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Nas muitas dúvidas que surgem quanto à origem do planeta Terra – estamos a falar de uma história com (aproximadamente) 4,5 biliões de anos, e dizem os cientistas que só os últimos 600 milhões são devidamente conhecidos –, temos algumas certezas: vivemos num planeta alimentado por água, uma mancha azul quando vista do espaço, com uma posição privilegiada no sistema solar – nem muito próxima do Sol, nem muito longe – que lhe permite ser um planeta com água em todas as suas formas, líquida, sólida e gasosa. Há quem diga que a água da Terra é tão antiga quanto as rochas, ambas formadas nos primeiros dias como planeta. Mas pondo teorias de parte, o que sabemos ao certo também, para já, é que a Terra é o único planeta conhecido por manter a vida. Vida que começou na forma de micro-organismos, bactérias, e que deu origem a formas cada vez mais avançadas, em mares, terras e céus. Estima-se que existam 2,5 milhões de espécies de plantas, animais, bactérias, fungos e outros. E ainda as espécies que estão por descobrir. O Homem é a mais recente, e a que tem mais responsabilidade na conservação desta “casa de todos”.

Neste planeta que nos acolhe, “o oceano é como os pulmões” de toda a vida que o habita, numa responsabilidade que partilha a meias com as florestas – cerca de 50% do oxigénio no planeta é produzido em terra e pelo menos 50% é produzido pelo oceano. Este oxigénio é consumido quase na totalidade pela vida desses ecossistemas e é responsável por uma biodiversidade inigualável. “Temos as árvores e temos o oceano. A importância de os proteger é a diferença entre a vida e a morte”, lembra o surfista de ondas grandes, Garrett McNamara, numa das nossas conversas durante a rodagem desta série.

De onde vem o oxigénio que respiramos?

Ouvimos muitas vezes, como uma espécie de mantra, que as florestas são o pulmão do planeta. É um mito. A verdade é que o oxigénio é produzido tanto nas florestas como no oceano, por plantas, algas e micro-organismos através da fotossíntese (aliás, é no oceano que está um dos mais importantes produtores de oxigénio do mundo, uma espécie particular que é o mais pequeno organismo fotossintético na Terra, com o nome de Prochlorococcus, que produz cerca de 20% do oxigénio na biosfera inteira, uma percentagem maior do que a combinação da produção de todas as florestas tropicais em terra). Mas tal não quer dizer que o oceano nos dá 50% (ou outro valor) do oxigénio que nós, seres humanos, respiramos. Isto porque, o oceano é responsável por cerca de 50% do oxigénio produzido no planeta, mas essa percentagem não é uma quota disponível para o ser humano respirar. Tanto no oceano como nas florestas, o oxigénio produzido é consumido diretamente pelo próprio ecossistema nos dois ambientes em que se produz, entre respiração, respiração celular e decomposição de plantas e animais. Assim, a produção e o “gasto” anulam-se. E o saldo remanescente, o extra de oxigénio que poderia acumular-se na atmosfera, é praticamente nulo.

Mas então como é que chegamos ao oxigénio que respiramos? O oxigénio que perfaz a atmosfera (cerca de 21% da composição do ar que respiramos) tem outra origem. Esse gás foi produzido por cianobactérias enterradas no fundo do oceano, num ambiente sem oxigénio. Sem se decomporem – e, por isso, sem gastar oxigénio na sua decomposição –, o oxigénio foi-se acumulando gradualmente durante milhões de anos. Este é o atual reservatório de oxigénio atmosférico.

Lino Bogalho

Lino
Bogalho

Responsável Mercedes-Benz Surfing Lounge

Esta biodiversidade inigualável mostra-se com cada vez mais frequência nas águas portuguesas. “Nós vemos golfinhos todos os dias. Não tem como não agradeceres esta imensidão – a imensidão do meu escritório –, esta perfeição que é a mãe natureza”, diz-nos Lino Bogalho, responsável pelo Mercedes-Benz Surfing Lounge, na Nazaré, na passagem entre a saída da marina e a chegada ao ponto que nos mostra as ondas a embater na rocha que levanta o Forte de S. Miguel Arcanjo. “Durante o verão, chegamos a sair quatro vezes por dia em observação de golfinhos e a mãe natureza dá-nos todos os dias. Tenho diálogos com a mãe natureza que só eu sei que os tenho.”

“Quem ama o ar e quem gosta de estar no mar tem momentos inexplicáveis de felicidade. Não têm noção do que é ao fim destes anos todos, ao fim de dez anos, por exemplo, de observação de golfinhos, o que é emocionares-te a ponto de chorares ao ver a alegria das crianças no contacto direto com aqueles animais”, partilha Lino.

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Quando tu vives no mar, para o mar e do mar, por vezes tu abstrais-te de tudo o que vai à tua volta no barco e estás tu a dialogar com a natureza. É mais forte do que tu, essa relação de respeito pela imensidão do mar e por aquilo que o mar dá

Lino Bogalho

Uma emoção que não é estranha para a bióloga do Mercedes-Benz Oceanic Lounge, em Lisboa. “Vai ser um bocadinho lamechas, mas realmente tocou-me ver a minha primeira baleia, perceber que tinha uma ligação com estes animais e perceber ‘é isto que eu quero fazer para o resto da minha vida e é isto que eu quero proteger’.”

No Tejo, têm sido avistados golfinhos com mais frequência, conta-nos Bernardo Queiroz, responsável pelo Mercedes-Benz Oceanic Lounge, numa das nossas saídas de barco para o Tejo a partir das Docas de Santo Amaro, em Lisboa. “Já os víamos de vez em quando, mas víamos dez, doze vezes ao ano e passámos a ver 120, 150 vezes ao ano”, relata.

O Tejo, que já foi uma visão de poluição e degradação, brilha agora com águas mais cristalinas, repletas de vida. “Nitidamente as águas estão muito menos poluídas e mais cristalinas do que estavam quando eu comecei a fazer vela há 30 e tal anos. E daí também termos golfinhos no rio, corvinas, corvos-marinhos... Se subires o rio há centenas e centenas de flamingos. [Vês] o rio todo cor-de-rosa”, conta, com o entusiasmo evidente na sua voz. “Se conseguires dar a conhecer às pessoas toda a realidade que têm à volta, é um grande trigger para que as pessoas se apaixonem pelo mar”, diz Bernardo.

Biodiversidade nas águas portuguesas

É raro não haver avistamentos de cetáceos numa saída com a equipa do Mercedes-Benz Oceanic Lounge, em Lisboa, seja dentro do rio, seja na linha que separa o rio Tejo do oceano Atlântico, entre o Bugio e o Forte de São Julião da Barra. Entre 150 e 200 dias por ano, são avistados golfinhos no rio e na costa, de quatro espécies diferentes. “Vês botos, vês golfinhos-comuns, vês roazes e vês riscados, que são os campeões de salto em altura.” Os botos são os mais tímidos, não sendo avistados tantas vezes. Os comuns são a espécie mais encontrada, que sendo curiosa proporciona mais interações. Duas aves especiais, o ganso-patola e a cagarra, dão uma ajuda na procura dos golfinhos. A biodiversidade não fica por aqui... Podem ser avistados tubarões-azuis, tubarões-martelo, orcas – “que passam na nossa costa regularmente” –, baleias-comuns, baleias-sardinheiras, baleias-anãs. “Mais de 99% dos portugueses não fazem ideia de que há esta abundância de cetáceos logo aqui à porta da capital”, diz Nuno Sá. “Tudo isto às portas de uma capital europeia. Lisboa é a única capital da Europa que é visitada por golfinhos”, lembra Bernardo Queiroz.

“O que torna mais única a vida marinha de Portugal é que entre o continente, os Açores e a Madeira, tens um portefólio de vida marinha que vai desde águas muito frias, a águas temperadas, a águas tropicais. Somos um país pequeno, mas 97% do território de Portugal é mar e acabas por ter uma biodiversidade enorme”, explica Nuno Sá. O cineasta português lembra que se descobriu há pouco tempo que os Açores são o único sítio da Europa onde se consegue ver o maior peixe do mundo, o tubarão-baleia. “Há uma imensidão de histórias que existem em Portugal e a maior parte das pessoas não fazem ideia.”

Bernardo
Queiroz

Responsável Mercedes-Benz Oceanic Lounge
Bernardo Queiroz
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Há uma frase muito conhecida e que é uma máxima que nós adotamos aqui no Mercedes-Benz Oceanic Lounge, que faz parte do nosso dia a dia, e que é ‘Para proteger tu precisas conhecer’. As pessoas só amam aquilo que conhecem e só protegem aquilo que amam.

Bernardo Queiroz
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Nem todas as pessoas sabem o que se encontra nas águas portuguesas, às portas da capital portuguesa, e muitas vezes até mesmo rio adentro. “E se calhar por não teres essa noção, não saberes que tens baleias à porta de Lisboa, se calhar não tens um respeito tão grande quando vais à praia, quando vais ao mar, quando estás em tua casa e pões as cotonetes na sanita, que depois vão passar pelas redes das ETAR e vão acabar no rio Tejo”, explica.

Sempre que fazem saídas para o mar, a equipa do Mercedes-Benz Oceanic Lounge recolhe todo o lixo que vê à superfície e que não se decompõe na água. E o que fazem com esse lixo? Primeiro, divulgam as imagens nas redes sociais. “A captação de imagem e divulgação, muitas vezes nas redes sociais, cria awareness”, diz Bernardo. “Dar a conhecer às pessoas o que existe no rio Tejo, o que existe entre o Cabo da Roca e o Cabo Espichel, e o que ameaça todas as espécies que se encontram ao largo da costa e no rio, foi o maior foco do lounge até hoje”, explica. Depois, há muito lixo que é dividido por tipologia e depositado na reciclagem. Mas também há lixo que é usado na própria decoração do lounge. “Quando há alguma coisa que achamos que é mais emblemática, [esse lixo] ganha uma nova vida e vem para aqui, para a parede, para criar um alerta sobre o estado dos nossos mares.”

A missão do Mercedes-Benz Oceanic Lounge

“O Mercedes-Benz Oceanic Lounge está em constante mudança.” Até hoje, o maior foco foi o awareness, criar consciência, através de exposições, workshops de transformação de lixo em arte com os Skeleton Sea, ações de educação ambiental nas escolas do Oceanário, ações de sensibilização e de limpeza com a Bandeira Azul nas colónias de férias. Agora, o objetivo é “ir um bocadinho mais longe”. Para Bernardo Queiroz, este caminho passa por “criar mudanças e ações concretas que impactem o ecossistema marinho em que vivemos, sempre baseadas na ciência, na biologia marinha, em que protejam mais o rio Tejo”.

O grave é o plástico, a esferovite, o vidro, os balões...

Bernardo Queiroz

Nas praias portuguesas, Catarina Gonçalves, da Bandeira Azul, conta-nos que “a grande maioria do lixo que é apanhado são beatas, beatas fumadas nos grandes centros urbanos e que, via sarjeta, vão parar ao mar”. “Uma beata contamina 50 litros de água”, diz. “Se fores connosco para o Cabo da Roca, em mar aberto, vês grandes blocos de esferovite, vês tubos de plástico, vês outras coisas, outro tipo de lixo, que não aquele lixo do dia a dia que nós vemos nas praias concessionadas onde vamos”, alerta Bernardo.

A esferovite e s nylons de pesca são os materiais poluentes que mais se encontram na água. Aliás, numa das saídas que acompanhamos, já no regresso e depois de termos encontrado e apanhado alguns objetos poluentes em alto-mar (garrafas de detergentes, garrafas de água), deparamo-nos com um nylon de pesca mesmo à entrada da marinha que, tudo indica, veio arrastado por um dos barcos, nylon esse que não só é um perigo para os próprios barcos, mas uma ameaça grave para a vida marinha.

“Nós encontramos alguns golfinhos mortos no rio. E quase todos, diria que 95%, têm a cauda amputada. Um golfinho que tem cauda amputada morreu afogado, preso numa rede de pesca. Não era a presa pretendida, mas foi apanhado por acaso. Morre afogado – que é uma morte agoniante, sobretudo num animal tão inteligente – e depois, já morto, cortam-lhes a cauda”, partilha Bernardo, com uma voz que perdeu o entusiasmo de quando nos deu conta dos avistamentos dos últimos meses.

“Este ano tivemos um número recorde de avistamentos de golfinhos mortos e faço sempre questão de nos aproximarmos, tentar perceber se morreu de causas naturais ou se foi alvo de lixo marinho, se tem marcas no corpo, e isso claramente nos emociona. Toca-nos de uma maneira profunda pelo nosso impacto. Nós [humanos] termos feito alguma coisa que causou a morte de um animal”, conta Mariana Carvalho, bióloga do Mercedes-Benz Oceanic Lounge.

Estas redes de pesca perdidas são chamadas de ghost nets, ou redes fantasma. Porque “ficam a matar para o resto da vida.” “Enquanto uma rede que tu deitas à água, apanha peixe, traz peixe e nós comemos, uma rede perdida no mar vai continuar a matar e a matar, e é uma rede de pesca que não serve para nada. Não comemos o peixe que acaba nessas redes e até pode servir de chamariz para outros peixes, que acabam depois por morrer também.” Esta realidade crua é um lembrete constante da responsabilidade que todos temos para com a vida marinha.

Mariana
Carvalho

Bióloga do Mercedes-Benz Oceanic Lounge
Mariana Carvalho
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É uma loucura. Há certos dias em que vês inúmeros tipos de poluição no oceano. Aqui na Nazaré, vê-se sempre alguma coisa, garrafas de plástico, cordas, sacos, sempre. Pode ser muito assustador se pensares no que está a acontecer no planeta Terra neste momento

É horrível pensar que somos nós que fazemos isso e que todos os animais que vivem nesse ambiente têm de se adaptar ao que nós fazemos

Mariana Carvalho

“Um dos maiores problemas do nosso oceano é o plástico. Este problema pode começar com uma garrafa de plástico que encontramos na água, que através de processos físicos e químicos se vai degradando... Torna-se em microplásticos e esses microplásticos acabam por se infiltrar na rede trófica dos animais marinhos, começando pelo fitoplâncton ou plâncton, peixinhos, os peixes maiores, até chegar a nós”, explica a bióloga Mariana Carvalho.

“Todos os dias em que saímos para o mar, vemos cada vez mais plástico e cada vez mais poluição”, afirma Nuno Sá, cineasta subaquático português, que nos conta um dos seus muitos episódios em alto mar. “Estava nos Açores, para filmar o comportamento natural dos cachalotes, e há um dia em que encontrámos um género de rio de plástico com dezenas de quilómetros de comprimento. Navegámos durante uma hora e nunca encontrámos o fim. Tinha tudo o que possas imaginar de poluição no oceano, desde capacetes, botas, escovas de dentes, sacos de plástico, redes de pesca.” “Uma imensidão de bens descartáveis que facilmente as pessoas atiram fora, muitas vezes usam uma vez, durante uns segundos e que depois vai parar a um sítio tão remoto como os Açores, no meio do oceano Atlântico, onde não há outro ponto de terra a milhares de quilómetros”, salienta. “Isto acaba por nos pôr a pensar como nós [seres humano] impactamos qualquer sítio do nosso planeta e de como impactamos o oceano.”

Lino Bogalho, na Nazaré, fala do impacto das atividades humanas no oceano e pede ações mais imediatas e mais eficazes: “Tudo quanto seja para respeitar a natureza, que seja para respeitar o oceano e o ecossistema que nos envolve, na minha opinião, tudo quanto possa ser feito é lento e já é tardio porque estamos com atraso. Já destruímos muito”, lembra.

E essas ações podem e devem começar por nós, por mais pequenas que possam parecer. “Nós não precisamos de ver alguém para apanhar lixo. Podemos ser nós os primeiros a passar por uma rua, passar pela praia, e apanharmos um bocadinho de lixo e colocarmos no sítio certo. Causa um impacto direto de influenciarmos outras pessoas a fazer o mesmo. Nós precisamos de ação e de a ação ser feita”, explica Mariana. “Se o nosso instinto [for] de ver um bocado de lixo em terra, numa cidade, numa rua, e ter vontade de apanhar um bocadinho de lixo que seja, efetivamente tem um impacto mínimo, mas tem um impacto. Não é um impacto absolutamente dia e noite, mas é um impacto sólido”, reforça João Macedo, surfista português e fundador da Save the Waves Collition e presidente da Hope’s Zone Foundation.

O que é a Hope’s Zone Foundation?

“A Hope’s Zone Foundation é uma pequena organização sem fins lucrativos baseada na Nazaré e em Sintra, dois grandes plos de ação em que a associação está envolvida. A nossa missão a longo prazo é ajudar a criar áreas marinhas protegidas”, explica João Macedo. Muitas das iniciativas que nascem pelas mãos da Hope’s Zone Foundation têm como prioridade criar uma comunidade sustentável, como, por exemplo, com a plantação de algas – “uma das formas que nós encontrámos de interagir, de trabalhar com a comunidade piscatória de uma forma profissional”, afirma o surfista português.

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O mais triste é que nos últimos anos já tenho ido desde o Ártico à Antártida, nos sítios mais remotos do mundo em filmagens, e em qualquer sítio que uma pessoa vá, encontra o impacto humano

Nuno Sá
Todas as pessoas com quem falámos nestes dias de filmagens vivem em contacto permanente com o mar e com o oceano. A conversa tida, ficou sempre cada vez mais evidente a ligação intíma que estas vozes têm com a água. Uma dessas vozes é a de Nuno Sá, com vasta experiência em documentar a vida marinha. Mas Nuno não só nos mostra as imagens mais bonitas como também nos deixa as imagens mais impactantes da ação humana, o impacto dos detritos marinhos na vida aquática.

Nas águas geladas do Atlântico Norte, Nuno Sá encontrou uma das suas experiências mais marcantes: “Talvez um dos episódios mais tristes por que já passei. Foi nos fiordes da Noruega. Estávamos a filmar uma cena incrível para o Blue Planet II, um dos grandes espetáculos que ainda existe de um oceano saudável no nosso planeta, a migração do arenque. Ali entre outubro e janeiro, há mais arenques nos fiordes da Noruega do que seres humanos do nosso planeta. São cardumes com biliões de arenque. E vêm milhares de baleias atrás daquilo, especialmente orcas e baleias-de-bossas. Por todo o lado à nossa volta, havia jatos de água por entre as águas calmas no meio dos fiordes – de baleias-de-bossas, orcas, baleias-comuns e por aí fora. Foi talvez um dos highlights da minha carreira até agora”, começa por contar.

“No dia seguinte, ainda entusiasmadíssimos com aquelas cenas fantásticas que tínhamos filmado na véspera, acabámos por ver também uma coisa bastante triste. Encontrámos uma baleia-de-bossas enrolada em artes de pesca. Tinha uma âncora presa no fundo e tinha cabos à volta do corpo – da barbatana caudal à da barbatana peitoral, passando pela boca – e várias boias de pesca. Não conseguia manter o corpo à superfície. Sabíamos que se não a soltássemos, ia acabar por se afogar. E meti-me dentro de água”, contou Nuno Sá, que por mais vezes que conte esta história nunca deixa de se emocionar.

“Aos poucos fui-me aproximando e a baleia foi deixando que me chegasse cada vez mais próximo. Cortei o cabo que tinha na boca e depois fui cortando cabos ao longo do seu corpo. Mergulhei por baixo da baleia e assim que toquei no cabo da âncora, o cabo explodiu. Estava com uma tensão incrível de puxar toneladas de baleia para baixo. Consegui libertá-la. A baleia foi para a superfície e foi ali um momento de adrenalina, mas que acabou como um momento um bocadinho surreal, porque foi provavelmente a experiência mais poética que já passei debaixo d’água. Aquela baleia veio ter comigo. Ficou parada a cerca de dois metros de mim e acompanhou-me até ao barco. Finalmente tinha a sua liberdade e, em vez de nadar para qualquer lado, veio atrás de mim. Foi um lembrete da fragilidade e da força da vida marinha.”

A 300 quilómetros acima do Círculo Polar Ártico – “no meio do nada” –, num local que Nuno Sá recorda como “o sítio que, pensamos, dificilmente podemos ter um impacto negativo no oceano” –, todos os anos, entre cinco e dez baleias morrem nos fiordes da Noruega enroladas em artes de pesca. “Nós como seres humanos continuamos a ser provavelmente o animal mais perigoso neste planeta”, diz o cineasta aquático.

Nuno Sá

Cineasta Subaquático
Nuno Sá
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Aquela baleia simplesmente veio ter comigo. Ficou parada a cerca de dois metros de mim e acompanhou-me até ao barco e, mesmo depois de ter entrado no barco, ficou ali à minha volta durante algum tempo

Nuno Sá