A descoberta de fósseis com 1,63 bilhão de anos no Norte da China sugere que organismos multicelulares surgiram 70 milhões de anos antes do que os cientistas pensavam anteriormente. O achado foi registrado no dia 24 de janeiro na revista Science Advances.
Pesquisadores liderados por Maoyan Zhu, do Instituto de Geologia e Paleontologia de Nanquim da Academia Chinesa de Ciências, relatam que os microfósseis são o registro mais antigo até agora de eucariotos multicelulares (organismos com núcleo definido e cheio de DNA empacotado).
Nós humanos e toda a vida complexa na Terra somos eucariotos multicelulares. A multicelularidade é fundamental para os eucariotos adquirirem complexidade e tamanho. No entanto, os cientistas estiveram em dúvida quanto ao momento em que os eucariotos desenvolveram essa característica.
Até a nova descoberta, registros fósseis apontavam que eucariotos com multicelularidade simples, como algas vermelhas e verdes, e alguns tipos de fungos, apareceram há 1,05 bilhão de anos. O estudo recém-publicado mostra que esses seres, na verdade, podem ter surgido antes.
Os pesquisadores coletaram fósseis de um possível tipo antigo de alga fotossintética na Formação Chuanlinggou da China, que data do final do Paleoproterozoico. Segundo conta Lanyun Miao, um dos autores do estudo, os filamentos são ramificados, compostos por duas a mais de 20 células cilíndricas ou em forma de barril com diâmetros de 20 a 194 micrômetros e comprimentos de até 860 micrômetros.
Análises demonstram a continuidade morfológica dos filamentos, sugerindo que eles representam uma única espécie biológica. "Esses filamentos mostram certo grau de complexidade com base em sua variação morfológica", destaca Miao, em comunicado.
Os fósseis foram nomeados Qingshania magnifica. Uma característica importante do grupo é a estrutura intracelular redonda (diâmetro de 15 a 20 micrômetros) em algumas células. Essas características são comparáveis às esporas assexuadas conhecidas em muitas algas eucarióticas, sugerindo que Qingshania provavelmente se reproduzia por esporas.
"Isso indica que Qingshania era provavelmente uma alga fotossintética, provavelmente pertencente ao grupo extinto de Archaeplastídeos [um grande conjunto composto por algas vermelhas, algas verdes e plantas terrestres, além de glaucofitas], embora sua afinidade exata ainda seja incerta", disse Miao.
Para testar se Qingshania tinha afinidade eucariótica do ponto de vista da composição química, os pesquisadores conduziram uma análise espectroscópica Raman nas criaturas, comparando os resultados com três táxons de cianobactérias.
A investigação classificou Qingshania e as cianobactérias em dois grupos distintos. Além disso, sugeriu que a matéria carbonácea de Qingshania é diferente da dos fósseis de cianobactérias, apoiando ainda mais a afinidade eucariótica desses seres.
Atualmente, os fósseis eucarióticos mais antigos são formas unicelulares de sedimentos do final do Paleoproterozoico, de aproximadamente 1,65 bilhão de anos atrás, no Norte da China e no Norte da Austrália. Qingshania apareceu apenas um pouco depois dessas formas unicelulares.
“A multicelularidade é um pré-requisito para qualquer definição da vida complexa moderna; portanto, redefinir a escala de tempo de um evento tão fundamental tem repercussões significativas na forma como pensamos sobre a linhagem que eventualmente daria origem à nossa própria espécie”, comentou ao site Live Science Jack Craig, professor assistente de pesquisa na área de genômica evolutiva na Temple University (Estados Unidos), que não esteve envolvido no estudo.
Segundo o especialista, identificar qualquer fóssil com mais de um bilhão de anos é muito desafiador. "Os fósseis de dinossauros mais antigos têm apenas cerca de 250 milhões de anos, e os deste estudo são quase sete vezes mais antigos", ele compara. “É por isso que pesquisas como esta são excepcionalmente difíceis, mas altamente gratificantes, e quando conclus��es como as deste estudo podem ser alcançadas com grande confiança, elas representam uma descoberta significativa.”