• Denise Fraga
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Família, feliz, amizade, filhos, pais (Foto: Thinkstock)

(Foto: Thinkstock)

O pequeno Pedro tinha por volta de seus 7 ou 8 anos. Eu estava aninhada com meus dois filhos na cama vendo fotos deles pequenos.  Quer dizer, menores ainda. Depois de alguns álbuns, Pedro olhou para mim, com os olhinhos brilhantes, e disse:

– Eu preferia antes.

Fincou um alfinete em meu coração. 

Antes que o pequeno se debruçasse em lágrimas pelo novo sentimento, apressei-me em fazê-lo perceber o que talvez fosse o seu primeiro contato com a nostalgia, essa bela palavra triste. 

– Não, Pedro, você não preferia antes. Se alguém tirar uma foto da gente aqui deitado na cama pra você ver no ano que vem, você também vai sentir isso. Ver fotos dá nostalgia, sentimento que faz com que a gente permita que o passado ganhe do presente, simplesmente porque na foto e na memória tudo parece mais bonito.  Mas, o que a gente tá vivendo aqui também é bonito igual. 

No domingo passado, estava descarregando umas fotos no computador e resolvi clicar numa pasta escrita vídeos. Registrei vários momentos de meus filhos pequenos, mas não costumamos sentar para assistir. Acho que o clique digital encheu meu computador com tantas imagens que inconscientemente rejeito a ansiedade de ver a vida toda ali, eternamente à espera de ser posta em ordem.  Abri a pasta e lá estavam meus dois menininhos falando comigo. Eu já não reconhecia mais aquelas vozinhas, aquelas bochechas. Fui inundada de nostalgia. Lembrei do pequeno Pedro na cama, que agora parecia me dizer:

– Não, mamãe, você não preferia antes.

Fui vendo um vídeo após o outro contendo as lágrimas. Atrás da lente, eu falava com eles e a minha voz, eu também não reconhecia. Não exatamente a voz, mas a maneira de falar, a condescendência, a paciência.

Chamei os marmanjos. Eles riram de suas criancices e eu pensava se eles também estranhariam a minha voz através do tempo. Se o fizeram, não falaram. Também não perguntei.Poupei meu coração da possível crueldade adolescente de transformarem a mamãezinha dos menininhos em uma Cinderela mais legal do que a Cruela, que tem aparecido algumas noites por aqui. 

Não, eu não preferia antes, mas passei o resto do dia com vontade de chorar depois de ter aberto a pasta dos vídeos. A vida é cristalina, o amor é caudaloso e o tempo, ciclônico. Cada foto guarda em si o tanto de intensidade com que gostaríamos de ter passado todos os dias. E os dias nos correm pelos dedos sem que possamos compactá-los em sua qualidade. A vida é bela demais. E, às vezes, não damos conta de tanta beleza.

“Cada foto guarda em si o tanto de intensidade com que gostaríamos de ter passado todos os dias.”

Denise Fraga (Foto: Gabriel Rinaldi/Editora Globo)

(Foto: Gabriel Rinaldi/Editora Globo)