• Asaf Lubin* | The Conversation
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Conflitos em Gaza: 7 respostas sobre o que diz o direito internacional (Foto: CHUTTERSNAP/Unsplash)

Conflitos em Gaza: 7 respostas sobre o que diz o direito internacional (Foto: CHUTTERSNAP/Unsplash)

Os combates mais mortíferos em anos entre Israel e Hamas mataram, em meados de maio, mais de 200 palestinos em Gaza, incluindo dezenas de crianças, e pelo menos 10 em Israel. Ambos os lados são acusados de violar a lei internacional — Israel por seu suposto bombardeio desproporcional a prédios residenciais e grupos palestinos por dispararem foguetes contra cidades israelenses.

O professor de direito internacional Asaf Lubin explica as regras da guerra — e se elas podem ser aplicadas.

1. As guerras são governadas por lei?

O Direito Internacional Humanitário abrange um conjunto de regras que governam os conflitos armados. Eles estão consagrados em tratados, alguns dos quais tanto Israel quanto a Palestina ratificaram. Os mais importantes desses acordos são as Convenções de Genebra de 1949 e seus protocolos adicionais de 1977.

No centro do Direito Internacional Humanitário está um conjunto básico de princípios. O primeiro é o princípio da distinção, que obriga as partes beligerantes a distinguir entre civis e alvos militares. Cada lado pode atacar apenas os objetos que, por sua natureza, localização, propósito ou uso, ofereceriam uma vantagem militar definitiva se neutralizados.

Em segundo lugar está o princípio da proporcionalidade, segundo o qual qualquer “dano colateral” inevitável — como a morte de civis — não pode ser excessivo em relação à vantagem militar direta prevista. Por fim, existe o princípio da precaução no ataque, que reafirma a obrigação das partes beligerantes de fazer todo o possível para mitigar os danos civis.

Portanto, quando o Hamas dispara foguetes indiscriminadamente em Tel Aviv, por exemplo, é uma clara violação do direito internacional. Da mesma forma, os ataques israelenses a edifícios residenciais são para muitos na comunidade internacional um crime de guerra, porque são desproporcionais e não oferecem uma vantagem militar definitiva.

Israel discorda, alegando que esses edifícios foram usados pelo Hamas para avançar em sua campanha militar.

2. O que acontecerá se Israel ou o Hamas forem acusados de cometer crimes de guerra?

Isso depende da vontade da comunidade internacional. Pode haver uma investigação do Tribunal Criminal Internacional, sanções do Conselho de Segurança da ONU ou missões de investigação do Conselho de Direitos Humanos da ONU.

Esses tipos de investigações aconteceram após cada ciclo anterior de violência entre Israel e o Hamas. Relatórios anteriores — como o relatório Goldstone de 2009, emitido pelo Conselho de Direitos Humanos da ONU — identificaram violações dos direitos humanos e do direito humanitário por ambas as partes. Ele pediu que Israel fornecesse reparações monetárias às vítimas palestinas ou seus sobreviventes.

A fiscalização, no entanto, tem se mostrado amplamente ineficaz. O direito internacional simplesmente carece das ferramentas necessárias para responsabilizar os países poderosos.

3. Israel cumpriu as exigências da ONU após tais investigações?

Em diferentes graus. Em muitos desses casos, Israel não aceitou a premissa básica de que suas práticas militares violavam o direito internacional humanitário e, portanto, não mudaram seu curso.

Mas em algumas raras ocasiões, Israel pagou uma compensação. Por exemplo, em 2009, o país pagou US$ 10,5 milhões à ONU por danos à propriedade e ferimentos sofridos pela organização durante o ataque de Israel a Gaza.

Quando Israel faz tais pagamentos, eles são feitos ex gratia — pagamentos de quantia total feitos para responder à pressão internacional sem reconhecer qualquer responsabilidade legal ou criar normas juridicamente vinculativas que poderiam ser aplicadas no futuro.

Israel não está sozinho nessa prática. Outros países, incluindo os EUA, fizeram pagamentos ex gratia semelhantes aos prejudicados na guerra, sem admitir culpa ou irregularidade.

4. Qual é a posição dos EUA sobre a ação militar de Israel em Gaza?

Os EUA agora afirmam que apoiam um cessar-fogo. Mas o país bloqueou as declarações do Conselho de Segurança da ONU que teriam pedido esse cessar-fogo e colocado a culpa em Israel, incluindo linguagem forte sobre crianças palestinas morrendo em grande número. Os EUA alegaram que bloquearam essas declarações porque também não condenaram o Hamas por violar o direito internacional

É uma postura comum dos EUA nos conflitos Israel-Hamas exigir igualdade de linguagem em "ambos os lados". Mas os congressistas progressistas do Partido Democrata agora têm uma visão diferente. Eles insistem que os EUA devem reconhecer o desequilíbrio de poder entre Israel, uma superpotência militar financiada pelos EUA, e Gaza, um território ocupado.

5. Israel já estava sob investigação do Tribunal Criminal Internacional por supostamente cometer crimes de guerra contra palestinos. O conflito atual influenciará esse caso?

Em março de 2021, o promotor cessante do Tribunal Penal Internacional Fatou Bensouda abriu uma investigação sobre supostos ataques desproporcionais de Israel em Gaza — exatamente o mesmo tipo de ataque em questão agora. A investigação também cobre o programa de assentamentos de Israel na Cisjordânia.

Em uma entrevista recente, Bensouda disse que a investigação continua aberta e que seu escritório está monitorando a situação atual muito de perto — essencialmente alertando Israel para ter cuidado, porque o tribunal criminal poderia responsabilizá-lo.

A violência contínua mostra que a ameaça não deteve nenhum dos lados. Os líderes israelenses costumam se referir a uma “cúpula de ferro legal” para indicar o guarda-chuva geral de proteção que Israel oferece a seus militares de qualquer processo criminal futuro.

6. Israel e os EUA aderiram aos tratados internacionais que estabelecem as regras de guerra?

Sim, ambos ratificaram as Convenções de Genebra, mas não seus protocolos adicionais. No entanto, a comunidade internacional reconhece amplamente as regras estabelecidas nesses acordos como lei consuetudinária e, portanto, são obrigatórias para todos os países, independentemente de terem assinado ou não.

7. Se nem Israel nem os Estados Unidos cumprem com o Direito Internacional Humanitário, essas regras realmente existem?

O direito internacional tem uma função expressiva, estabelecendo um padrão de como os países devem se comportar. Com o tempo, vimos essas normas desempenharem um papel cada vez maior na forma como os países operam — e quais ações são consideradas inaceitáveis.

Por exemplo, após o relatório Goldstone de 2009, Israel se comprometeu a fazer várias mudanças para minimizar as vítimas civis, incluindo a restrição do uso de munições de fósforo branco, que causam graves queimaduras químicas.

O Direito Internacional Humanitário não é uma panaceia para todos os males do mundo. Mas essas regras são um bom ponto de partida e certamente vale a pena lutar por elas.

*Asaf Lubin é professor associado de Direito na Universidade de Indiana (EUA). Este artigo foi originalmente publicado em inglês no site The Conversation