Tesouro Direto

Por Cris Almeida, Valor Investe — Rio


A receita para movimentar o mercado de títulos do Tesouro Direto teve todos os ingredientes possíveis à disposição nos últimos dias: mudança da meta fiscal, queda ainda mais cautelosa da Selic e Banco Central (BC) dividido no Brasil, mais inflação persistente, mercado de trabalho forte e adiamento do início do ciclo de corte dos juros nos Estados Unidos. Como resultado, os retornos oferecidos por esses papéis dispararam, voltando para níveis de um ano atrás.

Esse avanço das taxas ganhou novos contornos na semana passada, após o Comitê de Política Monetária (Copom), do BC, decidir desacelerar o corte da taxa básica de juros de 0,5 ponto percentual para 0,25 ponto, levando a Selic para 10,5% ao ano atualmente. Mas não foi exatamente a magnitude da redução que preocupou os agentes.

Não passou despercebido pelo mercado o racha entre os integrantes do comitê na última reunião. A ala de novos diretores indicados pelo governo Lula votou a favor de manter o corte em 0,5 ponto percentual, como foi prometido na ata anterior. A leitura do mercado foi de que a autoridade pode ser mais sensível a pressões políticas nos próximos anos, já que o principal nome para assumir a presidência do BC em 2025, Gabriel Galípolo, encabeçou o voto a favor de um corte maior.

Os integrantes remanescentes, que formaram maioria juntamente com o presidente atual do BC, Roberto Campos Neto, quem deu o voto de minerva, decidiram pisar no freio e cortar 0,25 ponto percentual dessa vez. O que já era esperado entre os investidores que “juntaram as pecinhas” diante das declarações mais duras e menos otimistas de Campos Neto dias antes do Copom.

A percepção de juros altos por mais tempo e a ideia de um Banco Central que dê ouvidos à política a partir de 2025 foram o suficiente para que papéis pós e prefixados disparassem na sessão seguinte à reunião, chegando a oferecer retornos considerados atrativos por analistas do mercado. Para se ter uma ideia do que isso quer dizer em termos práticos, o título Tesouro IPCA+ com prazo em 2035 chegou a oferecer a inflação do período mais um retorno acima dos 6,30%, taxa vista pela última vez apenas em março do ano passado. Entre os Tesouro Prefixados, os juros se aproximavam dos 12% ao ano, nada mal, considerando, inclusive, uma Selic agora de 10,5% ao ano.

A notícia é boa para quem estava aguardando uma oportunidade de comprar títulos públicos a retornos atrativos. Mas para quem já tinha esses títulos a taxas menores, foram dias de “perdas” — em caso de retirada antes do prazo contratado.

Isto porque as taxas e preços dos títulos são inversamente proporcionais. O que significa dizer que, tanto nos papéis prefixados quanto naqueles indexados ao IPCA, quanto maior a taxa, menor o preço e vice e versa. Quando as taxas sobem, portanto, apesar de ser interessante para quem vai investir — já que assegura rentabilidade maior se mantiver a aplicação até o vencimento, o valor de mercado dos papéis diminui, o que implica em perda temporária para quem já possui os títulos na carteira.

Vale a lembrança que a alteração na meta fiscal de 2025, anunciada pelo Ministério da Fazenda no mês passado, trocando um superávit por déficit zero, também ajuda a contar essa história da disparada dos títulos do Tesouro, que nada mais são do que títulos públicos federais vendidos aos investidores pessoas físicas. O anúncio abriu margem para a interpretação de que a responsabilidade com as contas públicas não é tão sólida quanto o mercado espera. Essa imagem de “gastador” que o governo passa faz com que os investidores percam a confiança no Brasil e vejam risco de calote no horizonte, o que acaba se refletindo (para cima) nas taxas que o Tesouro Nacional precisa oferecer para atrair novos poupadores.

Aqui tá bom, mas lá fora também

Com os rumos da economia brasileira incertos e o juro nos Estados Unidos sem previsão de cortes no horizonte, os títulos públicos americanos ficaram mais atrativos também. E se a economia mais segura e estável do mundo tem renda fixa pagando bem, os investidores não pensam duas vezes antes de retirar capital alocado em países emergentes como o Brasil.

Esse cenário externo também deu o pontapé inicial na disparada dos títulos públicos por aqui, ainda no início do mês passado, uma vez que o Tesouro Nacional precisa tornar as taxas mais interessantes, no intuito de equilibrar os saques.

Enquanto os Estados Unidos enfrentam inflação persistente e mercado de trabalho forte, o que demonstra uma economia ainda aquecida, há mais certezas de que a queda dos juros americanos deve ser evitada por mais tempo do que o esperado — ou nem acontecer em 2024.

Declarações de dirigentes do Federal Reserve (o Fed, banco central americano) no final da semana passada deram mais sinais de que os juros por lá devem continuar no mesmo intervalo, e que uma nova alta não está descartada, embora o próprio presidente, Jerome Powell, tenha praticamente anulado essa possibilidade na última reunião.

Fato é que todos os sinais apontam para uma autoridade monetária mais cautelosa. Para analistas, não basta apenas um dado fraco para que o Fed comece a cortar as taxas: serão necessárias mais leituras para verificar se esse cenário é sustentável.

Onde investir nesse cenário?

Apesar dos contras no Brasil e nos Estados Unidos, os especialistas em renda fixa ainda veem espaço para lucro. “O impacto dessa decisão do Copom [de reduzir a intensidade da queda da Selic] para os ativos de renda fixa brasileiros, no âmbito de alocação entre os três tipos de remuneração (títulos pós-fixados, prefixados e indexados à inflação), nos faz entender que, apesar do ciclo de queda, o patamar atual da taxa Selic ainda proporciona uma boa relação risco x retorno para os pós-fixados, já que não sofrem com a marcação a mercado e são positivamente impactados pelo alto nível da taxa básica de juros, que se mantém acima de dois dígitos”, explica o especialista em Renda Fixa da Suno Research, Vinicius Romano.

A “marcação a mercado” citada pelo analista nada mais é que os títulos oscilarem para cima ou para baixo junto com os preços com os quais estão sendo negociados naquele momento no mercado. No entanto, essa oscilação só atinge quem resgata o investimento antes do fim do prazo combinado com o governo. Se levar o título até o seu vencimento, o retorno acordado na hora da compra está garantido.

Juros de títulos de longo prazo voltaram a se aproximar dos 12% no último mês — Foto: Tesouro Direto
Juros de títulos de longo prazo voltaram a se aproximar dos 12% no último mês — Foto: Tesouro Direto

“No caso dos papéis indexados à inflação (chamados de Tesouro IPCA+), os títulos com vencimentos no médio e longo prazo ainda são interessantes aos investidores, com um juro real [descontado a inflação] próximo de 6,15% ao ano sem grandes riscos. Já para os prefixados, a nossa visão é de que ainda existem boas opções, mas com prazo um pouco mais curto, de, aproximadamente, três anos”, diz Romano.

Nos últimos 30 dias, taxas dispararam influenciado pelo fiscal no Brasil e exterior — Foto: Tesouro Direto
Nos últimos 30 dias, taxas dispararam influenciado pelo fiscal no Brasil e exterior — Foto: Tesouro Direto

A recomendação unânime entre especialistas é de manter a carteira diversificada, o que melhor protege o investidor de todos os cenários. Justamente nestes momentos de queda nos juros, ainda que mais lenta, que a volatilidade acaba sendo positiva para quem entrou em taxas mais altas dos Tesouros Prefixado e IPCA. O ponto de atenção nestes momentos é a oscilação das taxas.

O Tesouro Selic ajuda a controlar a volatilidade da carteira e é amplamente indicado para a reserva de emergência, enquanto os papéis atrelados à inflação protegem do aumento de preços e garantem o poder de compra do investidor. Por fim, os prefixados não trazem surpresas quanto ao retorno.

 — Foto: GettyImages
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