Fio da Meada
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Por Edison Fernandes

Doutor em Direito pela PUC-SP, professor da FGV Direito SP, titular da Academia Paulista de Letras Jurídicas

São Paulo


Assunto que mobilizou muita gente, desde “influenciers” das diversas redes sociais até a primeira-dama: a importação de produtos, especialmente chineses, diretamente pelos consumidores através de plataformas digitais (marketplaces). Devido a diversas formas de fraude à legislação brasileira, a posição inicial do Ministério da Fazenda foi extinguir a isenção tributária (Imposto sobre Importação) das transações entre pessoas físicas limitadas a US$ 50. As manifestações contra a medida, à época, foram bastante barulhentas e o governo foi acusado de prejudicar o consumo da população brasileira. “Sensibilizado”, o Ministério da Fazenda recuou.

Em momento seguinte, a pasta elaborou um plano para regularizar as compras internacionais realizadas através dos portais eletrônicos: criou-se o Programa Remessa Conforme. As empresas estrangeiras que aderirem a esse programa terão os trâmites de importação facilitados e deverão já incluir o ICMS nos preços dos produtos a serem remetidos ao Brasil.

Só esta primeira medida já contraria a “transparência fiscal” tanto repetida nos trâmites e no texto da reforma tributária (PEC 45). Não será fácil o consumidor identificar o que é preço do produto e o que é imposto incidente sobre a operação.

O pior do Programa Remessa Conforme, no entanto, é outra medida adotada. Para tentar explicá-la, peço a licença da leitora e do leitor para uma pequena digressão.

Anteriormente, eram isentas do imposto sobre importação as remessas sem caráter comercial, ou seja, feitas de pessoa física para pessoa física, limitada ao valor de US$ 50.

Uma das fraudes verificadas no comércio eletrônico internacional foi justamente a informação inverídica com relação ao remetente do produto: apesar de o consumidor brasileiro adquirir a mercadoria através de uma empresa de comércio eletrônico, constava a informação de a remessa ter sido efetuada por pessoa física domiciliada no exterior.

Pois bem, para combater essa fraude de identificação do remetente (além de outras verificadas nessas transações internacionais), o Ministério da Fazenda, no âmbito do Programa Remessa Conforme, manteve a isenção do imposto sobre importação para as compras de produtos de até US$ 50, mas (surpresa!) extinguiu a exigência de que as transações fossem sem intuito comercial.

Isso mesmo: as empresas – empresas que desenvolvem atividade comercial com finalidade lucrativa e sediadas no exterior – que aderirem ao Programa Remessa Conforme não terão suas vendas sujeitas ao imposto sobre importação, nas operações de valor até US$ 50. Sem dúvida, há um incentivo ao consumo dos produtos de origem estrangeira, em detrimento ao mercado interno.

Utilizando uma média arredondada da taxa de câmbio atual (US$ 1 = R$ 5), estamos falando de produtos de até R$ 250, o que não é preço simbólico ou irrisório. Até esse valor, a competição entre os produtos nacionais e os produtos estrangeiros ficou desleal: a favor dos produtos estrangeiros.

Além disso, prejudicam-se as empresas locais que revendem produtos importados, como as varejistas e os marketplaces brasileiros. Quando uma varejista brasileira importa produtos com valor inferior a US$ 50, elas estão sujeitas não só ao imposto sobre importação, mas todos os tributos federais incidentes (IPI, Pis e Cofins). Essa situação privilegia as empresas estrangeira e compromete a riqueza e a produção nacional, além do emprego no Brasil.

Medidas econômicas, dentre elas as tributárias, nem sempre possuem uma racionalidade evidente, bem como são influenciadas pelas pressões sociais e pela “necessidade” de o governo manter índices de popularidade aceitáveis.

No caso do Programa Remessa Conforme, com o objetivo de combater as fraudes nas compras eletrônicas internacionais, o Ministério da Fazenda liberou todas essas compras, prejudicando a concorrência das empresas locais. Sinceramente, não entendi a lógica dessa medida (ou talvez tenha entendido, mas não queira acreditar).

Remessa Conforme: consumo ou emprego? — Foto: Pixabay
Remessa Conforme: consumo ou emprego? — Foto: Pixabay
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