Com a pandemia da covid-19, houve um aumento expressivo no número de resíduos descartados. Para cada pessoa infectada por coronavírus, 7,5 quilos de lixo são gerados por dia - sete vezes mais do que a média de produção de lixo por habitante, que é de 1,1 quilos por dia -, segundo a Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (ABRELPE). Com os protocolos de segurança e higienização, também houve um salto na utilização de plásticos descartáveis em estabelecimentos e nos lares, devido ao avanço do delivery de alimentos.

Pai e filho separando materiais recicláveis na cozinha de casa (Foto: Shutterstock)

Pai e filho separando materiais recicláveis na cozinha de casa (Foto: Shutterstock)

Segundo dados citados no Atlas do Plástico 2020, estudo da organização sem fins lucrativos alemã Fundação Heinrich Böll, a pandemia também gerou impacto nos sistemas de reciclagem. O aumento na coleta dos materiais recicláveis foi de 25 a 30%, mas grande parte desse volume vai diretamente para os aterros sanitários. Isso porque, com a crise sanitária, muitas cooperativas de reciclagem fecharam ou diminuíram suas atividades.

As cooperativas, unidas aos catadores, são responsáveis pela maior parte do lixo reciclado no Brasil. Elas recebem os materiais já coletados e separados pelos catadores autônomos ou associados à cooperativa. Esses materiais passam por mais uma triagem antes de serem prensados e vendidos para empresas de reciclagem, que os reutilizam como matéria-prima. Mesmo os que fazem parte do grupo de risco, muitos catadores continuam trabalhando na coleta e separação dos materiais reciclados, ação fundamental no processo de reciclagem, para garantir o sustento de seus lares.

Além de colaborarem com a preservação do meio ambiente, as cooperativas geram empregos e valorizam o trabalho dos catadores. Cleiton Emboava é sócio-presidente da associação de catadores de materiais recicláveis Nova Glicério, que garante o sustento de mais de cem catadores e suas famílias. Para ele, a participação da população é fundamental para que as cooperativas de reciclagem tenham maior êxito.

“A primeira forma de colaborar é sabendo que é possível contratar os serviços dos catadores associados ou autônomos para empresas, condomínios e escritórios”, conta Cleiton. Há, inclusive, uma Lei Federal que dispensa a licitação para contratação de associações e cooperativas de catadores, impulsionando a coleta seletiva.

Onara Lima, Diretora de Sustentabilidade da Ambipar, conta que, no ambiente empresarial, já há uma obrigatoriedade na transparência com relação a ações ambientais e sustentáveis. “Quando falamos da população, não há essa cobrança, e precisamos entender qual é a parcela de contribuição dessa população dentro da ação ambiental”, diz Onara. “E a reciclagem é só a ponta do iceberg. A educação ambiental está, aos poucos, chegando até a população e nada mais importante do que a comunicação para fomentar isso e para que as pessoas entendam: a sustentabilidade e a preservação do meio ambiente começam dentro de casa”, completa ela.

Nas escolas, as crianças já aprendem sobre reciclagem desde muito novas. “Elas não precisam nem saber ler ou escrever, por exemplo, porque a reciclagem em si já é colorida, e as crianças associam muito as cores no início do processo de aprendizagem”, explica Onara. As escolas se utilizam do lúdico para ensinar sobre cores e materiais, e as crianças já começam a levar isso para casa desde muito cedo. “A nova geração vem solicitando essa agenda de forma muito mais forte do que as antigas gerações”.

Para caminharmos cada vez mais em direção a uma economia verdadeiramente sustentável, a reciclagem é fundamental. Mas, será que você está fazendo isso da forma certa? Abaixo, algumas dicas que ampliam a contribuição de cada família no processo de reciclagem:

Separar o lixo em casa

Segundo Onara Lima, no Brasil, só 3% dos materiais recicláveis são, de fato, reciclados. A Ambipar trabalha com o pós-indústria, um universo em que já se mensura o quanto está sendo reciclado. Já no pós-consumo, não há essa medida, apesar de haver um potencial de reciclagem enorme. Onara acredita que o cenário de 3% de resíduos reciclados é, em grande parte, representado pela população. “Quando as famílias tiverem a consciência de observar os resíduos produzidos em casa, posso falar sem medo de errar que a maioria será reciclável”, afirma Onara. “Hoje em dia, tudo é industrializado, tudo vem em uma embalagem. É assustadora a quantidade de resíduos que uma família gera!” É uma jornada longa e contínua, que não tem uma linha de chegada, afinal, sempre haverá algo em que é possível melhorar. Entretanto, o primeiro passo precisa ser dado, que é sair da zona de conforto e separar o lixo dentro de casa.

Não apenas separar o lixo em casa, mas separar corretamente

Segundo Cleiton, o maior obstáculo para a reciclagem, hoje, é a logística, por ser muito cara. Quando uma pessoa mistura os resíduos recicláveis com, por exemplo, materiais orgânicos, podas de árvore ou entulho, ela aumenta o peso do que é coletado pelos catadores. “Uma carga de cem quilos, por exemplo, pode gerar uma renda de R$ 50”, exemplifica Cleiton. “Mas, se nesses cem quilos, apenas metade for reciclável, a renda gerada cai para R$ 25”. Por isso, é fundamental que a separação seja feita da forma mais precisa possível, a fim de melhorar os valores de comercialização.

No ambiente caseiro, as cooperativas de catadores observam o plástico como grande parte da porcentagem de resíduos - também por ser o mais comum em embalagens e produtos domésticos. Muitas vezes, os outros materiais usados em casa não podem ser reciclados por estarem sujos, com alimentos, e acabam não voltando para a reciclagem. Portanto, além da separação correta, é importante lembrar de lavar as embalagens de plástico, a fim de não sujar outros materiais e inviabilizar a reciclagem.

“Uma ideia interessante é ter um recipiente apenas para plástico e outro para papéis e papelão”, indica Onara. Caso o condomínio já tenha as lixeiras para reciclagem, vale a pena separar o alumínio e o vidro também, descartando-os de acordo nas lixeiras. “Isso vale principalmente para o vidro, por ter um processo de reciclagem diferente, além do risco de quebrar e ferir os coletores”, ressalta a especialista da Ambipar.

Desta forma, ao chegar nos pontos de reciclagem, é muito mais fácil fazer a triagem abrindo uma sacolinha que só contém plástico, por exemplo, enquanto outra só contém papel. “Se conseguirmos praticar em nossas casas o que já é feito nas empresas, que é separar os materiais, o aproveitamento é muito maior”, diz Onara. E para quem ainda tem dúvida do material de determinado produto, já existem legislações que obrigam as empresas a demonstrarem na embalagem qual é a reciclagem dela, ou seja, se é considerada como plástico ou como alumínio, por exemplo. Nesses casos, o descarte deve ser feito levando em consideração o material que prevalece na composição da embalagem.

Procurar cooperativas de reciclagem próximas a sua casa

O fato de muitos municípios não terem coleta seletiva é um dos maiores obstáculos da reciclagem. Os caminhões de lixo regulares são compactadores, ou seja, compactam todos os materiais juntos, que acabam indo para os aterros. “Além de deixar de reciclar, isso sobrecarrega os aterros, que deveriam servir apenas para orgânicos - e olhe lá, porque já sabemos do potencial dos orgânicos se reutilizados para uma compostagem, por exemplo”, alerta a diretora de sustentabilidade da Ambipar.

É um grande desafio implementar uma coleta seletiva que possa subsidiar todo o potencial de reciclabilidade que há hoje em dia. Mas, mesmo que não haja coleta seletiva no seu município, sempre haverá catadores e cooperativas. Nesse caso, é ideal que seja feita a separação do lixo e o encaminhamento, por conta própria, para esses pontos de coleta. “Isso é uma ação ambiental e, ao mesmo tempo, uma ação social, já que contribui para a subsistência de quem vive desses resíduos”, pontua Onara.

Essa matéria faz parte da iniciativa #UmSóPlaneta, união de 19 marcas da Editora Globo, Edições Globo Condé Nast e CBN. Conheça o projeto aqui

um só planeta rodapé novo (Foto: Crescer)

um só planeta rodapé novo (Foto: Crescer)

Vai dar mais trabalho, naturalmente, mas encontrando pontos que estão na sua rota e se organizando para isso, você estará contribuindo o máximo que pode para o bem-estar do planeta. “Não adianta cobrarmos grandes empresas, por exemplo, sem antes pensarmos no que está ao nosso alcance”, finaliza Onara. Com disposição e propósito, é possível aumentar consideravelmente o potencial de reciclabilidade do país.