Um jovem, atualmente com 20 anos, afirma ter sido abusado sexualmente pelo padre Ramon Guilherme Pitilo da Silva Ramos — preso no último dia 24, acusado de ter abusado de duas crianças — enquanto frequentava o Seminário Arquidiocesano de São José, no Rio Comprido, na Zona Norte do Rio, entre os anos de 2017 e 2018. O GLOBO teve acesso às mensagens trocadas por eles, por e-mail, que mostram relatos de trocas de beijos e até desejo de tocar em partes íntimas. Em um dos diálogos, o religioso chegou a pedir orações, por perceber "que o demônio tem investido contra" a sua paz de espírito. A defesa do padre Ramon Pitilo afirma que desconhece as acusações, assim como o conteúdo dos e-mails trocados. Já a Arquidiocese do Rio afastou o sacerdote e abriu uma investigação sobre o caso.
Atualmente vivendo na Região Nordeste, o jovem morou no Rio entre 2012 e 2019. Nesse período, em 2013, conheceu o padre Ramon, época em que tinha 11 anos, e fazia acompanhamento vocacional no seminário, da Arquidiocese do Rio, com objetivo de também se tornar seminarista, época em que Ramon teria acabado de entrar no Seminário.
O rapaz afirma que teve contatos íntimos com Ramon Pitilo dentro do seminário, no banheiro e numa escada do prédio. De acordo com ele, houve beijos e toques. O jovem diz que o padre usou a amizade que existia entre eles para se aproximar: "Eu não passava de um pré-adolescente me descobrindo sexualmente e cheio de hormônios". Ele registrou ocorrência eletronicamente por estupro de vulnerável na 18ª DP (Praça da Bandeira).
— Em 2017, quando entrei no seminário, mantivemos a amizade. Eu tinha 14 anos e estava me descobrindo sexualmente. Acabamos nos aproximando e conversamos sobre sexo. Algumas fotos íntimas foram trocadas — disse ao GLOBO.
Entre as mensagens trocadas, que citam uma relação de amigos, está a descrição de momentos em que os dois teriam se relacionado.
"Beijo mal, aos poucos vou aprender", disse o jovem ao padre, que respondeu com elogios: "Você está de brincadeira... você beija muito bem". A mensagem ainda foi completada com um "s2", símbolo usado na web para indicar um coração.
Em outro diálogo, a conversa trata de um momento íntimo. "Queria ter pegado no seu pênis. Amei a experiência", disse o jovem ao padre Ramon, que respondeu que o sentimento foi recíproco. "Também gostei muito. Fica para a próxima".
Marcação de encontros no banheiro e pedido de orações, por 'investidas' do demônio
O jovem, em uma das trocas de mensagem, sugere que o padre Ramon o encontre no "banheiro da capela ou o do auditório". Em outro diálogo, o então adolescente se preocupa: "Amanhã é muito arriscado, muitos ficam rondando pelo seminário", mensagem respondida pelo padre que, por ele, teria "feito hoje mesmo".
O padre também alertava sobre o local de um possível encontro. Segundo o e-mail enviado, deveriam ir para a "porta de emergência do auditório, perto da lavanderia", caso tivesse muita gente próximo à quadra.
No entanto, em meio aos diálogos, padre Ramon também pediu orações. O motivo seria o demônio o atentando.
"Hoje tive uma iluminação tão sublime sobre o amor a Deus e ao próximo. Peço que reze por mim. Apesar do chamado do Senhor e de seu carinho por mim, percebo que o demônio tem investido muito contra a minha paz de espírito", afirmou em mensagem.
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Em outro diálogo, disse não saber o que queria, mas reforçou o pedido de oração. "Querido, eu sinceramente não sei o que quero. Sei apenas que preciso que reze por mim e que se faça ainda mais próximo. Para que, quando a dor, eu possa ter mais alguém para me apoiar e me ajudar. Ainda mais com seu olhar que penetra minha alma".
Religioso foi afastado
O mandado de prisão contra o padre foi expedido no último dia 21 pela juíza Gisele Guida de Faria, da 1ª Vara Especializada em Crimes contra a Criança e o Adolescente. O padre se apresentou, acompanhado de seus advogados, na Dcav no dia 24 de julho.
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O padre foi suspenso de suas funções pela Arquidiocese do Rio, que abriu uma investigação interna sobre o caso.
O advogado Wallace Martins, que representa Ramon Pitilo, afirmou não conhecer as acusações, tampouco os e-mails trocados, nem o nome da suposta vítima. A defesa também consultou o padre e uma parente dele, que também afirmaram não saber do que possa se tratar.
Por meio de nota, nesta semana, o advogado de Ramon Pitilo, Wallace Martins, informou que desconhece a nova acusação e afirma que o padre nega todas as denúncias de abuso sexual: "O padre refuta qualquer acusação nesse sentido. Estamos levando aos autos farto material probatório, inclusive com depoimentos de crianças da Paróquia, que afirmam, de forma peremptória, que o padre jamais agiu dessa maneira".
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