• Andréia Meneguete e Paola Deodoro
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Bastou a modelo e apresentadora Mariana Goldfarb postar uma foto no Instagram sem maquiagem nem filtro para uma avalanche de críticas, questionamentos (e aplausos também) tomar conta dos comentários. A selfie, postada em 2018, enfatizava o contraste de suas sardas, mechas loiras, olhos verdes, e também valorizava uma mancha escura sobre os lábios: um persistente melasma. Essa imagem foi a primeira das muitas que Mariana começou a postar sem esconder a mancha.

E, por mais que seja assunto corriqueiro nas rodas de conversa sobre saúde e beleza, o melasma, que atinge 34% das mulheres brasileiras com idades entre 20 e 60 anos, ainda surge como uma incógnita de beauté. Segundo o dermatologista Daniel Cassiano, de São Paulo, membro da Sociedade Brasileira de Dermatologia, o melasma é uma hiperpigmentação crônica apresentada em pontos focais do rosto ou do corpo, sem causa específica. “De propensão genética até a gravidez, passando pelo uso de anticoncepcional e pela exposição solar, o problema pode ter diferentes causas. Mas o sol e o calor são, definitivamente, os maiores gatilhos para a ativação do aparecimento das manchas”, elenca o profissional. Até mesmo o estresse emocional e a poluição são apontados em estudos acadêmicos como fatores que integram a lista de ativadores do melasma.

Moda Rosa (Foto: Mariana Goldfarb)

Mariana Goldfarb: "As pessoas falavam muito do meu melasma" (Foto: Cassia Tabatini)

Mas, afinal, o que faz com que as manchas apareçam de forma recorrente? Até então, a justificativa médica apontava para a produção excessiva de melanina em locais específicos. Mas pesquisas recentes indicam que o problema vai muito além do descontrole dos melanócitos, células responsáveis pela produção de melanina. “Descobrimos que a região da pele com melasma tem uma recepção maior do estrogênio, hormônio feminino; um envelhecimento; baixa produção de colágeno; e uma danificação da membrana que separa a epiderme da derme”, explica Hélio Miot, médico dermatologista e pesquisador da Unifesp, que é referência e líder nos estudos sobre o tema no Brasil.

Embora o melasma tenha sido categorizado, por muito tempo, entre tipo epidérmico e dérmico, pesquisadores apontam que não há uma distinção do problema. Quase toda a melanina que causa a pigmentação da pele (95%) encontra-se na epiderme, camada mais superficial. “Há um ponto de divergência polêmico nessa questão. Nunca foi comprovado em estudo científico que a pigmentação da derme, camada mais profunda, esteja relacionada com a escuridão da mancha”, ressalta Miot. De acordo com o especialista, os melasmas mais escuros e acinzentados são mais difíceis de ser tratados devido a sua complexidade de estrutura e não por estarem na camada da derme.
 


Entretanto, as manchas transcendem os efeitos visíveis. Elas também esbarram na questão emocional. “Muitas pacientes têm manchas grandes e permanentes no rosto. Isso faz com que elas neguem a convivência social. É algo que atinge diretamente a autoestima e a liberdade”, revela Cassiano. Desse incômodo começam a surgir movimentos de autoaceitação nas redes sociais. Dentro de uma corrente de skin positivity, mulheres de diferentes partes do mundo têm postado selfies como as de Mariana para questionar padrões de beleza irreais. “Passei por um período em que as pessoas falavam muito do meu melasma e eu começava a olhar e pensar: ‘Realmente está escuro o meu bigode!’. Isso há uns quatro anos. Então, começou a ser uma questão tão grande para mim que ele foi piorando. Pude reparar nisso, tive picos com a mancha muito escura, quando estava passando por situações de estresse”, desabafa. E não é só uma sensação: o estresse e a depressão são desencadeadores da hiperpigmentação. “Um grupo de análise com 1.518 mulheres com melasma no Brasil apontou que 52% dessas pessoas apresentavam níveis elevados de ansiedade e 43% delas, de depressão. Esses problemas emocionais levam à liberação de hormônios como o cortisol e o ACTH (hormônio adrenocorticotrófico), que são agentes pigmentares”, explica Hélio Miot.

Moda Rosa (Foto: Mariana Goldfarb)

Mariana Goldfarb "Se não está tudo bem na vida pessoal, aquilo reverbera em melasma" (Foto: Cassia Tabatini)



Gatilhos  emocionais
A relação manchas x fatores emocionais é tão intensa, que guiou a conversa durante o podcast "Escuta, Maria Clara", que trata sobre o tema. Com a participação da própria aparesentadora Mariana Goldfarb, da dermatologista Katleen Conceição, da editora de beleza Paola Deodoro e comandado pela diretora de redação Laura Ancona, o bate-papo esclareceu muitos aspectos do ponto de vista técnico,. Mas invariavelmente a conversa chegava nas questões emocionais que envolvem a doença de pele. "Teve um período da minha vida em que eu fui muito massacrada pela mídia, por comparações e insinuação de competição, por palavras depreciativas. Por mais que a gente esteja bem resolvida com quem a gente é, tem dias que pega. E se não está tudo bem na vida pessoal, do jeito que a gente gostaria, aquilo reverbera em forma de melasma", desabafou Mariana. E ainda completou: "Por isso identifico que tive muito na minha fase de anorexia. E quando eu estou muito ansiosa. Mas tem um tempo que ele anda sumido de mim. Eu uso ele como um parâmetro para saber como está a minha saúde mental, de como está o meu interno. E a gente não estaria tão preocupado com melasma se a gente não vivesse em uma sociedade onde tudo tem que ser tão perfeito". 
Bem, melasma só não tem cura como é difícil identificar suas causas reais. Durante a gravação do podcast, Katleen lembrou que o sol piora o melasma, mas que nem sempre é a causa principal. "Tem pessoas que ficaram em casa na quarentena e dizem que o melasma piorou. Mas como assim? É o cortisol que ativou essa melanogênese e liberou esse pigmento em alta quantidade. Porque, afinal de contas, está todo mundo dentro de casa. Por isso é importante relaxar e conviver da melhor forma que você puder, focar em outras energias. Melasma é como hipertensão, diabetes, precisa apender a conviver. E o protetor solar é como escovar os dentes. Se não quiser ter cáries, tem que escovar os dentes a vida toda", completa a dermatologista.


Excesso de telas e melasma: mito ou verdade?
Em tempos de home office, a luz das telas fica na berlinda quando o assunto é melasma. A boa notícia é que não há indícios que comprovem que a incidência da luz azul violeta dos aparelhos eletrônicos estimule o aparecimento das manchas. Um estudo francês publicado no Journal of the American Academy of Dermatology, em dezembro de 2019, aponta que os gadgets não têm relação direta com a ativação do melasma, pois a intensidade da luz emitida é inexpressiva. “Pacientes foram expostos à luz de telas por oito horas por dia, ao longo de uma semana, e não houve o estímulo do melasma quando comparado aos demais que não tiveram contato com a luz azul violeta do mesmo tipo”, desmitifica o pesquisador Hélio Miot.

Eficácia comprovada: tratamentos indicados
Não tem jeito: protetor solar acima de 60, com fator UVA e UVB, com reposição a cada duas horas e a não exposição direta ao sol ainda são a melhor fórmula para minimizar os efeitos do melasma. “Eu precisei mudar muito a minha relação com o sol. Hoje em dia eu sempre uso chapéu, boné, fico embaixo da barraca. Passo protetor solar máximo, o 99, passo com cor, passo sem cor. Comecei a cuidar da minha pele, manter uma rotina de limpeza, de massagem e de carinho. Também estou fazendo um tratamento de ayurveda, em um grande processo de autoconhecimento. O resultado: meu melasma não deu sinal nessa pandemia. Sei que não está resolvido, mas está estabilizado”, diz Mariana. O dermatologista da Sociedade Brasileira de Dermatologia Bruno Lages, da Clínica Otávio Macedo e Associados, de São Paulo, costuma indicar às suas pacientes que coloquem o despertador para tocar a cada duas horas quando estão na praia ou na piscina. E mais. “Sempre oriento o filtro solar químico sem cor associado ao com cor para fazer uma barreira física, com uma proteção a mais. Para quem puder aplicar pó com cor, a barreira fica ainda maior”, afirma Bruno.

Mas, ainda que não tenha cura e seja difícil de tratar por causa da reincidência, há tratamentos tópicos e estéticos promissores que, quando combinados, trazem resultados positivos no clareamento das áreas hiperpigmentadas. Um exemplo são os lasers de luz micropulsada, que não transferem calor para a pele, como o Fotono Starwalker. “É um aparelho de última geração que traz ótimos resultados por conseguir fragmentar a melanina e ainda estimular a produção de colágeno na área de melasma sem emitir ondas de calor”, diz Fernando Macedo, dermatologista membro da Sociedade Brasileira de Dermatologia, de São Paulo. Para um bom resultado, o médico aconselha no mínimo quatro sessões do laser. O microagulhamento, muito utilizado para combater o envelhecimento da pele, também está entre os tratamentos complementares indicados para o melasma por proporcionar a renovação celular. Já os ácidos mandélico, glicólico, retinoico e salicílico continuam sendo os parceiros em tratamentos tópicos, mas desde que usados com cautela. “É preciso ter um olhar de atenção para o uso de ácidos, até mesmo os permitidos, já que podem causar um efeito rebote e ativar manchas”, sinaliza Macedo.

Fotoproteção oral: alimentos amigos da pele
Quer dar um boost na proteção da pele ao longo de todo o ano? Você pode lançar mão dos fotoprotetores orais. "Filtro oral funciona muito. Ele é um antioxidante, feito com substâncias naturais, que ajuda a inibir os radicais livres, que causam melanogênese, ou pigmentação. Então tomar de maneira oral ajuda a melhorar a qualidade do dna da célula, que já previne envelhecimento, manchas, câncer de pele, ajuda a proteger pele com vitiligo. Mas não evita que a pessoa precise passar o protetor na pele porque não há como precisar o quanto vai passar pelo organismo e chegar na epiderme. Deve continuar passando para garantir uma proteção mais eficiente", explica Katleen.

E a alimentação tamnbém pode ser uma grande aliada nessa missão. Tudo porque há alimentos que atuam como fotoprotetores orais. “Alguns compostos bioativos presentes em alimentos podem ajudar a pele a resistir mais tempo à exposição solar sem sofrer tantos danos e até mesmo evitando a formação de manchas”, explica Marcella Garcez, médica nutróloga e diretora da Associação Brasileira de Nutrologia, do Paraná.

Animou-se com a ideia? Então, adicione diariamente ao prato fontes de ácidos graxos, carotenoides e polifenóis. Tradução: todos os vegetais e legumes verdes e alaranjados, como cenoura, brócolis, tomates, abóbora e couve; e frutas como mamão, melancia, damasco, pêssego e frutas vermelhas. Já os peixes de água fria, como sardinha e salmão, e oleaginosas, como linhaça, chia e nozes, são ótimas fontes de ômega 3, que impedem a inflamação da pele. De acordo com a nutróloga, um organismo equilibrado com a alimentação possibilita uma melhor proteção e regeneração da pele.

E para aquelas que desejam estimular ainda mais a fotoproteção, os nutricosméticos também são alternativas bem-vindas. “Em 45 minutos após a ingestão, o organismo já começa absorver os nutrientes e inicia o processo de proteção natural da pele contra a luz solar”, diz a especialista. “Os estudos mais novos mostram que os fotoprotetores orais funcionam como adicional aos filtros tópicos”, resume Bruno Lages.

Moda Rosa (Foto: Mariana Goldfarb)

Mariana Goldfarb discute causas e desdobramentos do melasma (Foto: Cassia Tabatini)

Calor: o inimigo oculto
O calor é outro catalisador de manchas na pele. “As altas temperaturas promovem uma vasodilatação que ativa a hiperpigmentação da pele. Um dos componentes do melasma é a quantidade de vasos”, afirma Bruno Lages. Diante das altas temperaturas, especialistas aconselham a aplicação de água termal para reduzir o calor da pele e evitar que, mesmo protegida dos raios UVA e UVB, sua pele continue a pigmentar.