• Luiza Tenente
Atualizado em
surdez (Foto: Thinkstock)

Aos 18 meses, Vinícius Araújo era capaz de dormir tranquilamente, enquanto seu avô usava uma furadeira no cômodo ao lado. Além disso, o bebê não atendia quando era chamado pelos pais, Felipe Araújo, 26, e Daniela de Paula, 21. Isso já era estranho, mas os pais começaram a desconfiar de que algo estava realmente errado ao perceberem que o filho ainda não falava nenhuma palavra, enquanto o primo, 1 mês mais novo, já arriscava as primeiras sílabas. Foi quando decidiram levar o bebê ao consultório do otorrinolaringologista. Após o exame de audiometria, foi constatado: Vinícius tinha perda de audição severa bilateral. Ou seja, não escutava nada.

Assim como Vinicius, há outros tantos bebês que sofrem com o problema. Por isso, a importância do Dia Nacional de Prevenção e Combate à Surdez, que acontece neste domingo (10/11), para reforçar medidas para descobrir o quanto antes se a criança tem deficiência auditiva e seja submetida a um acompanhamento para ajudá-la em seu desenvolvimento e bem-estar. Se descoberta antes dos 2 anos, a dificuldade em aprender a falar será menor. A primeira delas começa ainda na maternidade, com o teste da orelhinha – ou triagem auditiva neonatal. Desde 2010, uma lei obriga que todas as maternidades ofereçam o exame, inclusive as do Sistema Único de Saúde (SUS). O ideal é que, logo após o nascimento, o bebê passe por esse procedimento indolor e rápido para medir seus estímulos sonoros. Como Vinícius nasceu um mês antes da obrigatoriedade do exame, não foi submetido ao teste.

É importante reforçar que esse primeiro exame é só uma triagem, ou seja, se o seu filho não for “aprovado” no teste, isso não significa que ele seja surdo, mas um alerta para que os pais procurem um otorrinolaringologista para que o filho seja submetido a exames mais detalhados. “Se o bebê estiver no grupo de risco (veja adiante), o ideal é já fazer imediatamente o BERA – um exame elétrico mais sensível que o da orelhinha, com maior precisão para detectar a surdez”, explica o otorrinolaringologista Pedro Albernaz, do Hospital Israelita Albert Einstein (SP).

Há também formas domésticas de desconfiar do problema. Entre 3 e 4 meses, o bebê já firma o pescoço e consegue virar a cabeça ao ouvir seu nome. Também desenvolve o chamado riso social, que nada mais é do que um sorriso ao escutar a voz dos pais. Albernaz explica mais um sinal importante: ao chorar, durante a noite, o bebê costuma se acalma se ouve a voz da mãe. Já as crianças com problemas de audição só se tranquilizam quando conseguem ver o rosto da mãe ou do pai e quando alguém acende a luz.

Causas

 De acordo com o Ministério da Saúde, a cada 10 mil recém nascidos, 30 têm deficiência auditiva. Mas o que pode causar o problema? No Brasil, o principal motivo são as infecções que acometem as grávidas – sífilis, rubéola, toxoplasmose e citomegalovírus. Má-formações (principalmente na região da cabeça e pescoço), prematuridade, baixo peso do bebê (inferior a 1 kg), genética (associada ou não a síndromes) e uso de drogas durante a gestação também são fatores que aumentam o risco de surdez congênita (ou seja, no nascimento). O histórico familiar deve ser considerado: no caso de Vinícius, não houve nenhum dos problemas listados acima. Mas a irmã do menino, Ágata, de 5 meses, também nasceu surda. Os pais Felipe e Daniela já estão investigando, com ajuda médica, qual é a explicação para a deficiência dos dois filhos.

Depois do parto, há outros fatores que podem causar a deficiência auditiva, como otite, sarampo, rubéola, caxumba e meningite bacteriana. O uso de certos antibióticos, principalmente em prematuros que estão na UTI (Unidade de Tratamento Intensivo), também merecem atenção para o surgimento do problema. “Atualmente, o uso desse remédio é muito comum. É possível procurar alternativas que não ofereçam risco ao bebê”, diz Claudio Schmidt, geneticista e consultor médico do Diagnósticos Laboratoriais Especializados (SP). 

Tratamento




Ele vai depender do grau de surdez da criança. Se for de leve a severa, o aparelho auditivo amplificará o som que ela consegue escutar e a qualidade de vida será muito melhor.  Vinícius começou a usar o aparelho aos 2 anos. Como após 6 meses ainda não tinha avanços na aquisição de linguagem, a solução indicada foi o implante coclear, uma espécie de ouvido biônico, que estimula eletronicamente o nervo auditivo. Para que o resultado seja mais signiticativo, o ideal é que a cirurgia ocorra quando a criança tem de 1 a 2 anos. “Vinícius fez o implante quando completou 3 anos. Um ano depois, já está falando as primeiras palavras. Domina LIBRAS (Língua Brasileira de Sinais), que aprendeu na escola, mas a cirurgia facilitou a comunicação com as pessoas em geral”, conta o pai do menino. Este procedimento é oferecido pelo SUS.

Além do aparelho ou do implante, é fundamental que a criança faça um trabalho de reabilitação fonoaudiológica, para aprender a ouvir e a falar. Quanto mais cedo começar o acompanhamento, melhor será a dicção e o vocabulário.

Prevenção



Os cuidados que podem diminuir o risco de o bebê nascer com a deficiência começam na gestação, como explica Eduardo Bogaz, otorrinolaringologista do Hospital São Camilo (SP): “Fazer o pré-natal e ter a carteira de vacinação em dia é importante para preservar o feto”. Quando o bebê nascer, o aleitamento materno exclusivo até os 6 meses também ajuda, já que aumenta a imunidade. Não expor a criança ao cigarro – seja seu, do vizinho ou de alguém da família – é outro cuidado necessário. Tente também, sempre que possível, evitar que seu filho tenha contato com poeira, já que isso aumenta o risco de ter otite, fator de risco para o problema.

Vida normal



A criança surda pode ter uma rotina como qualquer outra se tiver sob tratamento adequado. Vinícius brinca com os primos, usa o computador, joga futebol e corre com os amigos. Vai à creche diariamente e aprende a língua de sinais no Centro de Educação para Surdos Rio Branco, onde recebe estimulação precoce. Os pais do menino desejam que ele e a irmã Agatha, de 5 meses, sejam companheiros e troquem experiências no futuro. “Nosso sonho é que sejam independentes”, diz Felipe.

*Outra fonte: Armando Fonseca , patologista clínico e diretor do DLE (Diagnósticos Laboratoriais Especializados).

 Novidade no Brasil

Para diagnosticar a surdez congênita, o Laboratório RDO Diagnósticos Médicos (SP) desenvolveu um teste que pode ser feito em bebês, crianças e adultos, a partir de uma amostra de sangue. De acordo com Adah Cristina Conti de Freitas, especialista em Medicina Laboratorial e Citogenética do local, o sequenciamento de 60 genes pode chegar a uma resposta mais precisa. O valor do exam é de R$ 5.300 e fica pronto em 30 dias. Confira mais novidades sobre o assunto:

CRESCER: Qual o diferencial deste exame em relação aos tradicionais? Ele diagnostica qualquer tipo de surdez?
Adah Cristina Freitas:
O Exame de Surdez Congênita é um teste genético. O diferencial é o número de genes contemplados. A surdez de origem hereditária pode ser causada por vários mecanismos de herança genética. No RDO, contemplamos, em um único exame, os 60 genes envolvidos com a surdez e, assim, ampliamos as chances de diagnóstico preciso. Este novo teste é realizado e analisado em nossa área técnica por metodologia de última geração e com supervisão de um geneticista. Isso nos permite uma interação melhor com o médico solicitante e com as famílias envolvidas, tanto para o diagnóstico dos casos específicos como para estudos familiares e populacionais no Brasil.

C.:Os pais surdos podem conseguir ter um filho sem o problema?
A.F.:
Depende. Os padrões de herança genética para surdez envolvem vários mecanismos e por isso a avaliação e indicação do exame por médico especialista é imprescindível. Após o reconhecimento do tipo de doença hereditária causadora, os pais devem receber as informações sobre os riscos para os próximos filhos e sobre a possibilidade da seleção de embriões livres da doença, por meio de técnicas de fertilização assistida e PGD - Diagnóstico Genético Pré-implantacional.