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Há vinte anos, eu e minha esposa fomos convidados por um casal de amigos para um passeio de lancha. Fã de Búzios e, como um bom judeu carioca, frequentador de Teresópolis, Angra dos Reis nunca havia sido muito a minha praia. A ideia era fazer uma travessia Itacuruça–Ilha Grande e assim conhecer o litoral do Rio. O desafio de navegar em mar aberto, com uma lancha pequena, bem como a apresentação à Costa Verde, foi uma experiência inesquecível. O mar estava bem mexido, faltou luz na pousada, mas nem a falta do ventilador nem a “mosquitada” conseguiram estragar essa nova experiência. O impacto foi tamanho que, depois de todo este tempo, ainda me vejo impressionado e, por vezes, surpreendido com a beleza da região.
Para economizar na marina, nossos amigos inicialmente guardavam o barco na Ilha do Governador. Após algum tempo, conseguiram um espaço melhor em Itacuruça. Deixávamos o carro e íamos para a marina pegar a lancha. Colocar o barco no mar exigia um esforço: carrega-se o reboque para um lado, manobra-se para outro e, por fim, leva-se o barco para a água: na munheca! Mas a recompensa era quase imediata ao presenciar toda a beleza deste lugar.
Com o tempo, alguma coragem, e o nascimento dos meus dois filhos entrei também no meio náutico. Assim, a aventura ganhou mais dois parceiros. Na verdade, quatro, já que o casal de amigos também teve dois filhos. Ali nascia mais uma grande amizade. Desde muito cedo, eles começaram a participar desses passeios, o que transformaram essas viagens em uma experiência familiar única. O trabalho no mercado financeiro consome muito nosso tempo durante a semana e, frequentemente, no fim de semana. Essas viagens eram a garantia de um momento de qualidade com a família, presentes e sem celular.
Com o passar dos anos, compramos um apartamento na praia como base para nossas viagens para a Ilha Grande, mudamos de marina e nossas idas para Angra ficaram cada vez mais frequentes.
Nossos filhos adoravam ir para Angra com os amigos. Foram inúmeras comemorações de aniversário (do carnaval às férias de julho). Viagens frequentes, animadas, regadas a churrascos, pizzas a lenha e muita risada... A Costa Verde já nos propiciou muitas experiências inesquecíveis. Talvez nada mais marcante do que quando observamos um grupo de cerca de trinta golfinhos, que um dia resolveu nos acompanhar em uma viagem. Desligamos o motor e ficamos ali, observando o show.
Quando estamos lá, a grande dúvida que temos é escolher a qual praia iremos: Bananal, Pingo D’água, Sítio Forte, Lopes Medes, Lagoa Azul, Praia do Dentista... todas lindas, mas sempre tem a preferida da temporada.
- Aonde vamos hoje?
- A Praia do Dentista é muito cheia. Vamos ao Sítio Forte?
- Pai, está chegando? Quero ir do seu lado.
- Filho, joga a âncora de popa, por favor?
Quando os motores desligam o tempo entra em outro ritmo. Primeiro o protetor solar e depois uma longa caminhada regada a uma boa conversa com velhos amigos. Uma bola com as crianças (ou tentativa de), um mergulho para refrescar... “Vôlei de praia agora? Frescobol? Que tal começar o churrasco? Vamos colocar a linguiça na brasa? Ih, olha lá, não é o barco da Angélica?" Sim, a Costa Verde tem muitos fãs e a quantidade cresce a cada dia.
E assim o dia vai passando...
Alguns podem perguntar: mas barco não dá problema? Dá sim. E como! Água salgada é pior que material radioativo… O pessoal aqui do banco já até conhece a voz do marinheiro de tanto que ele liga “Oi Ricardo, qual o problema dessa vez?” Mas, como esse meu amigo costuma falar, o importante é mudar os problemas. Aí voltamos zerados para a rotina na segunda.
Claro que também tivemos alguns ‘perrengues’. Não foram poucas as vezes que estávamos no mar e uma mudança de tempo abrupta nos surpreendeu e transformou o mar e a viagem. É nessa hora que o turismo náutico traz um legado, pois as crianças aprendem na prática que a natureza é a protagonista e é preciso respeitá-la. No mar é preciso disciplina e responsabilidade para não correr riscos desnecessários. O compromisso de cada pessoa, incluindo dos pequenos, é essencial para uma viagem/passeio segura. No mar, aprendemos a lidar com o inesperado, onde condições climáticas podem dar uma grande chacoalhada no percurso. Mas a disciplina e o respeito às regras de navegação é o que garante a segurança.
Hoje meu filho está com dezesseis e minha filha com doze anos. Posso dizer que, depois de vinte anos, além da natureza, um dos atrativos mais importantes para mim na hora de colocar o barco no mar ainda é a possibilidade de conviver com a minha família. Durante a pandemia, ficamos ainda mais tempo em Angra. E, neste momento de grande tensão, conseguimos de alguma forma nos sentir mais seguros e mais próximos.
Minha mãe faleceu recentemente, e ela adorava o convite. Era só chamar que ela já aparecia lá em casa de malas prontas, seu chapéu de palha e seus óculos de sol que “achados” no mar de Angra. Só de escrever e lembrar dessas histórias já dá uma saudade. Tão bom poder criar essas memórias!
Agora que meus filhos estão com o pé na adolescência, quero acreditar que continuaremos juntos nesses programas. Desconectados da internet e em meio a um cenário tão exuberante, há muita conversa, mergulhos e companheirismo. Assim como eles, o barco cresceu e abriu espaço para seus amigos participarem desta aventura. Tenho certeza de que isso ajudará (e muito) a atravessar as turbulências do futuro. Estamos morrendo de saudade do mar.
Como eu brinco, temos água salgada nas veias… vamos navegar?
Daniel Bassan é CEO do banco de investimento UBS BB