Olhar Cético
A origem da teoria das bombas atômicas pré-históricas
Além de negar o caráter mítico ou ficcional dos textos de nossos ancestrais, teoria ainda projeta neles as tecnologias – e fantasias – do presente
2 min de leitura![Manuscrito com trecho do Mahabharata (Foto: Wikimedia Commons) (Foto: Wikimedia Commons)](https://cdn.statically.io/img/s2.glbimg.com/yf7PrjrU4iIM8G2ukjhOf3FwiHA=/e.glbimg.com/og/ed/f/original/2014/05/19/mahabharata.jpg)
Manuscrito com trecho do Mahabharata (Foto: Wikimedia Commons)
A ideia de que certos mitos preservam relatos de explosões nucleares provocadas por alienígenas nasceu na década de 50 na União Soviética, país que durante algum tempo abraçou a ufologia mais delirante como uma espécie de “alternativa secular” à religião. O tema foi contrabandeado para o ocidente por autores franceses, no início dos anos 60, e ganhou o mundo na obra do suíço Erich von Däniken. As bombas atômicas antigas teriam sido usadas contra Sodoma e Gomorra, as cidades bíblicas, e durante uma batalha descrita no épico indiano Mahabharata.
No caso bíblico, o relato é muito breve, e fala apenas de uma “chuva de enxofre e de fogo” sobre as cidades – algo bem diferente de uma explosão nuclear. A bola de fogo de uma bomba atômica não “chove”, expande-se. E a Bíblia não menciona a onda de pressão, uma muralha de vento que arranca tudo que encontra em seu caminho, e que é um dos efeitos mais notáveis de uma bomba nuclear.
O caso do Mahabharata é ainda mais confuso: tanto Von Däniken quanto suas fontes francesas, Louis Pauwels e Jacques Bergier, citam supostos trechos do poema que, ou não existem no original, ou foram drasticamente adulterados na tradução, tal como apresentada por esses autores.
O antropólogo Jason Colavito diz que o mais próximo do texto apresentado por Von Däniken como sinal de explosão atômica, nas traduções mais aceitas do épico indiano, é um trecho do Livro 7, descrevendo uma arma mítica que dispara flechas de fogo.
Depois de Von Däniken, outros autores, como David Hatcher Childress, também adotaram a ideia de armas nucleares antigas, embelezando-a com outros artefatos de ficção científica, como raios da morte.
Na Antiguidade, o pensador grego Evêmero defendeu que os mitos do passado na verdade não passavam de história disfarçada – os deuses do Olimpo seriam antigos reis, por exemplo. A doutrina recebeu o nome de evemerismo. A teoria da bomba atômica pré-histórica é uma espécie de evemerismo torto, que além de negar o caráter mítico ou ficcional dos textos de nossos ancestrais, ainda projeta neles as tecnologias – e fantasias – do presente.