extremo ou se torna uma forma de dogmatismo. Mas, em seu formato de meme atual e iteração no smartphone, a astrologia pode ser um exercício divertido de introspecção e análise - um ponto de conversa interessante para esses dias de lockdown, mas, como também observa a Dra. Crockford, “um dos trabalhos [formas de aprendizagem] epistemológicos mais importantes exigidos de indivíduos.”

Afinal, em uma sociedade cada vez mais individualista que promove o autocuidado, a autoajuda e a autoconsciência, o autoconhecimento é indiscutivelmente a moeda social mais importante que temos hoje.

Além do autoconhecimento, a astrologia também pode nos ajudar a lembrar como a vida é vasta e expansiva e como estamos conectados uns aos outros, dando-nos uma perspectiva crítica de nossas vidas durante esses tempos desafiadores. Como diz Malik, "Ela nos ensina que somos todos feitos dos mesmos elementos e podemos nos relacionar uns com os outros por meio deles, ao mesmo tempo que somos incompreensivelmente únicos."