Lembrado por filmes como 'Rocky, um Lutador' (1976), 'Rambo - Programado para Matar' (1982) e 'Os Mercenários' (2010), Sylvester Stallone se consagrou como um dos maiores astros de ação em Hollywood. Após o ator e cineasta ter passado mais de 50 anos vivendo a figura do "homem durão" repetidamente no cinema, não há mais como dissociá-lo dessa imagem.
Ser "brucutu", em certo sentido, é sua grande força.
Mas embora os personagens mais famosos de Sly sejam símbolos de ousadia e intrepidez, há quem ache que o astro é um covarde em seu trabalho. Pelo menos essa é a opinião de Quentin Tarantino, diretor dos sucessos 'Pulp Fiction - Tempo de Violência' (1994), 'Kill Bill: Volume 1' (2003) e 'Os Oito Odiados' (2015). O motivo? As decisões que Stallone tomou com um personagem especificamente - Rambo.
Como o livro que inspirou 'Rambo' é diferente do filme
'Rambo - Programado para Matar' é baseado no romance 'First Blood', publicado pelo canadense David Morrell em 1972. A história segue um veterano da Guerra do Vietnã (1955-1975) que, após uma série de eventos brutais, acaba travando uma guerra sozinho contra a polícia estadual no Kentucky, nos Estados Unidos.
A adaptação para o cinema mudou alguns pontos do livro; no longa, por exemplo, o protagonista passou a se chamar "John Rambo", enquanto Morrell havia preferido esconder o primeiro nome do personagem em sua obra. No entanto, a alteração mais significativa – e que mais incomodou Tarantino – está no final do filme: enquanto o livro termina com a morte de Rambo, o longa de Sly manteve o protagonista vivo. Tanto que ele volta em outras quatro sequências no cinema: 'Rambo II: A Missão' (1985), 'Rambo III' (1988), 'Rambo IV' (2008) e 'Rambo: Até o Fim' (2019).
![Sylvester Stallone estrelou Rambo - Programado para Matar (1982) — Foto: Divulgação](https://cdn.statically.io/img/s2-monet.glbimg.com/KMw-J92bJBxZ0LDqLo0lPSKTPRE=/0x0:1280x853/984x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_e7c91519bbbb4fadb4e509085746275d/internal_photos/bs/2024/G/Q/GxPwYrQBiFFArGOuBBeA/firstblood-sylvester-stallone.webp)
Tarantino afirmou no podcast 'The Big Picture', em 2021, que adoraria ver um filme mais fiel à obra de Morrell." Se eu só quisesse fazer um bom filme, que eu soubesse que seria bom, eu pegaria o romance de David Morrell, 'First Blood', e faria a adaptação literal. Não o filme que foi feito com base em 'First Blood' [com Stallone em 1982]. Eu faria o romance", frisou, acrescentando que acha os diálogos do livro tão bons que, quando relê a obra, tem vontade de fazer isso "em voz alta".
Mas nem adianta criar expectativas para ver um novo Rambo nas telonas: as chances do cineasta de 'Bastardos Inglórios' (2008) realizar uma nova adaptação do personagem e da história são praticamente nulas. "Agora eu quero fazer mais do que isso", ele afirmou no podcast.
![Quentin Tarantino após receber seu segundo Oscar de Melhor Roteiro Original, dessa vez por Django Livre (2012) — Foto: Getty Images](https://cdn.statically.io/img/s2-monet.glbimg.com/XeJ4Dtu9OTZEAyWaTKgdXJoJcbs=/0x0:600x399/984x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_e7c91519bbbb4fadb4e509085746275d/internal_photos/bs/2023/e/I/oVRJd5TMKf6kNjXvVWhA/tarantino-oscar.webp)
Por que Stallone quis mudar o final de 'Rambo'
Quando Sly recebeu o script de Rambo, o protagonista não sobrevivia no final; segundo o astro, o veterano de guerra era "alvejado pelo Coronel Trautman e morria em câmera lenta".
Incomodado com o destino de seu personagem, Stallone foi conversar com o diretor do longa, Ted Kotcheff, para convencê-lo a mudar o roteiro. Caso contrário, o ator estava disposto a abandonar o filme. "Eu disse ao diretor: 'Isso não é bom.' Eu não queria que todos os veteranos do Vietnã vissem esse filme e pensassem: 'Ah, então não há nenhuma esperança para mim. Nenhuma'", lembrou o astro em seu documentário biográfico, 'Sly,' de 2023.
Pessoas na produção de Rambo teriam gritado com Stallone ao ouvir que o artista poderia deixar o papel. Ele se manteve firme em seu pedido. "Naquela época, estavam perdendo 20 mil veteranos para o suicídio a cada mês. Eu disse: 'Não quero fazer parte disso. Não quero. Eu não vou'."
Em uma entrevista de 2012 à revista canadense 'Maclean's', Sly apresentou esse mesmo argumento, e também lembrou a conversa que teve com Tarantino sobre o destino de Rambo no sucesso dos anos 1980.
"No livro, o Rambo é morto. Eu achava que não era a mensagem adequada. Houve quase 200 mil perdas de veteranos do Vietnã que retornaram da guerra. Eu falei: 'Por que não levamos Rambo até o limite, mas sem aniquilá-lo?'. Quentin Tarantino me disse: 'Você é um covarde, deveria tê-lo matado!'".
![Se não fosse pela insistência de Sylvester Stallone, o final de 'Rambo: Programado para Matar' teria sido completamente diferente — Foto: Divulgação](https://cdn.statically.io/img/s2-monet.glbimg.com/0nGusK78LUuPEgRm2EZ19Y-_I0A=/0x0:3840x2160/984x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_e7c91519bbbb4fadb4e509085746275d/internal_photos/bs/2024/P/3/TZrOFeS7uiJ3zcYs3wiA/djryuxjgyad95ho67t7utdqv8at.jpg)
Stallone não deixou de rebater a crítica do colega cineasta, porém. "Falei: "Quentin, você é um maluco. Eu quero fazer algumas sequências, irmão'", contou.
Mas Sly já se pegou imaginando como teria sido fazer Rambo respeitar o livro que o inspirou. Em conversa com o site Collider, ele admitiu: "Penso nisso o tempo todo. Tive um debate com Quentin Tarantino, que achou que cometi um erro. Eu disse: 'Sabe, em um nível artístico, você provavelmente está certo'. Mas, na época, eu tinha passado muito tempo fazendo pesquisas com veteranos, e parecia um final terrível e niilista, algo que apenas se regozijava no completo desespero".
Sylvester Stallone também defendeu que, ao mudar o final de Rambo, conseguiu passar uma mensagem que poderia ser interessante para o público. "Pensei, eu quero apenas terminar [com o personagem morto]? Ou quero torná-lo mais uma vítima que foi criada para fazer um trabalho, faz o trabalho, volta para casa, e recebe um 'sabe de uma coisa? Você não se encaixa mais'?", refletiu.
"É como treinar um pit bull. Você pega um cachorro e o transforma em um matador. Depois, o que você faz? Você tem que abatê-lo; [porque] e se esse pit bull escapar? Daí você percebe que [o final do filme] não é tão ruim quanto pensava. Você pode redimi-lo de alguma forma. Eu achei que essa era uma história mais interessante. Novamente, como Kirk Douglas diz, 'não é artístico, mas é comercial'."
![Sylvester Stallone — Foto: Getty Images](https://cdn.statically.io/img/s2-monet.glbimg.com/9Cbscze4_cFp3U8eBMlnr7v29TE=/0x0:4500x2942/984x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_e7c91519bbbb4fadb4e509085746275d/internal_photos/bs/2024/e/v/eYkXfuSFmvw2eFQSgk4g/gettyimages-1332078934.jpg)
Na verdade, nem mesmo no último filme da franquia, 'Rambo: Até o Fim', Sly teve coragem de matar o protagonista. No longa, o personagem enfrenta um cartel e termina com várias lesões gravíssimas; mas o roteiro finaliza de forma ambígua, com um John Rambo de aspecto moribundo sentando em uma cadeira de balanço que não para de se mexer.
O astro admitiu em Sly que, originalmente, a cadeira pararia de balançar, indicando a morte do veterano de guerra. Mas ele voltou atrás na pós-produção, e arrumou um jeito de usar CGI para manter o movimento da cadeira.
"Comecei a me arrepender da ideia de que essa seria a forma desse guerreiro ir embora", confessou Stallone, que ainda encerrou seu documentário dizendo: "Eu apenas odeio finais tristes. Atirem em mim".
Confira o trailer de 'Rambo - Programado para Matar' (1982):