• Nathalia ZiemkiewiczCC
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Criança com mamadeira na boca (Foto: Getty Images)

Criança com mamadeira na boca (Foto: Getty Images)

Durante a gravidez de Pedro, 2 anos, a bancária Mara Oliveira, 36 anos, excluiu chupetas da lista do enxoval. Jurou que não daria o bico artificial para o filho pelos riscos de desmame precoce e danos à arcada dentária. Mas, no desespero do puerpério, em uma madrugada de muito choro e sono, ela apelou para o presente – até então indesejado – de um colega do marido.

Dois anos e meio depois, Pedro segue firme no “tetê” (peito) e na “supeta”. Quando a mãe insinua a retirada desse bico, o menino faz cara de choro e protesta. “Já sugeriram passar algo amargo, jogar fora e deixar chorar... Sou extremamente contra, e não quero recorrer a nenhuma estratégia radical”, diz Mara. “Tenho medo de ser sofrido, e ele voltar a chorar como recém-nascido.”

O adeus à chupeta ou mamadeira parece muito com o desmame do peito, na opinião da psicóloga Fernanda Lopes, especialista em aleitamento materno e parentalidade pela Unifesp, de São Paulo. Isso porque representa a separação entre a criança e um objeto de amor – algo que lhe traz conforto e acolhimento. “Retirar esse artifício implica em construir novas referências, por exemplo, para adormecer e para lidar com o tédio”, afirma.

O receio de pais e mães como Mara é legítimo, mas o processo não precisa ser assim, difícil, enganoso e traumático. Eis o que você precisa saber para tornar esse momento tão importante para o desenvolvimento do seu filho o mais gentil e suave possível.

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1. AVALIE SE VOCÊ (!) ESTÁ PRONTO
Isso mesmo... Chupeta e mamadeira estão associadas à ideia de fragilidade – portanto, do imprescindível cuidado dos pais. “Para que a retirada seja menos desgastante, precisamos entender primeiro como eles lidam com a maior autonomia da criança”, afirma a psicóloga Mariana Cardoso Rodrigues, do Sabará Hospital Infantil (SP). Aceite uma eventual ambiguidade de sentimentos: o orgulho do crescimento do filho e a saudade de quando era “apenas” um bebê. Quanto mais seguros os adultos estiverem, mais fácil ampará-lo emocionalmente e demonstrar que essa é uma etapa natural do desenvolvimento. Em vez de encarar essa transição como uma perda, a família pode reforçar como será positivo ganhar novas habilidades,
a exemplo de tomar leite no copo ou dormir sozinho.

“Começamos a tirar a chupeta durante o dia, e a sair de casa sem ela, quando Sophia fez 2 anos. Ela se revoltava, mas distraíamos a pequena. Um dia, disse que não queria mais ‘o bibi para dormir’. Deixamos ‘para o duende’ em troca de um brinquedo novo. Ela chorou muito por quatro noites. A gente oferecia bichinhos de pelúcia, abraçava, beijava até que ela se acalmasse e dormisse.”
MABEL NYLAND, MÃE DA SOPHIA, 4 ANOS, E DA LARA, RECÉM-NASCIDA

2. ENXERGUE O MELHOR MOMENTO
Quanto antes estes acessórios ficarem obsoletos na sua casa, melhor. Por volta dos 2 anos, a criança sai da chamada fase oral – período de exploração do mundo por meio da boca. “Os bicos artificiais perdem a sua função: desaparece a necessidade de sucção e a deglutição já está preparada para receber copos de transição ou canudo”, diz a pediatra Renata Aniceto, especialista em nutrologia (SP) e membro da Sociedade Brasileira de Pediatria. Ela afirma que prolongar o uso impacta em uma maior incidência de alterações ortodônticas, fonoaudiológicas e emocionais.

Então, a partir dessa idade, é importante definir estratégias para a retirada da chupeta e/ou da mamadeira. Evite que esse momento coincida com outros marcos na vida da criança, como a chegada de um irmão, o desfralde ou a entrada na escola.

“Quando começaram a sair os dentes caninos, meu filho vivia rasgando a chupeta. Eu não dava conta de comprar. Até que um dia resolvi deixar a chupeta rasgada, mesmo. Ele chupava, estranhava, mas não reclamava. E perdeu o interesse.”
CAROLINA VOLPATO LOCATELLI, MÃE DE PEDRO, 2 ANOS

chupeta_mao (Foto: shutterstock)

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3. CONVERSE COM A CRIANÇA
Se ela já tem capacidade de compreensão, aproveite uma visita ao dentista para explicar que a chupeta pode causar problemas aos dentes ou perguntar se ela reparou que crianças maiores não tomam mamadeira. Os especialistas alertam para não ridicularizar o uso (“é feio”), recorrer a chantagens e ameaças (“então não vai mais ver desenho”), “temperar” os bicos com ingredientes “ruins” (amargo, azedo...). Enalteça o quanto seu filho cresceu, apontando algumas conquistas – a capacidade de se vestir ou arrumar os próprios brinquedos. “Conte que está chegando a hora de dizer tchau para algo que foi muito importante quando ele era pequeno”, sugere a psicóloga Fernanda Lopes. 

“E que vocês estarão lá para ajudar, porque sabem como é chato parar de usar uma coisa que a gente gosta.” Como forma de motivar os filhos e gratificá-los pelo esforço, alguns pais propõem presentes ou “trocas” com personagens infantis (leia os depoimentos ao longo da reportagem). Para a pediatra Renata Aniceto, a longo prazo, esse comportamento pode remeter à ideia de que sempre haverá “recompensa para atos naturais na nossa vida”. Reflita se é o caso. Se for lançar mão desse recurso, faça-o com muita moderação e de forma pontual.

4. VÁ DEVAGAR – MAS SEJA CONSTANTE
Atitudes abruptas, como desaparecer com os bicos artificiais, podem abalar emocionalmente seu filho e desencadear hábitos, como roer unhas, morder a pele dos dedos... A retirada deve ser lenta e gradual. “É preciso levar em consideração que a criança tem uma relação afetiva com aquele objeto dado por um adulto”, diz a fonoaudióloga Kely de Carvalho, que é consultora de aleitamento materno (SP). No caso da chupeta, vale começar restringindo a quantidade (a apenas uma) e o horário de uso (só para dormir – tentando tirar da boca quando o sono estiver pesado – ou em situações de muito estresse). Não leve o acessório nos passeios nem deixe-o pendurado na roupa. À medida que a chupeta se torna desnecessária, vocês podem combinar de jogá-la fora juntos.

“Com meu filho mais velho, confesso que foi fácil. Certa noite, fiz a rotina habitual e, na hora de dormir, arrisquei, dizendo que ele já era grande e poderia dar a chupeta para o primo que ia nascer — e ficaria feliz de ganhá- la. Funcionou: ele me ofereceu na mesma hora, e nunca mais pediu.”
CATIANA DE OLIVEIRA, MÃE DE LEONARDO, 11 ANOS, E GABRIELA, 2

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5. APOIE E FIQUE FIRME
Sem chupeta ou mamadeira para pegar no sono, seu filho precisará ainda mais da sua presença empática e paciente: abrace, dê um bichinho de pelúcia, cante uma música, conte uma história, mostre que vão superar juntos... Prepare-se para algumas noites conturbadas (em geral, as três primeiras são mais difíceis). Da mesma forma, a criança pode fazer birra em público quando o objeto de apego lhe for negado. Resista aos apelos, lembrando que esta é a melhor decisão para a saúde e o desenvolvimento dela. “Tenha em mente que a retirada dos bicos artificiais será mais um dos inúmeros desafios da maternidade e você precisará de uma boa rede de apoio”, afirma a enfermeira Sandra Abreu, especialista em aleitamento materno (SP), idealizadora da consultoria Anjos do Leite. Todos os envolvidos no convívio com a criança devem agir com coerência para não confundi-la ou desestimular quem está conduzindo esse processo – por exemplo, lançando frases que minimizam o uso prolongado dos bicos artificiais (“Uma hora para de usar... você
já viu adulto de chupeta?”).

De acordo com a odontopediatra Beatriz Queiroz, mestre em ciências da saúde pela Unifesp, de São Paulo, os danos causados por esses acessórios aumentam conforme a frequência e a duração do uso. Por isso, a interferência dos pais é fundamental quando o abandono da chupeta e da mamadeira não se dá espontaneamente até os 2 anos. E se a criança pegar o dedo? Não há o menor motivo para desespero. “A maioria perde o interesse quando começa a usar a mão para brincar ou desenvolver outras atividades”, afirma Beatriz. O importante é fazer do processo de retirada dos bicos artificiais algo tranquilo e natural. Sem estresse nem traumas. Para o bem das crianças e dos pais.

“Duda pediu para pintar minha unha e não deixei ‘por ser bebezinha’. Com raiva, ela abriu a porta e jogou a chupeta. Mais tarde, eu disse que a barata tinha levado embora. Foi uma noite bem difícil. No outro dia, o objeto 'reapareceu' com o bico cortado. Espantada, ela passou duas semanas com a chupeta na mão, sem usar, até que combinamos de jogar fora.”
PAULA VIDO, MÃE DE MARIA EDUARDA, 2 ANOS

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