• Sabrina Ongaratto
Atualizado em
Sleep Talk consiste em falar com os pequeno durante o sono REM (Foto: Getty)

Sleep talk consiste em falar com os pequeno durante o sono REM (Foto: Getty)

Algumas crianças não conseguem largar a chupeta. Outras, sofrem muito com a adaptação escolar. Às vezes, o problema é o ciúme do caçula que acabou de chegar. O fato é que, às vezes, parece que o diálogo não funciona e, mesmo tentando de tudo, os pais não conseguem fazer com que os filhos entendam e aceitem certas situações.

Há pouco mais de dois anos, a psicóloga Nanda Perim, do blog Psi Mama, testou inúmeras táticas na tentativa de fazer com que o primogênito, Theo, hoje com 5 anos, largasse a chupeta. Até que uma estratégia deu certo. "Na época, ele estava prestes a fazer 3 anos e percebemos que a chupeta estava causando alterações dentárias. Decidimos conversar com ele durante o sono, ou seja, enquanto ele estava dormindo", conta. 

"NÃO É MÁGICA"

"Na primeira noite, depois que Theo dormiu, pedi para que ele parasse de chupar chupeta, mas só se estivesse pronto. Disse que ele não precisava mais dela e que nós estaríamos aqui para surprir qualquer demanda que ficasse. Deixamos claro que se ele precisasse muito, poderia continuar usando", conta. "Na segunda noite, ele dormiu de chupeta. Na terceira noite, de novo. Pensamos que não daria certo, mas resolvemos insistir. Fizemos mais uma vez e, na noite seguinte, aconteceu algo. Na hora de dormir, com a chupeta na mão, ele chorou muito, mas não a colocava na boca. Pensei que, talvez, ele precisasse apenas se despedir dela. Perguntei se ele queria dar tchau e ele disse que sim. Então, fomos até o banheiro. Theo abraçou a chupeta e a jogou no lixo. Ele deitou, dormiu e nunca mais pediu a chupeta. Foi impressionante, mas não foi mágica", afirma Nanda.

Depois desse dia, ela conta que usou o método diversas vezes. "Repetimos no desmame do Gael, 4 anos, e usamos quando um está batendo ou mordendo muito o outro. Outra coisa que indico muito é para situações traumáticas. Esses dias, um deles quase se afogou e ficou traumatizado. Então, falamos muito com ele durante o sono. Repito que ele está seguro, que não vai acontecer de novo e que vamos protegê-lo sempre", conta.

Nanda com o marido e os filhos, Theo e Gael (Foto: Arquivo pessoal)

Nanda com o marido e os filhos, Theo e Gael (Foto: Arquivo pessoal)

COMO SURGIU?

A ideia de conversar com a criança durante o sono foi inventado na década de 1970 pela professora e autora britânica Joane Goulding. Mãe de uma menina com paralisia cerebral e dispraxia verbal, ela apostou no poder do insconsciente para ajudar a filha. "Percebi que as crianças absorviam tudo o que ouviam, independentemente de suas crenças conscientes. Então, ativei em minha vida a lei mais antiga da mente: 'Se você pode imaginar, então você pode realizar'", conta ela, em sua página oficial. Foi assim que ela começou a conversar com a filha durante o sono e o chamado Sleep Talk® se espalhou pelo mundo. “Embora ela ainda tenha que lidar com as deficiências físicas, ela está casada há mais de 25 anos e muito feliz. É independente, viaja e até cozinha. Michelle agora tem o presente mais precioso que eu poderia dar a ela: a crença de que ela é amada incondicionalmente, que ela pode andar e falar, e que a vida é feliz. Sua profunda crença inconsciente de que ela era inadequada e 'defeituosa' foi alterada para: 'Estou bem', e essa é agora a base do mundo dela”, afirmou.

Hoje, o método é certificado e protegido por Lei. Segundo Raphaela Alencar, representante legal do Processo Goulding SleepTalk® no Brasil e Trainer Internacional do método, ele não tem ligação com a hipnoterapia. "A única coisa que eles têm em comum é que ambos usam sugestões. A hipnoterapia consiste na aplicação de técnicas se utilizando o estado de hipnose como uma ferramenta terapêutica, já o nosso método é um Programa de Desenvolvimento e Empoderamento Emocional Infantil – um poderoso processo de parentalidade positiva", disse.

CONVERSAR DURANTE O SONO?

Hoje, muitos profissionais que trabalham com crianças utilizam o Sleep Talk® ou técnicas semelhantes, baseadas no método para ajudar no desenvolvimento infantil. Então, além de Raphaela, conversamos também com Camila Lavagnoli, que é pedagoga e especialista em rotina infantil. Elas responderam a algumas dúvidas de como esses métodos funcionam.

C: O Sleep Talk® consiste, basicamente, em conversar com a criança durante o sono?
Raphaela: Frequências de ondas cerebrais diferentes ocorrem durante todo o ciclo de sono. O processo desse método visa facilitar a aceitação das sugestões, alcançando, na verdade, níveis de ondas cerebrais que vão desde o Alfa profundo para o Teta leve em vez dos níveis mais profundos, como o REM e o Delta. Desta forma, as sugestões são aceitas sem despertar a criança e sem interferir nos hábitos normais e essenciais de sono da criança – que é o principal objetivo. No entanto, acessar os ciclos variados através do Processo Goulding® é simples, pois movimentos da criança durante a primeira fase do processo é um indicador consistente de que ocorreu a transferência para o nível mais leve e mais adequado de ciclos eletromagnéticos por segundo. O Processo é feito alguns minutos depois que a criança inicia o estágio inicial de sono. Esse tempo pode variar de criança para criança a depender especialmente da idade. Mas um dos indicadores que ensinamos aos pais na Consultoria Parental nesse momento é aguardar por sinais, como um movimento no corpo ou até mesmo na respiração. Como o método é simples de aplicar, seguindo as orientações do Especialista Goulding®️ SleepTalk®️ credenciado, é fácil perceber os sinais que mencionamos.

C: Existem outros métodos baseados no Sleep Talk®. Por que você acredita que conversar com a criança durante o sono é mais eficiente?
Camila: Pois, durante o sono acontece a consolidação da memória e fixação dos aprendizados. É um momento oportuno, pois a mente da criança está aberta a novos aprendizados. Nós podemos e devemos sempre tratar os assuntos com a criança acordada, mas nem sempre a nossa abordagem será de interesse da criança ou realizada em momento oportuno como a conversa durante este estágio do sono.

C: Como pode ser essa conversa? Existe uma maneira correta de falar?
Raphaela: No caso do Sleep Talk®, as sugestões a serem ditas pelos pais às crianças são ensinadas pelo Especialista Goulding® credenciado, que é o único profissional qualificado a ensinar aos pais esse processo, após a avaliação da criança e da família. De um modo geral, posso dizer que a maneira “correta” de se dizer as sugestões (criadas de forma personalizada, caso a caso) é com emoção. Emoções como o amor e a verdadeira intenção dele.

Camila: Normalmente, em técnicas similares, essa conversa é feita de três maneiras. Primeiro, com sugestões diretas. Por exemplo: "Você consegue deixar a chupeta"; "Você pode falar baixo, pois sempre te ouvirei"; "Você pode dormir tranquilo, pois a mamãe cuida de você"; "Você não precisa temer o escuro". Quando usado para tratar situações dificultosas do cotidiano, o cuidador pode ter uma conversa exprimindo suas emoções, como: “A mamãe tem estado nervosa ultimamente, mas isto não tem relação com você. Você continua sendo amado e querido". Ou, ainda, para promover a autoestima: “Você é querido”; “Você é amado”; “Você é capaz”. É importante lembrar que, em qualquer abordagem, a fala deve se basear em afirmações gentis e positivas sobre as situações. Os pais também devem ser específicos e não sobrecarregar a criança com várias demandas, não excedendo 3 pedidos por vez.

C: Quanto tempo deve ser aplicado para um determinado objetivo?
Raphaela: Muitas pessoas interpretam erroneamente o processo acreditando que basta falar coisas positivas ou específicas para os seus filhos que – plimplim – a mágica acontece. Isso é um enorme erro, pois o processo não tem a finalidade de “consertar” problemas ou questões da infância, mas sim EMPODERAR mental e emocionalmente a criança que, desenvolvendo recursos mentais internos, será capaz de lidar com as adversidades, desafios e dificuldades que a vida trouxer. Desta forma, portanto, terá seu sistema emocional ressignificado e naturalmente. O Processo Goulding® SleepTalk® envolve três fases, cada qual com o seu objetivo no desenvolvimento e empoderamento mental da criança. São elas: fase 1, que melhora e desenvolve o senso de autoestima, felicidade, confiança e calma; a fase 2 corrige maus hábitos e comportamentos indesejáveis; e a fase 3 que aborda desafios e comportamentos mais específicos, incluindo questões de desenvolvimento. Perceba que por se tratar de um processo, como já diz o nome, ele tem por finalidade desenvolver a criança. Nesse contexto, esse Programa de Desenvolvimento Mental leva em média seis meses, considerando dois meses para cada fase – o que pode, na verdade, variar de criança para criança e suas necessidades.

C: Em quais casos os pais podem falar com a criança durante o sono?
Camila: Eles podem usar para encorajar a criança em passos importantes de seu desenvolvimento, como desfralde e retirada da chupeta. Também pode auxiliar no desenvolvimento da resiliência emocional, como rivalidade entre irmãos, birras, ansiedade da separação, dentre outros eventos do cotidiano familiar e na construção da autoestima e autoconfiança.

Raphaela: Em todos! Em relação ao Processo Goulding®️ SleepTalk®️, ele por ser um método de desenvolvimento mental e emocional traz benefícios para famílias que lidam com uma gama de questões como incontinência urinária, birras, traumas, estresse, rivalidade entre irmãos, ansiedade, etc. Todos – sem qualquer tipo de segregação – respondem bem ao Processo, incluindo crianças com deficiência física ou intelectual.

C: Existe idade mínima para aplicação do método?
Raphaela: Há muitos estudos que indicam o quanto sons e sensações externos e internos (da própria mãe) são transmitidos aos filhos ainda na gravidez. Como o Processo Goulding® SleepTalk® atua tanto como prevenção quanto desenvolvimento, o método pode ser aplicado desde a gravidez até, em média aqui no Brasil, aos 13 anos de idade a depender da maturidade intelectual da criança. Jovens adultos com condições intelectuais são beneficiados também!

C: A conversa durante o sono sempre funciona?
Camila: Não. Somente se a criança estiver pronta para aquilo que lhe está sendo proposto. Uma criança, por exemplo, não deixará a fralda se não estiver madura para atingir este marco. É válido também ressaltar que se trata de um processo.

Raphaela: O Sleep Talk®️ sempre irá funcionar se for aplicado no contexto correto e da maneira correta. Ele vai ressignificar questões emocionais no sistema de crenças da criança e desenvolver recursos mentais internos que irão capacitá-la a lidar com as questões que enfrenta. Considerando como exemplo uma criança mais velha que está em dificuldades de desfraldar, o que o método faz? Atua na mente para ressignificar causas emocionais que possam estar dificultando ela na maturação para atingir esse marco. É importante compreender que o  Processo Goulding®️ SleepTalk®️ não tem por propósito solucionar problemas, vai muito além, que é desenvolver a criança mental e emocionalmente ao ponto que todo vínculo emocional ligado a uma causa seja trabalhado e a empodere para lidar com essa dificuldade.

Você já curtiu Crescer no Facebook?