• Kellen Rodrigues
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Jullie (Foto: Tharsila de Brito)

Jullie (Foto: Tharsila de Brito)

Às vésperas do centenário de Nelson Gonçalves, completado em junho, a obra do cantor e compositor é exaltada no musical Nelson Gonçalves O Amor e o Tempo, em cartaz em São Paulo. No palco ao lado de Guilherme Logullo está Jullie, um dos nomes mais conhecidos no teatro musical atualmente.

Aos 31 anos, a capixaba que trocou Vila Velha pelo Rio de Janeiro aos 16 anos para se dedicar à arte, hoje direciona sua carreira ao teatro, música e dublagem - ela é a voz brasileira, por exemplo, da princesa Poppy no filme Trolls, cuja voz original é feita pela atriz americana Anna Kendrick. E tem se dedicado a entender e ajudar a difundir o feminismo. "Comecei a me interessar e pequisar mais de dois anos pra cá. Não era uma completa alienada, mas como esse assunto vem sendo mais percebido por mim estou lendo livros para poder me inspirar e mudar coisas em mim, mudar pensamentos, formas de agir, porque a gente está contaminado", diz ela.

A mudança no visual faz parte de sua revolução. Abandonar os cabelos longos, para ela, foi libertador. "Eu já havia cortado o meu cabelo aos 19/20 anos, se não me engano. Mas a minha ideia de 'feminilidade' naquela época não me permitiu que eu me sentisse bonita de cabelo curto", lembra. "Hoje, com outra cabeça, tendo um outro entendimento, amo e me sinto bonita de cabelo curto. E ousada".

Em bate-papo com Marie Claire, Jullie fala sobre o machismo no meio artístico, suas inspirações, e claro, sobre o musical que fica em cartaz no Teatro Gazeta até o final de junho.

Confira o bate-papo!

- Você já se deparou com machismo no teatro musical?
Acho que o machismo está presente na sociedade, em todos os ambientes, inclusive no meio artístico e pode se apresentar de várias maneiras. Sinto que o teatro me abraça como mulher e tive a sorte de trabalhar com muitas pessoas amorosas, mas isso não quer dizer que eu não tenha esbarrado com atitudes machistas da parte de alguns, afinal, fomos criados numa sociedade doente e infelizmente estamos sujeitas a isso, mas na luta pela mudança.

- Como você contribui com essa luta? Em difundir o feminismo...
Eu quero cada vez mais poder usar essa voz pra passar essas mensagens de feminismo, de coisas boas pras pessoas. Eu costumo me posicionar sempre nas redes sociais porque tem pessoas que acompanham o meu trabalho. Eu gosto mesmo de me posicionar, eu exponho, me coloco, é importante para distribuir essa informação para as pessoas. Tenho assistido muitas peças com minhas amigas atrizes e cantoras que estão se movimentando e acho muito bonito ver isso, estou tentando me inspirar nelas pra fazer alguma coisa minha também a respeito disso (feminismo), que seja compor alguma música... Ainda não lancei isso pro mundo, mas estou trabalhando isso em mim.

- Desde quando surgiu essa vontade?
É meio novo pra mim, comecei a me interessar e pequisar mais de dois anos pra cá. Não era uma completa alienada, mas como esse assunto vem sendo mais percebido por mim estou lendo livros para poder me inspirar e mudar coisas em mim, mudar pensamentos, formas de agir, porque a gente está contaminado.

- Quem são suas inspirações?
Ando lendo mais mulheres, como Clarissa Pinkola Estés, Djamila Ribeiro, Márcia Tiburi, Rupi Kaur; que amo ouvir podcasts de mulheres como “Talvez Seja Isso” sobre o livro “Mulheres Que Correm Com Os Lobos” e “Outras Mamas”, o primeiro podcast feminista vegano, que teve como ponto de partida e inspiração o livro “A Política Sexual da Carne”, é tão gostoso de ouvir e tão enriquecedor, me sinto entre amigas. E há dois anos venho frequentando o Giro das Flores, roda de sagrado feminino da Bruna Savaget, que proporciona essa troca amorosa entre mulheres, esse empoderamento, o reconhecimento da  potência feminina e conexão com a nossa Mãe Terra.

- Ter cortado o cabelo curtinho está associado a essas suas novas percepções?
Acho que eu me libertei de muitas coisas. Eu já havia cortado o meu cabelo quase do tamanho que ele está agora, aos 19/20 anos, se não me engano. Mas a minha ideia de “feminilidade” naquela época não me permitiu que eu me sentisse bonita de cabelo curto, tanto que eu sequer tenho fotos do corte. Hoje, com outra cabeça, tendo um outro entendimento, amo e me sinto bonita de cabelo curto. E ousada, fora do padrão estabelecido, do ideal do cabelão - que também é lindo, mas que não deve ser o único. Este movimento de desconstrução já vêm acontecendo, estamos quebrando cada dia mais e reconhecendo a beleza em suas diversas formas, nos diferentes cortes e tipos de cabelos, nos formatos dos corpos. Conto com dois anjos: quem me deu força e fez o visagismo desse cabelo foi o Diego Nardes e o responsável pelo corte é o Lucas Souza, que cuida dessa manutenção.

Jullie (Foto: Flora Negri )

Jullie (Foto: Flora Negri )

- Como foi o início da sua carreira?
Comecei com quatro anos, fiz minha primeira apresentação em um parque no Espírito Santo.
Virei para a minha mãe e falei que ia cantar, mas queria com figurino (risos). Comecei a cantar nos eventos da escola, festas de empresas. Foi uma coisa natural pra mim. Tinha essa coisa de acreditar e fui incentivada pela minha família. Com 12 anos participei do programa Gente Inocente (Globo). Com 16 fui para o Rio para me jogar.

- Conta um pouquinho sobre o musical do Nelson Gonçalves...
É uma grande celebração ao centenário do Nelson Gonçalves, uma homenagem diferente dos musicais biográficos porque não temos exatamente o personagem representado. Somos dois atores em cena e a gente representa razão e emoção, tempo e amor. Fala um pouco sobre esses conflitos que todo ser humano tem, essa dualidade que o Nelson tinha muito. Ele teve uma vida muito difícil, falou muito sobre o amor, mas sofreu muito, fez sofrer muito também, se afundou nas drogas. Falamos passagens da vida dele, tudo muito poético. O texto é do Gabriel Chalita, com direção Tania Nardini e direção musical do Tony Lucchesi. Ao mesmo tempo que nós somos dois, nós somos um.

Jullie e o ator Guilherme Logullo em cena no musical Nelson Gonçalves (Foto: Dan Coelho )

Jullie e o ator Guilherme Logullo em cena no musical Nelson Gonçalves (Foto: Dan Coelho )

- Em que pé está sua carreira musical?
Lancei meu álbum Até o Sol há dois anos e na época fiz vários show, mas agora não estou conseguindo porque tenho emendado um musical no outro. Mas estou tentando exercitar a composição para preparar alguma outra coisa. Meu trabalho acaba sendo muito do amor mais romântico e queria muito falar de outras coisas também. Além disso faço dublagem, no dia a dia estou sempre gravando.

- Qual trabalho em dublagem você tem um carinho mais especial?
O filme Trolls foi um dos que mais gostei de fazer. Cada trabalho tem seu barato, é muito divertido fazer desenho e poder brincar com os tipos de voz, mas gosto muito de fazer séries também e só com a voz ter a emoção que aquele ator já colocou em cena e se aproximar dessa interpretação.

Jullie (Foto: Guilherme Logullo)

Jullie (Foto: Guilherme Logullo)

Jullie (Foto: Tharsila de Brito)

Jullie (Foto: Tharsila de Brito)