Além de ambiental, a agenda net zero também é uma agenda econômica e o Brasil tem em mãos uma oportunidade de ouro em relação ao mercado de carbono. O país possui capacidade para atender até 48,7% da demanda global por concentrar 15% do potencial mundial de captura de carbono por meios naturais, revela um estudo realizado pela McKinsey.
Entretanto, ainda é preciso alavancar oportunidades. Nesse contexto, a parceria entre a bolsa do Brasil (B3) e a ACX Group, anunciada no final do ano passado, se apresenta como um movimento estratégico para o desenvolvimento sustentável e a evolução de um mercado de carbono conectado ao ambiente de negociação internacional.
Aliando a expertise e a tecnologia de ponta da ACX no mercado de crédito de carbono global com a posição influente da B3 no mercado financeiro e de capitais no Brasil, ainda no primeiro semestre desse ano deverá entrar em funcionamento a plataforma para negociação de créditos de carbono, buscando aproximar os vendedores desses créditos e as empresas que buscam compensar as suas emissões no mercado voluntário.
“Haverá a vinculação dos mercados globais dentro da nossa arquitetura: assim que fizermos o lançamento no Brasil, automaticamente haverá conexão com os outros mercados onde atuamos”, comenta William Pazos, co-fundador e co-CEO da ACX.
A ACX é uma exchange global com sede em Abu Dhabi e tem conexões com mais de 200 instituições em 31 países, de modo que os players brasileiros estarão conectados com os principais nomes internacionais em um ambiente com uma liquidez mundial. “Além da vantagem do funcionamento já no primeiro dia, temos ainda conexões com todos os standards globais, conseguindo operar dentro do mercado internacional rapidamente e de uma maneira bem eficiente”, completa Pazos. A conexão da ACX é um diferencial para esse mercado e agrega maior segurança para a negociação dos créditos de carbono na plataforma.
Vale lembrar que a empresa foi responsável pela operacionalização da negociação de créditos de carbono da Tembici promovida pela prefeitura do Rio de Janeiro em 2022.
De forma complementar, a B3 já conta com um ambiente de registro de crédito de carbono próprio, lançado em 2023, nos mesmos moldes que oferece para outros produtos do mercado financeiro de capitais, com intuito de promover maior controle da titularidade dos créditos.
Nesse sentido, o objetivo da parceria também é integrar a plataforma de negociação da ACX com a plataforma de registro da B3, de modo que a automatização desses ambientes se dará ao longo de 2024. “Atualmente, o registro em um ambiente regulado como o da B3 já é um requisito para fundos de investimento financeiro que optem por incluir créditos de carbono em seu portfólio. Acreditamos também que essa construção poderá ser usada futuramente para viabilizar o mercado regulado”, afirma o superintendente de Produtos Balcão da B3, Leonardo Paulino Betanho.
O executivo ressalta que o papel da bolsa é atuar como infraestrutura de mercado, prestando serviço de natureza informacional. A verificação da existência, integridade e titularidade dos créditos continua sob responsabilidade das certificadoras e dos vendedores.
Por dentro da Bolsa de Crédito de Carbono
Betanho ressalta que o cenário para o mercado de carbono no Brasil ainda é bastante complexo, com desafios na originação dos créditos e na regulação, por exemplo – mas que a as iniciativas da B3 e da ACX buscam resolver um problema de infraestrutura que deve facilitar o fluxo entre a oferta e a demanda. “Esse é um movimento para tentar promover maior centralidade da estratégia brasileira e, com isso, facilitar a operacionalização do mercado de carbono como um todo”, defende.
De forma geral, a plataforma de negociação deverá contar com três funcionalidades principais: leilões, negociações spot e um mecanismo que oferece a possibilidade de venda futura de crédito de carbono lastreado na emissão.
Esse mecanismo, por exemplo, permite que créditos futuros possam ser vendidos hoje para financiar projetos. “Atualmente, as operações tendem a ter custos financeiros (“ágio”) altíssimos. Esse ágio representa um custo desnecessário que poderia ser utilizado para financiamento no mercado de carbono”, afirma Pazos.
O CEO da ACX reforça a contribuição da plataforma para a precificação. “Ainda não há uma visibilidade clara do preço do crédito de carbono brasileiro porque todas as negociações são bilaterais. Dentro de um âmbito independente, queremos dar ao mercado um sinal de valor em que se possa confiar e, com isso, ajudar a desembaçar todos os benefícios do mercado financeiro de alavancagem”, diz.
A plataforma opera no mercado voluntário, tendo em vista que o Brasil ainda não possui um mercado regulado atualmente. Entretanto, Pazos acredita que a divisão entre esses mercados tende a desaparecer ao longo do tempo. “Em Cingapura, por exemplo, há um imposto de carbono que pode ser pago com créditos que hoje são chamados voluntários. Mas, uma vez que o crédito seja utilizado para pagar um imposto, na minha opinião, ele não é mais voluntário. Vários países estão organizando mercados similares. E o Brasil será um grande exportador desses créditos”, aponta.
O país tem um potencial imenso para protagonizar a agenda global no combate às mudanças climáticas e iniciativas como essas geram um impacto sistêmico positivo. “Acredito que quando tivermos toda a funcionalidade prevista com o menu de serviços operacional, o Brasil, que já é por natureza um país com bastante visibilidade no tema mudanças climáticas, vai ganhar ainda mais destaque globalmente”, enfatiza Carlos de Mathias Martins, fundador da BlockC, parceira da ACX.